Por que aluno escreve tão mal? 2
1) Os mitos e os ritos por trás das letras
“Por que os alunos vão tão mal na redação? Eis um belo mote para dissertação, com ingredientes de sobra para um debate acalorado. Por muito tempo, porém, em vez de procurar argumentos, defender pontos de vista e buscar soluções, muita gente preferiu fugir do tema” (Hélio Consolaro, s.d.).
Instigados pela interrogativa de Hélio Consolaro, observamos neste momento o tratamento dado ao ensino da gramática e da redação. Esses fatores foram definidos a partir de um comentário do consultor do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) Reginaldo Pinto de Carvalho, na entrevista intitulada “Tem uma redação no meio do caminho”, publicada no portal “Por Trás das Letras”, concedida a Hélio Consolaro, e da qual foi destacada a citação.
Sobre a questão “por que os alunos vão tão mal na redação?”, o próprio texto inicial da entrevista sugere que pelo menos algumas perguntas girariam em torno do despreparo dos alunos e da falta de interesse em se discutir esse problema. Porém, o texto publicado no portal não mostra nem afirma que a pergunta foi feita ao consultor do Enem e, portanto, não há uma resposta sobre o tema.
Entretanto, um comentário do consultor sugere suficientes desdobramentos a respeito do tema desta pesquisa. Na opinião dele, a exigência da redação nas provas do Enem e nos vestibulares, “poderá fazer com que a sociedade exerça pressão sobre a escola para que ela cumpra sua obrigação de dotar os alunos das competências para produzir um texto coerente" (4º parágrafo do texto de abertura da entrevista).
Dessa opinião pode se abstrair que as dificuldades de aprendizagem da escrita não tem sido exclusivamente um problema dos alunos. Talvez o fato de a escola não estar cumprindo corretamente sua função de ensino da Língua Portuguesa esteja contribuindo com essa situação. Isso não significa absolutamente que bastaria um maior empenho por parte das instituições escolares na aplicação de exercícios de redação para resolver o problema. Existem outras questões a serem evidenciadas, como o próprio ensino e a capacitação e atualização dos professores.
Essas duas questões levam à reflexão sobre como a gramática tem sido ensinada ao longo dos anos e o que precisaria ser repensado nesse ensino. Os processos históricos de sistematização da língua falada reduziram-na aos signos da escrita, através dos vários alfabetos dos vários idiomas, visando uma construção correta e simples, de fácil compreensão do elemento escrito, que guardasse as informações com fidedignidade. Na língua portuguesa tal processo redundou, no entanto, em um sem-número de regras gramaticais. Criadas para facilitar os processos de registro da língua falada, tornaram-se complexas, dificilmente aprendidas pelo aluno e até mesmo por muitos professores.
Poucos autores tratam do assunto com um senso crítico aguçado que aponte caminhos na busca de soluções. A maioria sempre mostra sugestões de como fazer uma redação seguindo as mesmas regras da gramática ou usando recursos auxiliares que apenas reforçam técnicas repetitivas, como “se ater a um tema delimitado”, “ter um bom dicionário”, “uma boa gramática”, “não usar gírias”, “não usar vícios de linguagem” etc. A reportagem “Redação: o eterno bicho-papão do vestibular”, de Werciley Silva, confronta a repetição das sugestões para uma boa redação e a continuidade de textos mal estruturados:
“São Paulo - A fórmula parece bem simples: leia com atenção o tema proposto, apresente argumentos convincentes, não use vocabulário rebuscado, evite clichês e preocupe-se com ortografia e pontuação. Seguindo essas dicas, é possível fazer uma redação nota 10 nos principais vestibulares do País, garantem os professores. Mas se a receita é mesmo tão fácil, por que eles passam anos tentando fazer seus alunos escreverem melhor e, ainda assim, a redação continua a ser o bicho-papão do vestibular?” (SILVA, 2005).
Na reportagem da qual foi extraída a citação não se anuncia que em algum momento houve bons resultados por se seguir os conselhos para se fazer uma prova aceitável dentro dos parâmetros da norma culta. Porém, vários professores se manifestam quanto a situação do vestibulando sob a pressão do exíguo tempo-limite para discorrer sobre um tema sugerido na hora da prova do vestibular.
De fato, não se pode extrair um texto primoroso em somente quatro horas de prova de redação, se o preparo do vestibulando foi crítico durante toda a vida escolar. Segundo Reginaldo Pinto de Carvalho, “com um mínimo de onze anos de escolaridade, ao término do ensino básico, espera-se que o participante esteja capacitado para ler e escrever, dominando a norma culta da língua escrita” (CONSOLARO, s.d.). Ou seja, teoricamente, os alunos concludentes do ensino médio já teriam estudado mais de uma década, o suficiente para dominar a escrita.
Porém, se constata diante de uma prova de redação que esses onze anos não foram nada produtivos.
2) Mitos da gramática
Na busca de uma norma culta revisada, Marcos Bagno defende a urgente discussão de uma mudança. Tal discussão diz respeito aos mitos que envolvem a linguística e que se tornaram fator de discriminação entre os que “conhecem a norma culta” e os que “não conhecem”. Essa visão do autor sobre o domínio da gramática tradicional tem gerado polêmica. Para Bagno, as dificuldades não estão apenas no ensino ou na aprendizagem. Antes de tudo, os conceitos vigentes da gramática carecem de uma revisão urgente. O linguista afirma no discurso “Preconceito contra a lingüística e os lingüistas”:
"A gramática tradicional, funcionando como uma ideologia lingüística, foi e ainda é, como toda ideologia, o lugar das certezas, uma doutrina sólida e compacta, com resposta única e correta para todas as dúvidas. Por isso, o que não está na gramática é "erro" ou simplesmente "não é português"! A Lingüística moderna, ao encarar a língua como um objeto passível de ser analisado e interpretado segundo métodos e critérios semelhantes aos das ciências naturais, devolveu à língua seu lugar de fato social, abalando as noções antigas que viam a língua como um valor ideológico. Assim, a Lingüística, como toda ciência, é o lugar das surpresas, das descobertas, do novo.
Ora, o novo assusta, o novo subverte as certezas, compromete as estruturas de poder e dominação há muito vigentes. Não é por acaso que, mesmo entre profissionais que deveriam ter a Lingüística como seu corpo teórico e prático de referência, a doutrina gramatical tradicional ainda encontre muito apoio e defesa" (BAGNO, 2001).
O autor não se considera um defensor do “vale-tudo” (expressão do próprio) na língua portuguesa falada no Brasil. Para o linguista, “não se trata de negar a existência das formas padronizadas tradicionais, mas de descrevê-las com honestidade, mostrando sua obsolescência e o lugar restrito que cabe a elas na língua, enquanto não desaparecem de vez...” (BAGNO, 2003, p. 176). Bagno é incisivo ao afirmar que “o ensino da gramática [...] não acompanha os progressos da ciência da linguagem” (2003, p. 66). Para exemplificar essa afirmação, ele comenta:
“Qualquer pessoa bem informada acharia no mínimo estranho [...] se um professor de Ciências dissesse que a Terra é plana e o Sol gira em torno dela, ou ainda se um professor de Química afirmasse que a mistura dos "quatro elementos" (ar, água, terra e fogo) pode resultar em ouro! São ideias mais do que ultrapassadas e que começaram a ser substituídas por novas concepções mais verossímeis a partir do período da história do conhecimento ocidental conhecido como o nascimento da ciência moderna (século XVI em diante). Ninguém se espanta, porém, quando um professor de língua ensina que os substantivos são "palavras que representam os seres em geral", ou que sujeito é "o ser do qual se diz alguma coisa", ou que pronome é "a palavra que substitui o nome". São afirmações tão imprecisas e incoerentes (para não dizer francamente falsas) quanto a de que as avestruzes enterram a cabeça na areia ou que apontar para as estrelas faz nascer verruga nos dedos! E no entanto elas continuam sendo estampadas nos manuais de gramática, nos livros didáticos, nas apostilas, e cobradas em testes, exames e provas de vestibular!” (BAGNO, 2001).
De acordo com a citação, as mudanças no ensino requerem antes a necessidade urgente de revisões históricas nos conceitos dos elementos da gramática. Essas revisões implicam averiguar o que é normativo no português e o que caiu em desuso, pois, segundo o autor, muitas normas consideradas “cultas” no Brasil ainda se atêm a uma ortodoxia da língua que não admite olhares científicos para verificação de possíveis ajustes ao contexto atual.
O linguista fala, por exemplo sobre a crase histórica, um fenômeno que aconteceu no passado, mas que continua acontecendo hoje, como no caso de alcoólico e caatinga, pronunciados “alcólico” e “catinga” (2003, p. 68). No entanto, o ensino da crase limita-se ao caso da contração da preposição ‘a’ com o artigo ‘a’, como se este fosse o único exemplo existente. Uma iniciativa de se ensinar esse conceito poderia causar uma revolução no ensino da crase, e do acento grave.
Bagno também afirma existirem mitos sobre a língua portuguesa falada no Brasil que precisam ser investigados mais seriamente, antes de se considerar o certo e o errado no ensino da língua. Lançando mão de assertivas críticas sobre os gramáticos tradicionais, considera-os um grupo elitista a impor suas regras da língua como definitivas, não deixando abertura às reflexões sobre os fatores que influenciam os casos de mudança na língua e a aprendizagem deficiente desta.
Essa postura dos gramáticos, para Bagno, causa um preconceito contra o cidadão que, por condições diversas, não apreendeu essas regras. Em “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz” (2004), o autor enumera oito mitos geradores de preconceitos linguísticos a respeito dos quais "[...] é preciso que cada professor de língua assuma uma posição de cientista e investigador, de produtor de seu próprio conhecimento lingüístico teórico e prático, e abandone a velha atitude repetidora e reprodutora de uma doutrina gramatical e incoerente" (BAGNO, 2004).
Dos mitos de Bagno, cita-se aqui o sétimo, “É preciso saber gramática para falar e escrever bem”, sobre o qual o autor afirma:
“É difícil encontrar alguém que não concorde com a declaração acima. Ela vive na ponta da língua da grande maioria dos professores de português e está formulada em muitos compêndios gramaticais [...]
Por que aquela declaração é um mito? Porque, como nos diz Mário Perini em Sofrendo a gramática (p. 50), “não existe um grão de evidência em favor disso; toda evidência disponível é em contrário”. Afinal, se fosse assim, todos os gramáticos seriam grandes escritores (o que está longe de ser verdade), e os bons escritores seriam especialistas em gramática” (BAGNO, 2004, p.62).
O enunciado da última frase da citação pode ser elucidado em forma de pergunta: quantos gramáticos já escreveram um romance e quantos grandes escritores já publicaram um livro sobre a gramática? O livro “A língua de Eulália” (BAGNO, 2005) também exemplifica de modo extenso o mito número 4 do preconceito linguístico: “as pessoas sem instrução falam tudo errado” (BAGNO, 2004, p. 40). Para explicar esta afirmação como um mito, Bagno recorre ao que chama de fenômeno fonético ocorrido ao longo da evolução da língua portuguesa padrão, como aconteceu com as palavras “brando”, “cravo” e “obrigar”, dos originais em latim “blandu”, “clavu” e “obligare”. Bagno lista outras nove palavras que sofreram o fenômeno fonético na letra “l”e afirma:
“Como é fácil notar, todas as palavras do português-padrão listadas acima tinham, na sua origem, um L bem nítido que se transformou em R. E agora? Se fôssemos pensar que as pessoas que dizem Cráudia, chicrete e pranta têm algum “defeito” ou “atraso mental”, seríamos forçados a admitir que toda a população da província romana da Lusitânia também tinha esse mesmo problema [...]. E que o grande Luís de Camões também sofria desse mesmo mal, já que escreveu ingrês, pubricar, pranta, frauta, frecha na obra que é considerada até hoje o maior monumento literário do português clássico, o poema Os Lusíadas. E isso, é “craro”, seria no mínimo absurdo” (BAGNO, 2004, p. 41).
Com essas explicações pode-se perceber que tanto a língua falada como escrita estão em constante transformação, e que o conceito de norma-padrão depende muito das épocas e circunstâncias em que tais normas são aplicadas. Por conseguinte, tanto o ensino quanto a norma-padrão da gramática não estão isentos de discussões sobre seus ajustes à realidade do seu momento, o que implicaria em muitos cânones da gramática se submeterem a revisões para sua contextualização a cada etapa histórico-cultural, ou até mesmo a um completo desuso.
Porém, o que se observa na vivência em sala de aula é a prática recorrente de um mesmo procedimento de ensino das regras gramaticais, ocasionando as mesmas reações de sentimento frustrante do professor ao detectar resultados considerados deficientes, resultados esses que até recebem a atenção corretiva, mas cujas causas passam ao largo de uma investigação por parte do docente. Segundo Bagno, essas deficiências podem ser ocasionadas por diversos fatores, mas os responsáveis pelo ensino ainda não estão atentos a isso:
“O ensino da língua ainda é feito com base em dogmas, preceitos e regras que nada têm de científicos – e esse é seu maior defeito. Fomos habituados a aprender e a ensinar português como se a língua fosse uma coisa imóvel, pronta, acabada, estática sem nenhuma possibilidade de mudança, variação, transformação. Essa é a atitude dos gramáticos tradicionalistas, exatamente oposta à dos lingüistas, que são os cientistas da linguagem.
[...]
Para o lingüista, ao contrário, o que a gramática tradicional chama de “erro” é um fenômeno que merece ser investigado cientificamente, com métodos rigorosos de análise. Se alguém diz y onde era de se esperar x, é porque existe algum fator que está influenciando essa variação. Esse fator pode ser linguístico, social, étnico, histórico, geográfico, etário etc.” (BAGNO, 2003, p. 65-6).
Se o preconceito pretende distinguir indivíduos intelectualizados dos cidadãos com pouco conhecimento da gramática, os próprios intelectuais não podem escapar às armadilhas do português castiço que enredam até profissionais de áreas cujo domínio da língua escrita é indispensável, como o jornalismo. A partir de uma referência que faz a um texto da jornalista Dora Kramer, Bagno ironiza:
"O mais sintomático, porém, no que diz respeito à relação preconceito lingüístico/preconceito social, é que no trecho final [...] a jornalista escreveu o seguinte:
'Havia receio entre os petistas reunidos [...] com a possibilidade de vir a público gravações [...].10 Como já afirmei, os 'erros crassos' de 'concordância e plural' só são crassos quando cometidos pelos outros, pelos que não pertencem ao meio social da acusadora, pelos que não tiveram o mesmo acesso que ela a uma cultura letrada, pretensamente superior... Afinal, nesse trecho da coluna aparece algo que qualquer gramático conservador acusaria, sem pestanejar, de 'erro crasso', e justamente um erro de concordância verbal – de vir a público [...] gravações! Se são gravações, no plural, o verbo vir, pelas regras da concordância que a jornalista tanto preza, deveria vir também no plural: virem. Então, 'de virem a público [...] gravações. [...]'.
“Receio com”? Não seria receio quanto à possibilidade? Não poderiam os leitores, segundo os critérios da própria jornalista, ter receio com ficar de dor de ouvido diante de tantos 'erros crassos'?" (BAGNO, 2003, p. 23-4, itálicos originais).
Esta citação é apenas um exemplo, dentre tantos ocorridos no meio jornalístico, do quanto é comprometedor assumir uma postura de detentor da erudição gramatical, e principalmente, de se posicionar como juiz dos que não possuem esse conhecimento, sob o risco de incorrer no próprio objeto de juízo, ou seja, no erro gramatical.
Mas, se entre profissionais conceituados acontecem esses percalços de erros gramaticais, o senso comum mais estigmatizado é o da população consigo mesma, de que não detém um conhecimento aceitável da língua escrita e, por isso, se exclui dos grupos intelectuais da norma culta. Se for este o caso, essa população está aceitando, inconsciente e passivamente, o fato de pertencer a um grupo em desvantagem na sua condição sócio-intelectual, e se acomodando a essa condição, confirmando que, segundo Bagno, o domínio da escrita também é visto como um fator de domínio de classes:
“A Gramática Tradicional permanece viva e forte porque, ao longo da história, ela deixou de ser apenas uma tentativa de explicação filosófica para os fenômenos da linguagem humana e foi transformada em mais um dos muitos elementos de dominação de uma parcela da sociedade sobre as demais. Assim como, no curso do tempo, tem se falado da Família, da Pátria, da Lei, da Fé etc. como entidades sacrossantas, como valores perenes e imutáveis, também a Língua foi elevada a essa categoria abstrata, devendo, portanto, ser 'preservada' em sua 'pureza', 'defendida' dos ataques dos 'barbarismos', 'conservada' como um 'patrimônio' que não pode sofrer 'ruína' e 'corrupção'. Assim, língua não é toda e qualquer manifestação oral e/ou escrita de qualquer ser humano, de qualquer falante nativo do idioma: 'a Língua', com artigo definido e inicial maiúscula, é somente aquele ideal de pureza e virtude. A língua deixou de ser fato para se transformar em valor” (BAGNO, 2001).
Esse domínio em muitos casos se constitui em um elemento subliminar. Por exemplo, no livro “Alfabetização e Lingüística” Luis Carlos Cagliari (1995) exemplifica duas reações distintas de alunos cuja vivência com a leitura e escrita são diferentes, deixando transparecer a ideia que esses alunos pertencem a classes sociais opostas. O primeiro exemplo de Cagliari é o da escrita exigida na escola tornar-se estranha, indesejável e inútil para um aluno de família de classe social baixa, onde a escrita mais familiar pode se restringir à assinatura do nome ou a pequenos recados. O segundo, ao contrário, é de um estudante que não sentirá estranheza em sala de aula por conviver com pessoas adeptas de leituras diversas, familiarizado com livros, revistas, jornais, (Cagliari, 1995, p. 101).
Note-se que Cagliari se refere ao aluno desinteressado pela aprendizagem da escrita como um indivíduo de “classe social baixa”, o que quer dizer, de situação econômica desfavorável e pertencente a um meio familiar no qual a leitura, a escrita e outras formas de manifestação “intelectual” são supostamente negligenciadas. O autor não define o nível social do aluno familiarizado com a escrita fora da sala de aula, mas o fato de ter mencionado a condição social desfavorável do primeiro aluno pode sugerir que o segundo pertence a uma classe “alta”. Se esses exemplos forem verdadeiros, é de se supor que se enquadrariam na crítica do preconceito linguístico e social denunciado por Bagno.
A possibilidade de toda essa reformulação nos conceitos e no ensino acontecerem rapidamente está extremamente comprometida, pois no mínimo são necessários uma conscientização e um consenso sobre mudança de pensamento entre os responsáveis por estabelecer esses conceitos – e pré-conceitos – gramaticais já fixados no ensino da norma culta da língua, e uma familiarização dos professores com as novas ideias que podem surgir.
Os ritos da redação
Paralelamente à revisão do tratamento da gramática, há a necessidade de uma revisão nos conceitos do ensino do próprio escrever, ou seja, da redação. Se, de acordo com Bagno, a gramática deve ser contextualizada para ser ensinada, entender como necessitamos nos reeducar (MARQUES, 1997, p. 13) é uma alternativa para o indivíduo já vivenciado na aprendizagem da escrita, não apenas o aluno, mas também o professor. Seria repensar o “que” e “como” foi ensinado, o que se considera necessário mudar, quais as motivações, limitações, o que se espera da redação e o que despertaria no aluno o interesse por se dedicar à busca da qualidade nos próprios textos. Seria uma “revisão do ensino da redação”, com uma troca de informações que poderiam auxiliar esse indivíduo a não continuar “bitolado”, como afirma Marques (1997, p. 13).
Um aspecto do ensino da redação a ser posto em observação é o costumeiro processo de introdução-desenvolvimento-conclusão. O ensino da sequência obrigatória dessa tríade também é passível de uma reformulação, uma vez que essa seqüência tende a obrigar o indivíduo a se deter em uma dessas etapas, na sua ordem de apresentação, enquanto produz o texto. A ideia fixada na aprendizagem é a de que deve ser feita uma redação, iniciada por um tópico frasal, em torno do qual se desenvolva e se conclua o pensamento. Mas se não for explicado ao aluno que a introdução deve ser a última etapa a ser concluída, ele pode se deter infinitamente sobre um início de texto à procura de palavras que nunca definirão seu tópico frasal. Na opinião de Mário Osório Marques, há um “ritual” costumeiro do escrever que deve ser revisto em sua prática:
“[...] nos ensinaram a escrever e na lamentável forma de uma mecânica que supunha texto prévio, mensagem já elaborada. Escrevia-se antes o que se pensara. Agora entendo o contrário: escrever para pensar, uma outra forma de conversar.
Assim fomos ‘alfabetizados’, em obediência a certos rituais. Fomos induzidos a, desde cedo, escrever bonito e certo. Era preciso ter um começo, um desenvolvimento e um fim predeterminados. Isso estragava, porque bitolava, o começo e todo o resto. Tentaremos agora (quem? eu e você, leitor) conversando entender como necessitamos nos reeducar para fazer do escrever um ato inaugural; não apenas transcrição do que tínhamos em mente, do que já foi pensado ou dito, mas inauguração do próprio pensar” (MARQUES, 1997, p. 13).
A afirmação “escrever para pensar” intenciona a despreocupação com sequências dos pensamentos de outrem, e o começo de um pensar por si mesmo. É o indivíduo em aprendizagem escrevendo sob indução própria, vagando nas ideias que lhe surgem para serem colocadas no papel sem uma ordem exata, sem o “bonito” e o “certo”, mas que pode fazer sentido para ele. Escrevendo antes, se pensa depois. São os pensamentos materializados em um rascunho sem uma lógica aparente, para depois serem transformados em texto acabado.
“Escrever para pensar” é uma prática inversa dos exercícios de redação comumente aplicados nas escolas. É um escrever antes, sem uma preocupação prévia com exatidão gramatical e com a ordem do que se está escrevendo. Mas, geralmente não se explica ao aluno que ele pode escrever sem preocupação com ordens e depois encadear as idéias numa seqüência considerada lógica. Dado o tema para a redação, o aluno procura desenvolver o assunto, mas o processo pode estancar se ele aprendeu que, antes do desenvolvimento, é necessário que se escreva uma introdução. Pode-se perder muito tempo nessa fase introdutória, principalmente porque ainda nem se escreveu nada, para se saber a delimitação e o caminho a seguir. Até se chegar ao desenvolvimento, tudo o que não foi registrado por causa da ocupação com a introdução já tomou outro rumo ou se dissipou.
Um recurso também esquecido ou pouco usado na aula é a edição de texto. Antes do computador isso talvez não fosse prático, pois se gastariam folhas e folhas, borrachas e borrachas. Mas, hoje, a edição digital permite um movimento de parágrafos, troca de palavras, cortes de termos desnecessários, enxugamento de períodos etc., até que se chegue ao produto final. Mesmo que não resolva a situação, pois até para se editar é preciso conhecimento no trato textual, a edição é muito útil como recurso auxiliar. Depois da escrita inicial, com uma observação sobre a própria, verifica-se o que se deve corrigir, mudar de lugar e reescrever.
O fato de uma redação iniciar com a conclusão ou com o desenvolvimento pode muito bem ser a experiência que fará o aluno construir sua redação na sequência exigida pelo professor. Autores de novelas e filmes, geralmente, iniciam suas histórias a partir do fim, para esquematizarem o início e desenvolvimento da trama. Muitas excelentes redações começam no final. Se é que o final existe.
Sobre tipos de textos
Uma das partes mais importantes na revisão do ensino da redação são as explicações dos diversos tipos de texto ensinados ao aluno. Geralmente os livros sobre redação distinguem três: o narrativo, o descritivo e o dissertativo. Com um pouco de otimismo, mesmo que o aluno conheça as diferenças entre esses conceitos textuais, é possível que nunca tenha ouvido falar em dissertação argumentativa, muito menos que pode haver subdivisões dos conceitos dos três tipos de textos. Para Lúcia Santaella, a divisão entre narração, dissertação e descrição representa uma limitação dos tipos existentes e diferenciadores de textos:
“Será que apenas essa divisão em três blocos (descrição, narração, dissertação) é capaz de dar margem à classificação das inúmeras possibilidades de atualização da linguagem verbal? Dos diferenciados matizes que a expressão verbal pode assumir? Não seria possível, então, distinguir uma descrição poética de uma científica? A dissertação einsteiniana de um editorial de jornal? Ou uma narrativa de Guimarães Rosa do livro de aventuras que se lê no ônibus ou à noite para vir o sono? Foi ao nos depararmos com a precariedade dessa divisão [...] que nos surgiu a hipótese de que o interior de cada um desses três blocos permitia (cada um deles) uma subdivisão (subclassificação) também triádica [...] Desse modo, a descrição poderia se subdividir em descrição de primeiridade, de secundidade e de terceiridade, assim como a narração e a dissertação” (SANTAELLA, 1980 p. 194).
Para exemplificar o que seriam essas subdivisões, toma-se aqui a visão triádica (o hipotético, o relacional e o argumentativo) de Santaella sobre o texto dissertativo, por ser este o tipo de redação mais exigido no vestibular:
“Desse modo, relacionamos o discurso dissertativo hipotético (isto é, em nível de primeiridade) [...] Não é,pois, um texto de caráter conclusivo, mas de levantamento de problemas e conjecturas [...].
Já à dissertação em nível de secundidade chamamos discurso dissertativo relacional [...] estamos nos referindo ao discurso que correlaciona suposições teóricas com fatos, e através desses fatos pretende testar a comprovação da teoria [...].
O terceiro tipo de processo dissertativo, que nomeamos discurso dissertativo argumentativo, encontra-se intimamente ligado aos mecanismos do raciocínio dedutivo. [...] O objetivo de tal raciocínio é determinar a aceitação da conclusão” (SANTAELLA, 1980, p. 200-3).
Como se pode deduzir, a falta do domínio das regras ortográficas e até de conhecimento sobre as estruturas e conceitos textuais como o de Santaella se refletem por toda uma situação, e não realmente em um problema dos alunos.
Assim, tenta-se esboçar aqui uma sequência de ações em um esquema exemplificando como as mudanças sobre o ensino da gramática e da redação ocorreriam:
1) Conscientização e consenso entre os gramáticos sobre a necessidade da revisão gramatical e da redação;
2) Reformulações nos conceitos da gramática e da redação;
3) Considerar a motivação no ensino da redação;
4) Prática de ensino de acordo com essas reformulações e através da motivação;
5) Avaliação e discussão sobre os resultados dessa prática no discente;
6) Se os resultados ainda se apresentarem aquém do esperado, sugere-se um retorno aos itens 2 a 5, com pressão não somente sobre a escola, mas em todo o conjunto envolvido, para que os alunos possam ser dotados das “competências para produzir um texto coerente";
7) Nova avaliação sobre o rendimento discente.
Não pretendo definir esse esquema como determinante de uma completa transformação de conceitos (quem sou eu para isso?), nem como o caminho a ser seguido para obtenção de boas redações. Mas, uma experiência com a sequência acima seria um começo interessante, pois, em termos práticos, para que haja uma reformulação no ensino da gramática e consequentemente uma nova configuração no ensino-aprendizagem da escrita, é necessária uma troca de conhecimentos entre todos os sujeitos ativos da área do ensino da língua, com o abandono dos preconceitos existentes entre linguistas e gramáticos, o reconhecimento das competências do outro, valorizando-se esse “outro” como integrante do inteligente coletivo, reconhecendo-se os saberes de todos os seres humanos.
Referências
BAGNO, Marcos. A língua de Eulália – novela sociolingüística. 14. ed. São Paulo: Contexto, 2005.
______. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2004.
______. A norma oculta: língua e poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.
______. Língua materna. São Paulo: Parábola Editorial, 2002.
______. Preconceito contra a lingüística e os lingüistas. Mesa-redonda: Língua e discriminação. 13º Congresso de Leitura do Brasil. Campinas, 2001. Disponível em http://www.marcosbagno.com.br/conteudo/arquivos/art_preconceito_linguistas.htm. Acesso em 26 abr. 2010.
CAGLIARI, Luis Carlos. Alfabetização e Lingüística. 8. ed. São Paulo: Scipione, 1995.
CONSOLARO, Hélio. Tem uma redação no meio do caminho. Disponível em http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=entrevistas/docs/reginaldopinto. Acesso em 26 abr. 2010.
INTERATIVIDADES. Lúcia Santaella. Disponível em http://www.itaucultural.org.br/interatividades2003/santaella.cfm. Acesso em 8 jun. 2010.
MARQUES, Mário Osório. Escrever é preciso: o princípio da pesquisa. Ijuí: UNIJUÍ, 1997.
SANTAELLA, Lúcia. Por uma classificação da linguagem escrita. In: Produção da linguagem e ideologia. São Paulo: Cortez, 1980.
SILVA, Werciley. Redação: o eterno bicho-papão do vestibular. Disponível em http://www.eadvirtual.com.br/moodle/mod/forum/discuss.php?d=21. Acesso em 26 abr. 2010.
UNIJUÍ UNIVERSIDADE REGIONAL. Sala Mário Osório. Mário Osório Marques. Disponível em: http://www.unijui.edu.br/content/view/702/1431/lang,iso-8859-1/. Acesso em 4 jun/2010.
WIKIPEDIA, a enciclopédia livre. Marcos Bagno. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Marcos_Bagno. Acesso em 4 jun/2010.
1) Os mitos e os ritos por trás das letras
“Por que os alunos vão tão mal na redação? Eis um belo mote para dissertação, com ingredientes de sobra para um debate acalorado. Por muito tempo, porém, em vez de procurar argumentos, defender pontos de vista e buscar soluções, muita gente preferiu fugir do tema” (Hélio Consolaro, s.d.).
Instigados pela interrogativa de Hélio Consolaro, observamos neste momento o tratamento dado ao ensino da gramática e da redação. Esses fatores foram definidos a partir de um comentário do consultor do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) Reginaldo Pinto de Carvalho, na entrevista intitulada “Tem uma redação no meio do caminho”, publicada no portal “Por Trás das Letras”, concedida a Hélio Consolaro, e da qual foi destacada a citação.
Sobre a questão “por que os alunos vão tão mal na redação?”, o próprio texto inicial da entrevista sugere que pelo menos algumas perguntas girariam em torno do despreparo dos alunos e da falta de interesse em se discutir esse problema. Porém, o texto publicado no portal não mostra nem afirma que a pergunta foi feita ao consultor do Enem e, portanto, não há uma resposta sobre o tema.
Entretanto, um comentário do consultor sugere suficientes desdobramentos a respeito do tema desta pesquisa. Na opinião dele, a exigência da redação nas provas do Enem e nos vestibulares, “poderá fazer com que a sociedade exerça pressão sobre a escola para que ela cumpra sua obrigação de dotar os alunos das competências para produzir um texto coerente" (4º parágrafo do texto de abertura da entrevista).
Dessa opinião pode se abstrair que as dificuldades de aprendizagem da escrita não tem sido exclusivamente um problema dos alunos. Talvez o fato de a escola não estar cumprindo corretamente sua função de ensino da Língua Portuguesa esteja contribuindo com essa situação. Isso não significa absolutamente que bastaria um maior empenho por parte das instituições escolares na aplicação de exercícios de redação para resolver o problema. Existem outras questões a serem evidenciadas, como o próprio ensino e a capacitação e atualização dos professores.
Essas duas questões levam à reflexão sobre como a gramática tem sido ensinada ao longo dos anos e o que precisaria ser repensado nesse ensino. Os processos históricos de sistematização da língua falada reduziram-na aos signos da escrita, através dos vários alfabetos dos vários idiomas, visando uma construção correta e simples, de fácil compreensão do elemento escrito, que guardasse as informações com fidedignidade. Na língua portuguesa tal processo redundou, no entanto, em um sem-número de regras gramaticais. Criadas para facilitar os processos de registro da língua falada, tornaram-se complexas, dificilmente aprendidas pelo aluno e até mesmo por muitos professores.
Poucos autores tratam do assunto com um senso crítico aguçado que aponte caminhos na busca de soluções. A maioria sempre mostra sugestões de como fazer uma redação seguindo as mesmas regras da gramática ou usando recursos auxiliares que apenas reforçam técnicas repetitivas, como “se ater a um tema delimitado”, “ter um bom dicionário”, “uma boa gramática”, “não usar gírias”, “não usar vícios de linguagem” etc. A reportagem “Redação: o eterno bicho-papão do vestibular”, de Werciley Silva, confronta a repetição das sugestões para uma boa redação e a continuidade de textos mal estruturados:
“São Paulo - A fórmula parece bem simples: leia com atenção o tema proposto, apresente argumentos convincentes, não use vocabulário rebuscado, evite clichês e preocupe-se com ortografia e pontuação. Seguindo essas dicas, é possível fazer uma redação nota 10 nos principais vestibulares do País, garantem os professores. Mas se a receita é mesmo tão fácil, por que eles passam anos tentando fazer seus alunos escreverem melhor e, ainda assim, a redação continua a ser o bicho-papão do vestibular?” (SILVA, 2005).
Na reportagem da qual foi extraída a citação não se anuncia que em algum momento houve bons resultados por se seguir os conselhos para se fazer uma prova aceitável dentro dos parâmetros da norma culta. Porém, vários professores se manifestam quanto a situação do vestibulando sob a pressão do exíguo tempo-limite para discorrer sobre um tema sugerido na hora da prova do vestibular.
De fato, não se pode extrair um texto primoroso em somente quatro horas de prova de redação, se o preparo do vestibulando foi crítico durante toda a vida escolar. Segundo Reginaldo Pinto de Carvalho, “com um mínimo de onze anos de escolaridade, ao término do ensino básico, espera-se que o participante esteja capacitado para ler e escrever, dominando a norma culta da língua escrita” (CONSOLARO, s.d.). Ou seja, teoricamente, os alunos concludentes do ensino médio já teriam estudado mais de uma década, o suficiente para dominar a escrita.
Porém, se constata diante de uma prova de redação que esses onze anos não foram nada produtivos.
2) Mitos da gramática
Na busca de uma norma culta revisada, Marcos Bagno defende a urgente discussão de uma mudança. Tal discussão diz respeito aos mitos que envolvem a linguística e que se tornaram fator de discriminação entre os que “conhecem a norma culta” e os que “não conhecem”. Essa visão do autor sobre o domínio da gramática tradicional tem gerado polêmica. Para Bagno, as dificuldades não estão apenas no ensino ou na aprendizagem. Antes de tudo, os conceitos vigentes da gramática carecem de uma revisão urgente. O linguista afirma no discurso “Preconceito contra a lingüística e os lingüistas”:
"A gramática tradicional, funcionando como uma ideologia lingüística, foi e ainda é, como toda ideologia, o lugar das certezas, uma doutrina sólida e compacta, com resposta única e correta para todas as dúvidas. Por isso, o que não está na gramática é "erro" ou simplesmente "não é português"! A Lingüística moderna, ao encarar a língua como um objeto passível de ser analisado e interpretado segundo métodos e critérios semelhantes aos das ciências naturais, devolveu à língua seu lugar de fato social, abalando as noções antigas que viam a língua como um valor ideológico. Assim, a Lingüística, como toda ciência, é o lugar das surpresas, das descobertas, do novo.
Ora, o novo assusta, o novo subverte as certezas, compromete as estruturas de poder e dominação há muito vigentes. Não é por acaso que, mesmo entre profissionais que deveriam ter a Lingüística como seu corpo teórico e prático de referência, a doutrina gramatical tradicional ainda encontre muito apoio e defesa" (BAGNO, 2001).
O autor não se considera um defensor do “vale-tudo” (expressão do próprio) na língua portuguesa falada no Brasil. Para o linguista, “não se trata de negar a existência das formas padronizadas tradicionais, mas de descrevê-las com honestidade, mostrando sua obsolescência e o lugar restrito que cabe a elas na língua, enquanto não desaparecem de vez...” (BAGNO, 2003, p. 176). Bagno é incisivo ao afirmar que “o ensino da gramática [...] não acompanha os progressos da ciência da linguagem” (2003, p. 66). Para exemplificar essa afirmação, ele comenta:
“Qualquer pessoa bem informada acharia no mínimo estranho [...] se um professor de Ciências dissesse que a Terra é plana e o Sol gira em torno dela, ou ainda se um professor de Química afirmasse que a mistura dos "quatro elementos" (ar, água, terra e fogo) pode resultar em ouro! São ideias mais do que ultrapassadas e que começaram a ser substituídas por novas concepções mais verossímeis a partir do período da história do conhecimento ocidental conhecido como o nascimento da ciência moderna (século XVI em diante). Ninguém se espanta, porém, quando um professor de língua ensina que os substantivos são "palavras que representam os seres em geral", ou que sujeito é "o ser do qual se diz alguma coisa", ou que pronome é "a palavra que substitui o nome". São afirmações tão imprecisas e incoerentes (para não dizer francamente falsas) quanto a de que as avestruzes enterram a cabeça na areia ou que apontar para as estrelas faz nascer verruga nos dedos! E no entanto elas continuam sendo estampadas nos manuais de gramática, nos livros didáticos, nas apostilas, e cobradas em testes, exames e provas de vestibular!” (BAGNO, 2001).
De acordo com a citação, as mudanças no ensino requerem antes a necessidade urgente de revisões históricas nos conceitos dos elementos da gramática. Essas revisões implicam averiguar o que é normativo no português e o que caiu em desuso, pois, segundo o autor, muitas normas consideradas “cultas” no Brasil ainda se atêm a uma ortodoxia da língua que não admite olhares científicos para verificação de possíveis ajustes ao contexto atual.
O linguista fala, por exemplo sobre a crase histórica, um fenômeno que aconteceu no passado, mas que continua acontecendo hoje, como no caso de alcoólico e caatinga, pronunciados “alcólico” e “catinga” (2003, p. 68). No entanto, o ensino da crase limita-se ao caso da contração da preposição ‘a’ com o artigo ‘a’, como se este fosse o único exemplo existente. Uma iniciativa de se ensinar esse conceito poderia causar uma revolução no ensino da crase, e do acento grave.
Bagno também afirma existirem mitos sobre a língua portuguesa falada no Brasil que precisam ser investigados mais seriamente, antes de se considerar o certo e o errado no ensino da língua. Lançando mão de assertivas críticas sobre os gramáticos tradicionais, considera-os um grupo elitista a impor suas regras da língua como definitivas, não deixando abertura às reflexões sobre os fatores que influenciam os casos de mudança na língua e a aprendizagem deficiente desta.
Essa postura dos gramáticos, para Bagno, causa um preconceito contra o cidadão que, por condições diversas, não apreendeu essas regras. Em “Preconceito lingüístico: o que é, como se faz” (2004), o autor enumera oito mitos geradores de preconceitos linguísticos a respeito dos quais "[...] é preciso que cada professor de língua assuma uma posição de cientista e investigador, de produtor de seu próprio conhecimento lingüístico teórico e prático, e abandone a velha atitude repetidora e reprodutora de uma doutrina gramatical e incoerente" (BAGNO, 2004).
Dos mitos de Bagno, cita-se aqui o sétimo, “É preciso saber gramática para falar e escrever bem”, sobre o qual o autor afirma:
“É difícil encontrar alguém que não concorde com a declaração acima. Ela vive na ponta da língua da grande maioria dos professores de português e está formulada em muitos compêndios gramaticais [...]
Por que aquela declaração é um mito? Porque, como nos diz Mário Perini em Sofrendo a gramática (p. 50), “não existe um grão de evidência em favor disso; toda evidência disponível é em contrário”. Afinal, se fosse assim, todos os gramáticos seriam grandes escritores (o que está longe de ser verdade), e os bons escritores seriam especialistas em gramática” (BAGNO, 2004, p.62).
O enunciado da última frase da citação pode ser elucidado em forma de pergunta: quantos gramáticos já escreveram um romance e quantos grandes escritores já publicaram um livro sobre a gramática? O livro “A língua de Eulália” (BAGNO, 2005) também exemplifica de modo extenso o mito número 4 do preconceito linguístico: “as pessoas sem instrução falam tudo errado” (BAGNO, 2004, p. 40). Para explicar esta afirmação como um mito, Bagno recorre ao que chama de fenômeno fonético ocorrido ao longo da evolução da língua portuguesa padrão, como aconteceu com as palavras “brando”, “cravo” e “obrigar”, dos originais em latim “blandu”, “clavu” e “obligare”. Bagno lista outras nove palavras que sofreram o fenômeno fonético na letra “l”e afirma:
“Como é fácil notar, todas as palavras do português-padrão listadas acima tinham, na sua origem, um L bem nítido que se transformou em R. E agora? Se fôssemos pensar que as pessoas que dizem Cráudia, chicrete e pranta têm algum “defeito” ou “atraso mental”, seríamos forçados a admitir que toda a população da província romana da Lusitânia também tinha esse mesmo problema [...]. E que o grande Luís de Camões também sofria desse mesmo mal, já que escreveu ingrês, pubricar, pranta, frauta, frecha na obra que é considerada até hoje o maior monumento literário do português clássico, o poema Os Lusíadas. E isso, é “craro”, seria no mínimo absurdo” (BAGNO, 2004, p. 41).
Com essas explicações pode-se perceber que tanto a língua falada como escrita estão em constante transformação, e que o conceito de norma-padrão depende muito das épocas e circunstâncias em que tais normas são aplicadas. Por conseguinte, tanto o ensino quanto a norma-padrão da gramática não estão isentos de discussões sobre seus ajustes à realidade do seu momento, o que implicaria em muitos cânones da gramática se submeterem a revisões para sua contextualização a cada etapa histórico-cultural, ou até mesmo a um completo desuso.
Porém, o que se observa na vivência em sala de aula é a prática recorrente de um mesmo procedimento de ensino das regras gramaticais, ocasionando as mesmas reações de sentimento frustrante do professor ao detectar resultados considerados deficientes, resultados esses que até recebem a atenção corretiva, mas cujas causas passam ao largo de uma investigação por parte do docente. Segundo Bagno, essas deficiências podem ser ocasionadas por diversos fatores, mas os responsáveis pelo ensino ainda não estão atentos a isso:
“O ensino da língua ainda é feito com base em dogmas, preceitos e regras que nada têm de científicos – e esse é seu maior defeito. Fomos habituados a aprender e a ensinar português como se a língua fosse uma coisa imóvel, pronta, acabada, estática sem nenhuma possibilidade de mudança, variação, transformação. Essa é a atitude dos gramáticos tradicionalistas, exatamente oposta à dos lingüistas, que são os cientistas da linguagem.
[...]
Para o lingüista, ao contrário, o que a gramática tradicional chama de “erro” é um fenômeno que merece ser investigado cientificamente, com métodos rigorosos de análise. Se alguém diz y onde era de se esperar x, é porque existe algum fator que está influenciando essa variação. Esse fator pode ser linguístico, social, étnico, histórico, geográfico, etário etc.” (BAGNO, 2003, p. 65-6).
Se o preconceito pretende distinguir indivíduos intelectualizados dos cidadãos com pouco conhecimento da gramática, os próprios intelectuais não podem escapar às armadilhas do português castiço que enredam até profissionais de áreas cujo domínio da língua escrita é indispensável, como o jornalismo. A partir de uma referência que faz a um texto da jornalista Dora Kramer, Bagno ironiza:
"O mais sintomático, porém, no que diz respeito à relação preconceito lingüístico/preconceito social, é que no trecho final [...] a jornalista escreveu o seguinte:
'Havia receio entre os petistas reunidos [...] com a possibilidade de vir a público gravações [...].10 Como já afirmei, os 'erros crassos' de 'concordância e plural' só são crassos quando cometidos pelos outros, pelos que não pertencem ao meio social da acusadora, pelos que não tiveram o mesmo acesso que ela a uma cultura letrada, pretensamente superior... Afinal, nesse trecho da coluna aparece algo que qualquer gramático conservador acusaria, sem pestanejar, de 'erro crasso', e justamente um erro de concordância verbal – de vir a público [...] gravações! Se são gravações, no plural, o verbo vir, pelas regras da concordância que a jornalista tanto preza, deveria vir também no plural: virem. Então, 'de virem a público [...] gravações. [...]'.
“Receio com”? Não seria receio quanto à possibilidade? Não poderiam os leitores, segundo os critérios da própria jornalista, ter receio com ficar de dor de ouvido diante de tantos 'erros crassos'?" (BAGNO, 2003, p. 23-4, itálicos originais).
Esta citação é apenas um exemplo, dentre tantos ocorridos no meio jornalístico, do quanto é comprometedor assumir uma postura de detentor da erudição gramatical, e principalmente, de se posicionar como juiz dos que não possuem esse conhecimento, sob o risco de incorrer no próprio objeto de juízo, ou seja, no erro gramatical.
Mas, se entre profissionais conceituados acontecem esses percalços de erros gramaticais, o senso comum mais estigmatizado é o da população consigo mesma, de que não detém um conhecimento aceitável da língua escrita e, por isso, se exclui dos grupos intelectuais da norma culta. Se for este o caso, essa população está aceitando, inconsciente e passivamente, o fato de pertencer a um grupo em desvantagem na sua condição sócio-intelectual, e se acomodando a essa condição, confirmando que, segundo Bagno, o domínio da escrita também é visto como um fator de domínio de classes:
“A Gramática Tradicional permanece viva e forte porque, ao longo da história, ela deixou de ser apenas uma tentativa de explicação filosófica para os fenômenos da linguagem humana e foi transformada em mais um dos muitos elementos de dominação de uma parcela da sociedade sobre as demais. Assim como, no curso do tempo, tem se falado da Família, da Pátria, da Lei, da Fé etc. como entidades sacrossantas, como valores perenes e imutáveis, também a Língua foi elevada a essa categoria abstrata, devendo, portanto, ser 'preservada' em sua 'pureza', 'defendida' dos ataques dos 'barbarismos', 'conservada' como um 'patrimônio' que não pode sofrer 'ruína' e 'corrupção'. Assim, língua não é toda e qualquer manifestação oral e/ou escrita de qualquer ser humano, de qualquer falante nativo do idioma: 'a Língua', com artigo definido e inicial maiúscula, é somente aquele ideal de pureza e virtude. A língua deixou de ser fato para se transformar em valor” (BAGNO, 2001).
Esse domínio em muitos casos se constitui em um elemento subliminar. Por exemplo, no livro “Alfabetização e Lingüística” Luis Carlos Cagliari (1995) exemplifica duas reações distintas de alunos cuja vivência com a leitura e escrita são diferentes, deixando transparecer a ideia que esses alunos pertencem a classes sociais opostas. O primeiro exemplo de Cagliari é o da escrita exigida na escola tornar-se estranha, indesejável e inútil para um aluno de família de classe social baixa, onde a escrita mais familiar pode se restringir à assinatura do nome ou a pequenos recados. O segundo, ao contrário, é de um estudante que não sentirá estranheza em sala de aula por conviver com pessoas adeptas de leituras diversas, familiarizado com livros, revistas, jornais, (Cagliari, 1995, p. 101).
Note-se que Cagliari se refere ao aluno desinteressado pela aprendizagem da escrita como um indivíduo de “classe social baixa”, o que quer dizer, de situação econômica desfavorável e pertencente a um meio familiar no qual a leitura, a escrita e outras formas de manifestação “intelectual” são supostamente negligenciadas. O autor não define o nível social do aluno familiarizado com a escrita fora da sala de aula, mas o fato de ter mencionado a condição social desfavorável do primeiro aluno pode sugerir que o segundo pertence a uma classe “alta”. Se esses exemplos forem verdadeiros, é de se supor que se enquadrariam na crítica do preconceito linguístico e social denunciado por Bagno.
A possibilidade de toda essa reformulação nos conceitos e no ensino acontecerem rapidamente está extremamente comprometida, pois no mínimo são necessários uma conscientização e um consenso sobre mudança de pensamento entre os responsáveis por estabelecer esses conceitos – e pré-conceitos – gramaticais já fixados no ensino da norma culta da língua, e uma familiarização dos professores com as novas ideias que podem surgir.
Os ritos da redação
Paralelamente à revisão do tratamento da gramática, há a necessidade de uma revisão nos conceitos do ensino do próprio escrever, ou seja, da redação. Se, de acordo com Bagno, a gramática deve ser contextualizada para ser ensinada, entender como necessitamos nos reeducar (MARQUES, 1997, p. 13) é uma alternativa para o indivíduo já vivenciado na aprendizagem da escrita, não apenas o aluno, mas também o professor. Seria repensar o “que” e “como” foi ensinado, o que se considera necessário mudar, quais as motivações, limitações, o que se espera da redação e o que despertaria no aluno o interesse por se dedicar à busca da qualidade nos próprios textos. Seria uma “revisão do ensino da redação”, com uma troca de informações que poderiam auxiliar esse indivíduo a não continuar “bitolado”, como afirma Marques (1997, p. 13).
Um aspecto do ensino da redação a ser posto em observação é o costumeiro processo de introdução-desenvolvimento-conclusão. O ensino da sequência obrigatória dessa tríade também é passível de uma reformulação, uma vez que essa seqüência tende a obrigar o indivíduo a se deter em uma dessas etapas, na sua ordem de apresentação, enquanto produz o texto. A ideia fixada na aprendizagem é a de que deve ser feita uma redação, iniciada por um tópico frasal, em torno do qual se desenvolva e se conclua o pensamento. Mas se não for explicado ao aluno que a introdução deve ser a última etapa a ser concluída, ele pode se deter infinitamente sobre um início de texto à procura de palavras que nunca definirão seu tópico frasal. Na opinião de Mário Osório Marques, há um “ritual” costumeiro do escrever que deve ser revisto em sua prática:
“[...] nos ensinaram a escrever e na lamentável forma de uma mecânica que supunha texto prévio, mensagem já elaborada. Escrevia-se antes o que se pensara. Agora entendo o contrário: escrever para pensar, uma outra forma de conversar.
Assim fomos ‘alfabetizados’, em obediência a certos rituais. Fomos induzidos a, desde cedo, escrever bonito e certo. Era preciso ter um começo, um desenvolvimento e um fim predeterminados. Isso estragava, porque bitolava, o começo e todo o resto. Tentaremos agora (quem? eu e você, leitor) conversando entender como necessitamos nos reeducar para fazer do escrever um ato inaugural; não apenas transcrição do que tínhamos em mente, do que já foi pensado ou dito, mas inauguração do próprio pensar” (MARQUES, 1997, p. 13).
A afirmação “escrever para pensar” intenciona a despreocupação com sequências dos pensamentos de outrem, e o começo de um pensar por si mesmo. É o indivíduo em aprendizagem escrevendo sob indução própria, vagando nas ideias que lhe surgem para serem colocadas no papel sem uma ordem exata, sem o “bonito” e o “certo”, mas que pode fazer sentido para ele. Escrevendo antes, se pensa depois. São os pensamentos materializados em um rascunho sem uma lógica aparente, para depois serem transformados em texto acabado.
“Escrever para pensar” é uma prática inversa dos exercícios de redação comumente aplicados nas escolas. É um escrever antes, sem uma preocupação prévia com exatidão gramatical e com a ordem do que se está escrevendo. Mas, geralmente não se explica ao aluno que ele pode escrever sem preocupação com ordens e depois encadear as idéias numa seqüência considerada lógica. Dado o tema para a redação, o aluno procura desenvolver o assunto, mas o processo pode estancar se ele aprendeu que, antes do desenvolvimento, é necessário que se escreva uma introdução. Pode-se perder muito tempo nessa fase introdutória, principalmente porque ainda nem se escreveu nada, para se saber a delimitação e o caminho a seguir. Até se chegar ao desenvolvimento, tudo o que não foi registrado por causa da ocupação com a introdução já tomou outro rumo ou se dissipou.
Um recurso também esquecido ou pouco usado na aula é a edição de texto. Antes do computador isso talvez não fosse prático, pois se gastariam folhas e folhas, borrachas e borrachas. Mas, hoje, a edição digital permite um movimento de parágrafos, troca de palavras, cortes de termos desnecessários, enxugamento de períodos etc., até que se chegue ao produto final. Mesmo que não resolva a situação, pois até para se editar é preciso conhecimento no trato textual, a edição é muito útil como recurso auxiliar. Depois da escrita inicial, com uma observação sobre a própria, verifica-se o que se deve corrigir, mudar de lugar e reescrever.
O fato de uma redação iniciar com a conclusão ou com o desenvolvimento pode muito bem ser a experiência que fará o aluno construir sua redação na sequência exigida pelo professor. Autores de novelas e filmes, geralmente, iniciam suas histórias a partir do fim, para esquematizarem o início e desenvolvimento da trama. Muitas excelentes redações começam no final. Se é que o final existe.
Sobre tipos de textos
Uma das partes mais importantes na revisão do ensino da redação são as explicações dos diversos tipos de texto ensinados ao aluno. Geralmente os livros sobre redação distinguem três: o narrativo, o descritivo e o dissertativo. Com um pouco de otimismo, mesmo que o aluno conheça as diferenças entre esses conceitos textuais, é possível que nunca tenha ouvido falar em dissertação argumentativa, muito menos que pode haver subdivisões dos conceitos dos três tipos de textos. Para Lúcia Santaella, a divisão entre narração, dissertação e descrição representa uma limitação dos tipos existentes e diferenciadores de textos:
“Será que apenas essa divisão em três blocos (descrição, narração, dissertação) é capaz de dar margem à classificação das inúmeras possibilidades de atualização da linguagem verbal? Dos diferenciados matizes que a expressão verbal pode assumir? Não seria possível, então, distinguir uma descrição poética de uma científica? A dissertação einsteiniana de um editorial de jornal? Ou uma narrativa de Guimarães Rosa do livro de aventuras que se lê no ônibus ou à noite para vir o sono? Foi ao nos depararmos com a precariedade dessa divisão [...] que nos surgiu a hipótese de que o interior de cada um desses três blocos permitia (cada um deles) uma subdivisão (subclassificação) também triádica [...] Desse modo, a descrição poderia se subdividir em descrição de primeiridade, de secundidade e de terceiridade, assim como a narração e a dissertação” (SANTAELLA, 1980 p. 194).
Para exemplificar o que seriam essas subdivisões, toma-se aqui a visão triádica (o hipotético, o relacional e o argumentativo) de Santaella sobre o texto dissertativo, por ser este o tipo de redação mais exigido no vestibular:
“Desse modo, relacionamos o discurso dissertativo hipotético (isto é, em nível de primeiridade) [...] Não é,pois, um texto de caráter conclusivo, mas de levantamento de problemas e conjecturas [...].
Já à dissertação em nível de secundidade chamamos discurso dissertativo relacional [...] estamos nos referindo ao discurso que correlaciona suposições teóricas com fatos, e através desses fatos pretende testar a comprovação da teoria [...].
O terceiro tipo de processo dissertativo, que nomeamos discurso dissertativo argumentativo, encontra-se intimamente ligado aos mecanismos do raciocínio dedutivo. [...] O objetivo de tal raciocínio é determinar a aceitação da conclusão” (SANTAELLA, 1980, p. 200-3).
Como se pode deduzir, a falta do domínio das regras ortográficas e até de conhecimento sobre as estruturas e conceitos textuais como o de Santaella se refletem por toda uma situação, e não realmente em um problema dos alunos.
Assim, tenta-se esboçar aqui uma sequência de ações em um esquema exemplificando como as mudanças sobre o ensino da gramática e da redação ocorreriam:
1) Conscientização e consenso entre os gramáticos sobre a necessidade da revisão gramatical e da redação;
2) Reformulações nos conceitos da gramática e da redação;
3) Considerar a motivação no ensino da redação;
4) Prática de ensino de acordo com essas reformulações e através da motivação;
5) Avaliação e discussão sobre os resultados dessa prática no discente;
6) Se os resultados ainda se apresentarem aquém do esperado, sugere-se um retorno aos itens 2 a 5, com pressão não somente sobre a escola, mas em todo o conjunto envolvido, para que os alunos possam ser dotados das “competências para produzir um texto coerente";
7) Nova avaliação sobre o rendimento discente.
Não pretendo definir esse esquema como determinante de uma completa transformação de conceitos (quem sou eu para isso?), nem como o caminho a ser seguido para obtenção de boas redações. Mas, uma experiência com a sequência acima seria um começo interessante, pois, em termos práticos, para que haja uma reformulação no ensino da gramática e consequentemente uma nova configuração no ensino-aprendizagem da escrita, é necessária uma troca de conhecimentos entre todos os sujeitos ativos da área do ensino da língua, com o abandono dos preconceitos existentes entre linguistas e gramáticos, o reconhecimento das competências do outro, valorizando-se esse “outro” como integrante do inteligente coletivo, reconhecendo-se os saberes de todos os seres humanos.
Referências
BAGNO, Marcos. A língua de Eulália – novela sociolingüística. 14. ed. São Paulo: Contexto, 2005.
______. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2004.
______. A norma oculta: língua e poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola Editorial, 2003.
______. Língua materna. São Paulo: Parábola Editorial, 2002.
______. Preconceito contra a lingüística e os lingüistas. Mesa-redonda: Língua e discriminação. 13º Congresso de Leitura do Brasil. Campinas, 2001. Disponível em http://www.marcosbagno.com.br/conteudo/arquivos/art_preconceito_linguistas.htm. Acesso em 26 abr. 2010.
CAGLIARI, Luis Carlos. Alfabetização e Lingüística. 8. ed. São Paulo: Scipione, 1995.
CONSOLARO, Hélio. Tem uma redação no meio do caminho. Disponível em http://www.portrasdasletras.com.br/pdtl2/sub.php?op=entrevistas/docs/reginaldopinto. Acesso em 26 abr. 2010.
INTERATIVIDADES. Lúcia Santaella. Disponível em http://www.itaucultural.org.br/interatividades2003/santaella.cfm. Acesso em 8 jun. 2010.
MARQUES, Mário Osório. Escrever é preciso: o princípio da pesquisa. Ijuí: UNIJUÍ, 1997.
SANTAELLA, Lúcia. Por uma classificação da linguagem escrita. In: Produção da linguagem e ideologia. São Paulo: Cortez, 1980.
SILVA, Werciley. Redação: o eterno bicho-papão do vestibular. Disponível em http://www.eadvirtual.com.br/moodle/mod/forum/discuss.php?d=21. Acesso em 26 abr. 2010.
UNIJUÍ UNIVERSIDADE REGIONAL. Sala Mário Osório. Mário Osório Marques. Disponível em: http://www.unijui.edu.br/content/view/702/1431/lang,iso-8859-1/. Acesso em 4 jun/2010.
WIKIPEDIA, a enciclopédia livre. Marcos Bagno. Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/Marcos_Bagno. Acesso em 4 jun/2010.