Reino de pinguins (publicado originalmente em 30/10/2012)
Demorou nada para Tim Burton perceber fama e glória de ‘Batman’ (1989). Congratulações, elogios, indicações a prêmios significativos, e enorme bajulação em torno de Jack Nicholson, fizeram a história, de modo óbvio, prosseguir. Dois anos após as filmagens modernas do homem-morcego, o diretor de ‘Os Monstros se Divertem’ (1988) tinha outra joia nos dedos: ‘Batman: O Retorno’ (1992). A dúvida agora era quem viveria o vilão Pinguim. Superar Coringa de Nicholson era missão louvável, porém impura. Foi o próprio ator quem sugeriu um nome: Danny DeVito, seu vizinho e, o mais legal de tudo: de estatura baixa, ou seja, pronto para encarnar o arqui-inimigo do herói noturno. Bastaria a maquiagem adequada e num passe de mágica as coisas ficariam nos seus perfeitos lugares. Para se fechar o esquema com guarda-chuva de ouro, molho especial: Nicholson balbuciou a Danny DeVito o quanto lucrou na fita de 1989–perto de 60 milhões de dólares (não confirmados), com bilheteria e os produtos licenciados. O diretor de ‘Jogue a Mamãe do Trem’ (1987) topou no ato. Desta forma, se fez a continuação das aventuras e ironias de Batman, o bom moço nas horas vagas e mal nas necessárias.
Também a mocinha não poderia faltar. Kim Basinger destroçou corações na trama da década de 1980 e o alfinete estava apertado para a película de 1992. Quem chamar? Claro, o símbolo sexual da época, tanto quanto Kim Basinger, mas sem a ousadia de Sharon Stone e seu ‘Instinto Selvagem’: a dona a Mulher Gato seria Michelle Pfeiffer. Mas a atriz foi a segunda opção de Burton, igualmente o ocorrido com K. Basinger dois anos antes, quando Sean Young perdeu a sua vaga por cair do cavalo literalmente. Desta vez, foi Annete Bening quem teve de sair do projeto. Ela ficou grávida e não pôde dar vida a Selina, a moça frágil que se transforma em Mulher-Gato e tem dupla personalidade, pois a gente não sabe se ela é amiga ou inimiga de Batman em seus miaus. Christopher Walken completou o elenco, com o mesmo intérprete do herói de 89, Michael Keaton, estranho, mas convincente. Com o cast aprumado, Burton seguiu a firma com seus pontos sombrios, góticos e cenários tortos. Aliás, é uma característica intensa nas obras deste cineasta, e boa. Fez ‘Batman: O Retorno’ tornar-se muito galardoado e falado. Para se ter ideia dos segredos do filme, por contrato D. DeVito ficou proibido de sequer comentar com quem quer que fosse sobre a sua maquiagem. O resultado foi o tão espantoso.
O roteiro mostrou Pinguim com o nome de Oswald Cobblepot. Sujeito esquisito, foi tentar ser candidato a prefeito de Gotham City. Para isto, o ritual semelhante à fita de outrora: fazer de Batman um desgraçado aniquilador de pessoas, sendo ele, Oswald, o salvador de todos os males. Nisto surge Selina, funcionária de Max (Walken). Ela sofre o acidente e vira a defensora dos felinos. Está ora ao lado de Pinguim, ora do de Batman. Sua sensualidade cotidiana é rebatida por sua esperteza aliada ao tímido miau emitido a cada frase praticamente. E os contratantes estavam corretos sobre DeVito ficar quieto acerca da maquiagem. Para 1992, uma perfeição na telona. Os três dedos em cada mão, o nariz pontiagudo, os cabelos ensebados e pele cor de defunto se sobressaíram, fora o figurino de cair os queixos do público. Lembro-me de ter assistido ao filme no finado Cine Rosário. Tinha dez anos e fiquei sem fala quando vi o Pinguim pela primeira vez. Superava (evidentemente) Burgess Meredith na série dos anos 1960, tão reverenciada por mim até hoje, assim como J. Nicholson derrotou Cesar Romero e Heath Ledger. O monstrengo de DeVito assustava criancinhas por tentar ser simpático e, no fim das contas, Batman o aniquilou. Como todo conto de fadas de heróis. Sem reino de pinguins.