Erros de Olavo de Carvalho na tentativa de "refutar" Georg Cantor (parte 2)

O pseudofilósofo Olavo de Carvalho tem uma "definição" curiosa de paridade/imparidade (conceito que classifica um número inteiro em "par" ou "ímpar"). De acordo com ele, no livro "O Jardim das Aflições", a "série" de números pares tem a configuração que tem porque pode ser ordenada “de dois em dois numa série ascendente ininterrupta que progride pelo acréscimo de 2, nunca de 1”.

O raciocínio: "retirar" um número par da "série ascendente de números", para "colocar" em qualquer conjunto, significaria "anular" sua paridade, pois o par só é par se fizer parte de uma série de números. Ou seja, ele atrela a paridade ao lugar do número na "série" numérica.

"Nenhum número poderia ser considerado par se pudesse livremente trocar de lugar com qualquer outro na série dos inteiros. 'Paridade' e 'lugar na série' são conceitos inseparáveis: se n é par, é porque tanto n + 1 como n - 1 são ímpares", ele escreve.

E determina: "é unicamente a soma implícita das unidades não mencionadas que faz com que a série de pares seja de pares".

Imagine-se uma série de números {0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8,...}. Segundo a tese olavista, {2, 4, 6, 8,...} seriam pares simplesmente porque ocupam lugares de "2 em 2".

A partir deste detalhe se pode compreender o que Olavo quer dizer com "signo".

O signo de um número, para o suposto pensador, seria o "número" sem "suas propriedades matemáticas" (como "lugar na série" e "poder ser par ou ímpar"). Exemplo: o "2" dentro do conjunto dos números pares seria um "signo" do número 2 ("signo" de um número par), pois ele foi isolado da série de números {0, 1, 2, 3, 4, ...} que determina a paridade. Este isolamento implica numa "abstração injustificada" destas propriedades.

É com base neste raciocínio - errado, como se verá mais à frente - que ele afirma que o matemático Georg Cantor está equivocado, por "confundir os números com seus meros signos".

A definição de "unidade", para Olavo, parece ser a mesma que está no dicionário: "o elemento a partir do qual se constroem todos os outros números naturais” (significados.com.br). Unidade é o número 1, o número 2 é a soma de duas unidades, o número 3 é a soma de três unidades, e assim sucessivamente.

Então, ele conclui: "Um conjunto de x unidades contém certamente o mesmo número de “elementos” que um conjunto de x pares, mas não o mesmo número de unidades".

Primeiro, cabe perguntar ao nosso eterno aspirante a filósofo: o número negativo "-4", por exemplo, não é um número par? Fica sugerido na “refutação” que Olavo parece não ter se tocado que o conjunto de números pares também é composto de números negativos –- parece pensar que a série de números pares começa pelo 0 ou 2.

Mas não, o conjunto de números inteiros pares não começa do 2 (ou do 0) para se falar simplesmente em "lugar na série" e acréscimo de 2 em 2 (infinitamente) como pilares de uma definição de número par. Há os números negativos.

Por isto, deve-se questionar o termo "ascendência ininterrupta". O conjunto de números pares é infinito e, sendo composto por negativos, não tem começo, nem fim. Por onde Olavo começaria a "contar" para depois "ascender" sem interrupção?

Outra questão: apenas "ascendendo" não teria como chegar aos números negativos. Teria que ter também uma "série descendente" {... 6, 4, 2, 0, - 2, -4, -6,...} ou, parafraseando o pseudofilósofo, em subtração implícita (- 2) das unidades?

Como se pode ver, é uma "definição" simplista e equivocada.

O conceito de paridade se baseia na forma 2k, onde k é um número inteiro. Esta prova se confirma quando dividimos um número inteiro por 2 (n = 2k +r). Se r = 0, o resultado é par; se r = 1, o resultado é ímpar (a letra r significa resto). Na forma de conjunto, a paridade se desenha como {2k; k E Z} para definir número par; e {2k + 1; k E Z} para definir número ímpar. Z é o símbolo que representa o conjunto de números inteiros.

Através desta conceituação pode se derrubar a tese amalucada de Olavo, a que diz que um número só é par ou ímpar se estiver dentro de uma sequência numérica.

Não há "abstração injustificada". Qualquer número inteiro (positivo ou negativo) pode fazer parte de qualquer conjunto sem ter que se preocupar em "perder" sua paridade ou imparidade. O que determina se o número é par ou ímpar é o resto de sua divisão por 2. Não a sua posição numa ordenação numérica ascendente. Seja no conjunto ou na ordenação de números, o número inteiro ainda pode ser divisível por 2, então não faz sentido falar em abstração de propriedades matemáticas.

Portanto, Cantor não fez confusão alguma. De qualquer forma, Olavo não faz nada mais que um jogo de palavras. Ele fala em "conjunto de signos" e que o matemático alemão está correto ao dizer que o conjunto de números inteiros (supostamente "signos") tem o mesmo tamanho do conjunto de números pares (e realmente tem, mas não porque ambos os conjuntos são infinitos como Olavo pensa, isso foi explicado no texto anterior). Basta trocar a palavra "signo" por "elemento".

Há evidente distinção entre elemento e número. Porque o conjunto se configura como uma reunião de elementos, que podem ser objetos abstratos (números ou não) ou que pertencem à realidade concreta. Mas não é correto afirmar que números perdem suas propriedades dentro de um conjunto.

Cantor investigou o tamanho dos conjuntos infinitos. Como já vimos, o alvo de Olavo é um trabalho específico em que o matemático alemão provou que há cardinalidade entre o conjunto de números inteiros e o subconjunto de números pares. O "matemático" da Virgínia entende que o particionamento do conjunto de números inteiros entre dois subconjuntos (pares e ímpares) seria o mesmo que fazer a divisão e a distinção de "duas séries de números" (uma com a ordenação de todos os inteiros, outra com uma sequência de pares).

Seria esta a "falácia" de Cantor. Mais detalhes no próximo texto.