Aquela mulher (publicado originalmente em 26/10/2005)

Várias foram as mulheres que incendiaram a cabeça dos homens no século passado. Foram construídos mitos, criadas lendas, bordados muitos sonhos. Mas Rita Hayworth, protagonista de “Gilda” (1946), é o que Mário Lago chamou de “mulher de verdade”, mas não no sentido de ser a “Amélia”. Nada disso, pelo contrário. Era o que os homens chamavam de femme fatale, aquela mulher que não mede esforços para conquistar seus desejos, e, para isso, utiliza seu rosto bem contornado, o corpo cheio de curvas etc. A trama de “Gilda” pode ser mediocremente comparada a “Casablanca” (1943), tema desta coluna duas semanas atrás. Trata-se do casal que é separado e depois se reencontra num clima tenso. Aqui, o triângulo é formado por Gilda, Johnny e Ballin.

Ballin é dono de cassino em Buenos Aires, Argentina, e contrata Johnny, um ex-jogador compulsivo e esperto, para ser seu gerente. Quando o chefe viaja a negócios e volta casado com Gilda, ex-namorada de Johnny, a situação é delicada. O rompimento do casal Gilda-Johnny não havia sido nada amigável. Ela era uma mulher aproveitadora e, pensa Johnny, repetirá o golpe em Ballin. E é isso mesmo que ocorre. Vinganças são planejadas. O cassino de Ballin corre sério perigo com Gilda a seu lado. Johnny tenta aniquilá-la, mas tem de protegê-la, pois Ballin pediu que ele fizesse isso. Há desconfiança no ar. E Gilda joga todo charme no seu ex-amante. Quando Ballin desaparece em misterioso acidente, Johnny tem a possibilidade de se vingar de Gilda.

Neste longa-metragem dirigido por Charles Vidor há lances categoricamente elegantes. Como tirar os olhos da tela quando Rita Hayworth entoa a canção provocativa “Put the blame on Mame” (“Ponha culpa em Mame”) no clube noturno de Ballin? Esse instante poderia facilmente ser paralisado no tempo, assim como Audrey Hepburn cantando “Moon River” enquanto tocava o doce violão em “Bonequinha de Luxo” (1961) e Marilyn Monroe fazendo qualquer um de seus shows em “Quanto Mais Quente Melhor” (1959). Outro momento marcante de “Gilda” vem em sua primeira aparição. Quando Ballin a apresenta a Johnny, é estonteante. Ela joga seus cabelos cacheados para trás e diz: “Olá!”, como se pretendesse posar para fotografias. Bem, ela queria.

Aos 27 anos, Rita tinha enfim um personagem criado especialmente para ela. Quando leu o roteiro, inicialmente a atriz resistiu. Queria aparecer mais em frente às câmeras. Conseguiu seu objetivo. Como na gíria do futebol, na fita é ela “e mais dez”. Depois desse trabalho, Rita, que começou a carreira ainda criança, teria mais três décadas de carreira. Sua biografia ainda mostra seu casamento com o cineasta Orson Welles, entre 1943 e 1948. Em 1977, encerrou sua bela trajetória profissional, aos 58 anos. Morreria dez anos depois, por complicações causadas pelo mal de Alzheimer. Mas todos, todos mesmo, lembravam dela como “Gilda”, aquela mulher que conduzia os homens colocando o dedo indicador nos queixos deles e maltratando-os, sem dó.

Rodrigo Romero
Enviado por Rodrigo Romero em 12/07/2009
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