Nietzsche: o locus da Arte e o desfoque simbólico pós-moderno

Texto de Rubens Tiano

No texto, A visão Dionisíaca do Mundo, Nietzsche aborda a origem do teatro trágico cômico a interação de duas forças divinas: Apolo e Dionísio.

Neste palco, em sua primeira relevância , a arte apolínea subestima o instinto a interação democrática e participativa das pessoas no estado da arte.

“Foi o povo apolíneo que colocou o instinto (Instinkt) superpoderoso em grilhões: ele subjugou o mais perigoso elemento da natureza, suas selvagens bestas ( Nietzsche, 2004,13)".

Este estado participativo era substituto da contemplação e da Vontade grega , almejada pela magnificação da imagem em sua natureza olímpica. Por meio da contemplação o homem cobria seu sofrimento do destino para que assim pudesse viver, “uma cruz escondida sob rosas, segundo o símbolo de Goethe” e seu alcance versava um “fim sublime na exigência da medida” .

A contemplação e a questão das exigências, com o advento dionisíaco e sua inculturação no helenismo, defrontam se ao novo estado empírico cujo sensível perpassa á democratização dos valores.

“Tudo o que até agora valia como limite, com determinação de medida, mostrou-se aqui como uma aparência artificial: a ‘desmedida’ desvelava-se com verdade.”(Nietzsche,2004,23)

O espelho do Olimpo transfigura se nas imagens dos sonhos, com um quebrar de barreiras, limites os quais a realidade é velada. Então, o principium individuationis , masculino e guerreiro, é deixado a segundo plano por meio da manifestação feminina, cujas castas são desaparecem e o escravo apresenta-se como homem liberto. O homem vê-se em coro, participativo como membro de uma comunidade fraterna e o que outrora era vivificado pelas forças imaginativas e distante do sensível, agora é contemplado em si mesmo, como uma operante ás sensações. Nas palavras do autor:

“O homem não é mais artista, tornou-se obra de arte, caminha tão extasiado e elevado como vira em sonho os deuses caminharem”. (Nietzsche, 2004,9)

A arte em seu processo dionisíaco não se encontra na alternância entre lucidez e embriaguez , mas na soma de ambas as forças.

E é este o ponto de mal estar em que sua volúpia propicia: dor da realidade e seu enfrentamento segundo este estado de fuga do devir, ordenação, culpa e destino. No descontrole desta duas naturezas, entre o real cotidiano e o poético vertiginoso, o homem coloca-se em angústia, na relutância de assumir seus papel.

Esta luta entre forças, surge o tragicômico, cenário harmônico entre Apolo e Dionísio, cuja sensível é um jogo com a embriaguez, ou seja, o espectador vivência um outro estado sem ao menos perder a noção de ficção, de não verdade, e em seu processo pessoal ele sabe e tem controle sobre este estado.

Ao contato com o tragicômico o espectador é levado a comoção do ato e este não o “aspira á bela aparência, mas á aparência, não a verdade, mas á verossimilhança o sublime e o ridículo o espectador transcende a verdade e a aparência (símbolo, sinal de verdade) ”. Nietzsche revela a desmedida estética como busca de uma verdade inerente ao belo. Deste forma descaracteriza-se aos pensamentos de Platão quanto ao trato da arte e sua mimesis.

A partir do momento que a arte muda seu foco, ser seja ela no trato do belo ou verdade , o filósofo abre um outro caminho para a filosofia estética, por outro lado e sobre a mesma natureza, retira da arte esta missão. Com a introdução da arte em seu processos das aparências e da verossimilhança o belo e a verdade não ocupam mais a questão fundamental da epistemologia artística. Ele retira sobre ela este locus distante e contemplativo e passa a infundi-la em um meio termo, entre contemplação, no sentido do ver, mas também a debruça sobre os ombros da emoção. A Arte agora é algo que afeta e esta presente dentro de nossas próprias reações. Existe uma inteireza entre o externo e interno, neste transito sublime e cômico da arte a medida de controlo. Nietzsche revela a arte como um estado transitório e complementar entre o contemplativo de Platão, entre a harmonia de Aristóteles, mas também soma a este fato a democracia do sensível por Dionísio e a vigília apolínica a qual confere ao espectador uma interação entre arte e seu sensível.

Este elo, na compreensão do pós-moderno é marcado pela própria definição contextual da palavra e sua origem.

Anderson , em seu livro “As Origens da Pós-modernidade” narra o surgimento da palavra pós-modernidade, este termo teria surgido na voz de Frederico Onís, no ano de 1930, como reflexo articulado dentro do movimento modernista. Sua intenção não era inaugurar um novo momento dentro da história .

Ao considerar os anos 60 como o início da pós-modernidade, Frederick Jameson, entendida por ele como lógica cultural do capitalismo tardio.(Chevitarese, 2001) .

O termo volta em cena anos 70, no livro Lyotard “A Condição Pós-Moderna” cujo resultado

fixa a expressão e lança aos quatro ventos seus conceitos. Neste momento as discussão voltam se á crise da cultura e sua busca de um posicionamento em detrimento à gradual dissolução dos conceitos modernos. Independentemente da data e do momento a qual o “pós-modernidade” desponta, é importante abordar a complexidade da palavra em sua expressão.

Nos desígnios do “pós” encontramos duas natureza relevantes os quais devem ser levados em consideração.

Primeiro, marca o sentido de algo que vem após , demarca ,assim, sua intrínseca ligação com aquilo a qual se encontra em uma natureza anterior. Por outro lado e justaposta a afirmação, esta um estado de afastamento, repulsa. Krishan Kumar , soma um outro apontamento e adverte que o sentido da expressão poder demarcar um fenômeno de morte, post-mortem, cuja relação ao percurso da história poderia proferir a morte do modernismo.

Segundo Gianni Vattino , a modernidade pode ser identificada em seu termino por dois motivos: primeiro, quando o trato da história não poder ser mais abordada como fenômeno unitário; segundo, quando morre o mito do avanço e progresso

No então , este sentido passa a ter uma outra conotação ao pensar nos diferentes graus do ensino, como por exemplo o lato senso, como elemento de pós-graduação. A “pós” aqui empregada não busca a anulação da graduação, mas representa um estado de aprimoramento .

Para Marshall Berman não existe o que hoje chamamos de pós-modernidade. Este estado atual das configuração são mais do que um moderno não acabado. Um estágio aglomerado de difusas compilações as quais perpetuam o moderno em sua natureza de “perpétua desintegração e renovação, agitação e angústia, ambigüidade e contradição” . Berman aponta a uma estrutura atual a qual não encontra-se em um outro nicho existencial , mas sim, afirma que esta ocorrência na mais é do que uma qualificação deste mesmo estado em sua variante, em seu estado de “colorimetria”. É possível fazer uma correlação, uma associação nas espécies do saberes os quais nos remeteriam a uma idéia no trato da água cuja a ebulição é a própria elemento em seu estado gasoso. Esta é a relação existente entre o moderno e o pós-moderno para Berman. Um torna se a natureza do outro em seus desdobramento, em estados diferentes de expressão, uma retroalimentação da sobrevivência modernista.

Lyotard concorda com Berman ao definir que a pós modernidade é uma parte do moderno e ambas vivem um anelo de existência .

Ainda que não haja acertos entre tempo e definições, rupturas e continuidade, o que não pode ser negado é a existência de algo a qual mostra suas marcas e obras no contexto atual, a qual costumamente chamamos de contemporâneo.

Bibliografias:

ANDERSON, Perry. As origens do pós-modernidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar.1999

BERMAN, M. Tudo o que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo: Companhia das Letras, 1986. p.328.

CHEVITARESE, L. (2001): “As ‘Razões’ da Pós-modernidade”. In: Análogos. Anais da I SAF-PUC. RJ: Booklink. (ISBN 85-88319-07-1 HARVEY, David: Condição pós-moderna. SP. Edições Loyola. 1992. Pág. 19

KUMAR, Krishan. Da sociedade pós-industrial à pós-moderna. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. pág.79.

LYOTARD, Jean-François. A condição pós-moderna. 5. Ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1998.

NIETZSCHE, Friedrich. A visão Dionisíaca do mundo. São Paulo: Martins Fontes, 2004, pág16.

NIETZSCHE, F. idem. pág. 22.

____________________ pág. 26.

VATTIMO, Gianni . O fim da modernidade. São Paulo: Martins Fontes, 2005

Rubens Tiano
Enviado por Rubens Tiano em 19/04/2008
Reeditado em 11/11/2010
Código do texto: T953410