EDUCAÇÃO SEM DEMOCRACIA

Ainda hoje continua válida a afirmação dos antigos de que o ser humano é um ser curioso, e que a curiosidade é a fonte do conhecimento. Mas, para desenvolver esta curiosidade, é necessária a observação, a pesquisa, o estímulo para ultrapassar os conhecimentos legados pelo passado. Quem insere as gerações neste processo de conhecimento é o sistema educacional. E ninguém mais duvida que qualquer país apenas se consegue valorizar entre as nações civilizadas do mundo de hoje na medida em que aprimora o seu sistema educacional, e oferece aos seus cidadãos condições de acesso cada vez melhor ao conhecimento, mediado por suas escolas. Desta forma o Brasil não pode estar satisfeito por estar classificado em 85º. lugar no ranking das nações com as melhores condições educacionais para seu povo. Poucos, de fato, se importam com esta nossa situação educacional vexatória, mas muitos brasileiros estão tristes porque ocupamos, atualmente, o 8º. lugar no ranking dos melhores no futebol mundial. Além disto, não nos escandalizamos com o fato de um parlamentar federal custar aos cofres da união cerca 400 vezes o que ganha um professor, que tenta educar os cidadãos neste vasto Brasil, após ter ralado durante anos estudando até em faculdades.

Para ludibriar o povo brasileiro, e jogar areia nos olhos da consciência nacional, começou-se nos últimos anos uma política educacional antidemocrática no país: o sistema de cotas nas universidades. São cotas para afrodescendentes, para índios, para quem frequentou o grau médio em escolas públicas. Em qualquer país democrático o princípio fundamental é a igualdade de todos os cidadãos perante a lei. Nenhum juiz democrático pode privilegiar este ou aquele. Assim, conhecimento é conhecimento. E se há provas de conhecimento para o acesso à Universidade, que é uma casa de méritos no âmbito do conhecimento, se torna um absurdo admitir que alguém deve ser privilegiado porque é negro, índio ou porque estudou em escola gratuita do Estado. É filosoficamente incompreensível que pessoas cultas, conselhos universitários, homens que propagam aos quatro ventos que são democratas se acomodem às falácias de uma política incoerente. Se há escolas públicas piores do que escolas particulares, isto não é problema do sistema universitário, isto é problema do Ministério da Educação, das injustiças embutidas em nosso sistema político. Que o Governo melhore suas escolas, que o Governo pague melhor aos seus professores, que o Governo valorize os docentes, e não permita que sejam humilhados pela indisciplina dos estudantes... Enfim, o sistema educacional brasileiro público/privado é um sistema único. As escolas de particulares são concessões públicas. Estão aí para subsidiar o Governo, cuja obrigação constitucional é proporcionar educação a todos os cidadãos do país. Se o próprio Governo não consegue cumprir esta sua função, e delega isto a particulares, como pode, em certo momento, discriminar cidadãos porque adquiriram seus conhecimentos básicos nesta ou naquela escola? Por isto, é terrivelmente frustrante e desconcertante, especialmente para os jovens que pretendem entrar nas Universidades, quando descobrem que na Instituição, que deveria ser modelo de democracia e cuidar de aprimorar o espírito democrático dos estudantes, se apela para maquinações antidemocráticas na seleção de quem é aceito ou não em seus cursos.

Em decorrência deste rompimento dos princípios mais fundamentais de toda democracia em nossa sistema educacional, se multiplicam pelo país problemas que angustiam todo o ano nossa juventude. Isto gera descrédito cada vez maior da juventude em relação à seriedade, confiabilidade e honestidade das instituições públicas. O que é péssimo, e trai o objetivo do próprio processo civilizatório democrático, do qual fazem parte as nossas universidades. Pois, das universidades deveriam sair cidadãos melhores que zelassem pelo aperfeiçoamento ético e humanitário da sociedade, e não exploradores dos mais fracos. Este objetivo, com certeza, não se alcançará quando o jovem estudante entra em universidade que admite discriminações, privilegiando pessoas porque têm esta ou aquela cor, porque são desta ou daquela etnia, porque estudaram nesta ou naquela escola. Por isto, que os governos cuidem da qualidade de todas as escolas (públicas e privadas), e ofereçam condições sociais e econômicas às crianças e aos jovens para que possam adquirir os conhecimentos necessários para entrarem nas Universidades, ou escolas técnicas, democraticamente, em pé de igualdade com qualquer um de seus concidadãos. Frente a este quadro, aconselharia aos dirigentes da UFPE que acabassem com seu sistema de cotas, e fizessem uma crítica consistente às causas que geram a opinião, e o fato, da falta de qualidade das escolas médias do Governo, ditas públicas. Se não houvesse o sistema de cotas, e a conivência com a falta de qualidade de muitas escolas públicas, a COVEST/UFPE não teria gerado o constrangimento e sofrimento a tantos jovens e famílias na hora da matrícula de seus estudantes novatos neste início de 2011.

Inácio Strieder é professor de filosofia- Recife-PE.