O RIO DAS CONTINGÊNCIAS

Amiúde, no Facebook e noutras plataformas de comunicação interpessoal, mesmo que públicas, ou em privado, no WhatsApp e no Messenger, encontro observações acuradas, certeiras, sintéticas, de autoria dos assíduos leitores e percebo, por elas, ao confrontar com as minhas, profunda similaridade de pensamentos e ações. Naturalmente que estas interlocuções muito me estimulam a que exsurjam relatos de soturnos monólogos do espanto de conviver e a continuar a única e possível trajetória do andejar às margens do rio finito do viver, à mercê da dúvida e crente na esperança de pouco ter visto e que há muito mais em cada recanto a me instigar à palavra escrita. De olhos expectantes, à cata de novidades e um pouco preguiçosos, com o corpo ainda sobrevivente ao novel pandêmico caos deste século do "novo normal", que à larga apregoam os sanitaristas mundiais da OMS, replicado pelas informativas mídias, que mais me parecem conformativas de um "status quo", talvez para justificar o descaso dos governos com a ciência e o necessário bem-estar do terráqueo condenado à virulência de palavras e atos por parte dos líderes de povos e nações. É esse viver advindo (aparentemente novíssimo) a absurda causa de tomar a mim como um conhecido seixo rolado no leito do caudaloso rio de viver. Destarte, ainda bem que o verbo aceso na língua nunca morre nem perde a sua eficácia, mesmo que, por vezes, pareça sem eloquência, porque taciturno e expectante pelas novas pedrinhas e alguns outros seixos que continuam a empurrar umas e outros à foz do mar das contingências. Ainda mais nestes tempos em que a ciência tem os olhos do cientificismo voltados para o sol – estrela de primeira grandeza para a manutenção do calor humano entre os povos. Fala-se muito no confronto aeroespacial entre a China e os EEUU, no entanto, quiçá inocentemente, intuo – como convém e é da natureza do ofício de poetar – que a solução para os males que o Covid-19 contém e impõe à larga a toda a aldeia global, não se encontra no espaço sideral, mas aqui mesmo, no quintal de nossa casa. Tudo talvez à espera de vacinas contra os males de nos sabermos seres em experimentação.

MONCKS, Joaquim. POESIA A CÉU ABERTO. Obra inédita, 2020.

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