Encher a barriga (publicado originalmente em 5/3/2013)
É impressionante. Todo ano os comentários são os mesmos após a cerimônia do Oscar. ‘Foi o pior apresentador da história’, ‘Os números musicais foram medíocres’, ‘Tal ator / atriz nem sequer a indicação merecia’, ‘Eles quiseram compensar os prêmios’ etc e etc. A festa do Oscar, ano a ano, tem se tornado, para a maioria, creio, enfadonho, maçante, cansativo, sem graça e, o que é pior, previsível (com os eventos pré-Oscar). Mas o que fazer? Este também é um tema recorrente. Logo depois de as luzes do teatro Dolby se apagarem, começam os bate-bocas de como se pode melhorar a situação da maior premiação do cinema. Ninguém chega a uma conclusão pelo menos aproveitável. Sabemos dos quase 100 anos de Oscar (em 2014 será a 86.ª edição), durante a entrega dos troféus tem de ocorrer números musicais para entreter a plateia e, para este mesmo fim, são as tiradas – cômicas ou não, a escolha é de vocês – e piadas do mestre de cerimônia da vez. Em 2013 Seth MacFarlane, roteirista e o diretor de ‘Ted’ (2012) e do desenho ‘Uma Família da Pesada’, cumpriu seu papel. Bem? Há pessoas a favor, outras contra. Normal. Controvérsias à parte, ele zombou de atores (disse que Jean Dujardin, de ‘O Artista’, não tem talento para filmes falados, por exemplo), diretores e de quem mais surgisse na frente. Dever cumprido. Porém, só isto basta? Onde está a elegância dos tempos idos? Perdeu-se...
Hollywood hoje está sem mitos e lendas vivas. Tudo, não só no cinema, mas no mundo, é de um descarte inabalável. Raríssimos são os artistas que têm alguma opinião sobre qualquer coisa, seja a mais boba e imbecil possível. Os que têm este culhão, caso do documentarista Michael Moore, de ‘Tiros em Columbine’ (2002), são ‘banidos’ do show. Esqueceram-se do escarcéu promovido por ele? Quando o filme acerca da matança de jovens venceu o Oscar, Moore subiu no palanque – opa, digo, no palco, e disse: ‘Isto é uma guerra fictícia, senhor Bush! O senhor é um presidente fictício!’ As vaias ecoaram solenemente. Ou Adrien Brody. Conquistou sua estatueta por ‘O Pianista’ (2002) e lascou o beijo da noite em Halle Berry. Atitudes corajosas, ou canastronas, como o caso da falsa índia que foi recusar o Oscar de Marlon Brando por ‘O Poderoso Chefão’ (1972), também valem. Mas a mitologia em volta de personalidades se acabou. O último que talvez comprovará esta tese, e depois sabe-se lá quem tomará o seu lugar, é Jack Nicholson. Todavia, notem: o próprio Brando já era ‘o’ Brando com 30 anos e seu ‘Sindicato de Ladrões’ (1954)? Audrey Hepburn já era a figura exponencial aos 26 anos ao ganhar o Oscar por ‘A Princesa e o Plebeu’ (54)? Sim para ambos. Tinham acima de tudo carisma, predicado ausente destes atuais. Grace Kelly, igualmente. Era princesa no sentido literal da palavra.
Querem a renovação do Oscar. De que tipo? Ninguém responde. Não é possível que até agora os espertos não enxergaram que a festa do Oscar é feita aos artistas hollywoodianos e ponto final. A cerimônia funciona como se fosse a confraria – não de tolos, mas de bobos. Os sócios (atores, atrizes, cineastas enfim) sentam-se para apreciar o balanço do ano anterior e seus premiados. Os não-sócios (a categoria de filme em língua estrangeira existe para quê?, além de demais ‘intrusos’) estão ali com a finalidade de aplaudirem os EUA e sua gente. É isto. E está mais pobre intelectual e artisticamente década a década? Sem dúvida alguma. Dá a impressão de que eles não ligam. Tudo sempre está bem. O cinema é a máquina que necessita de ídolos, senão morre de fome. Mais do que televisão e teatro. Para encher a barriga, a Academia precisa se mexer. Mas eles não vão. E o Oscar seguirá sua estrada até não sei quando. O mais engraçado é que os produtores anunciam a cada festa que ela terá aquilo e isto, mil brilhos, inovações imperdíveis etc. E quando a cerimônia inicia, o que vemos é tal e qual o ano anterior. Goste-se ou não. E tem mais: se reclamam tanto, porque não mudam de canal? Vamos garimpar lendas. A solução é esta. Mas pessoas que valham esta pena. E quais seriam essas pessoas?