Antes mundo era pequeno/Porque Terra era grande/ Hoje mundo é muito grande/ Porque Terra é pequena/ Do tamanho da antenaParabolicamará [...] (Gilberto Gil - Parabolicamará)
 
Ao refletirmos sobre o ciberespaço há que se analisar como o conceito de espaço tem preocupado os filósofos. Seria o espaço aquilo que contem algo, um recipiente, como via Platão ou Aristóteles, que o compreendia como algo que contém, como a inexistência do vazio. Descartes e o racionalismo se amparava na tese dos antigos, agora metrificado e delimitado pela geometria euclidiana. Esse espaço de entificação tem levado a dicotomia entre ente e ser. A dicotomia res extensas e res cogitae cava o abismo entre o ser humano e o espaço. Leibniz rompe com a ideia de espaço absoluto e pensa um espaço relativo como umaordem de coexistências. Newton vê o espaço como algo vazio; Kant concebe o espaço como uma categoria a priori, ou seja, antes de intuí-lo ele já existe. “O espaço não é um conceito discursivo ou, como se diz, um conceito universal de relação das coisas em geral, mas sim uma intuição pura.”  Para Kant é no espaço e no tempo que ocorrem os fenômenos. “O espaço não é senão a forma de todos os fenômenos dos sentidos externos, isto é, a condição subjetiva da sensibilidade unicamente sob a qual nos é possível uma intuição externa.” Ele faz uma distinção entre o que se apresenta e a sua representação. O que se apresenta a nós primeiro é o objeto tal como aparece, o fenômeno, que para ele não quer dizer aparência mas aparição. Assim, espaço e tempo são formas de toda a aparição possível. A intuição pura ( o espaço e o tempo) é a única coisa que se apresentaria a priori:
 
O tempo não é um conceito empírico abstraído de qualquer experiência. Com efeito, a simultaneidade ou a sucessão nem sequer se apresentaria à percepção se a representação do tempo não estivesse subjacente a priori.

Ainda segundo Kant “[...] Tomados conjuntamente, tempo e espaço são formas puras de toda intuição sensível, e desse modo tornam possíveis proposições sintéticas a priori [...]”. Eele  vê o espaço como algo absoluto na linha do mecanicismo Newtoniano. 

Com o advento da teoria da relatividade e a física quântica a noção de espaço mudou radicalmente, alias fala-se numa coisa só espaço-tempo. A mudança de paradigma diz que a experiência depende do espaço criado; necessário supor uma multiplicidade de arranjos espaciais, dimensões que levam a percepções distintas do “real” diferente do apriorismo espacial kantiano. Modernamente, Heidegger vê o espaço como o lugar do ser-no-mundo, o ser-aí em sua presença existencial que se lança em um mundo de possibilidades nessa rede relacional, esse ex-sistere,ir adiante à clareira aberta pelo ser-no-mundo. Ele define a presença como o modo de ser das coisas que é diferente do modo de ser do homem que é a existência:

 
O ente que temos a tarefa de analisar somos nós mesmo. O ser deste ente é sempre e cada vez meu. Em seu ser, isto é, sendo,este ente se relaciona com o seu ser. Como um ente deste ser, a presença se entrega à responsabilidadede assumir seu próprio ser. Ser é o que está nesse ente sempre em jogo. (HEIDEGGER,2012,85)

É sobre esse Ser lançado no mundo, desenraizado, imerso no emaranhado urbano das megalópoles do século XX, que Heidegger se refere, as cidades como o tropos por onde ocorrem as possibilidades e impossibilidades existenciais, onde se vive perto e distante de si mesmo e do outro, onde o espaço como realização passa ser o espaço dadesrealização, onde os seres experimentam uma sensação de distanciamento, irrealidade e anestesia sensorial. É neste contexto que Heidegger fala da distância e da presença:
 
Proximidade não é pouca distância. O que, na perspectiva da metragem, está perto de nós, no menor afastamento, como na imagem do filme ou no som do rádio, pode estar longe de nós, numa grande distancia. E o que, do ponto de vista da metragem, se achalonge, numa distância incomensurável, pode-nos estar bem próximo. Pequeno distanciamento ainda não é proximidade, como um grande afastamento não é distância. (HEIDEGGER, 2002, 143)

As cidades como palco privilegiado das relações humanas, vão dando lugarao espaço virtual,onde a noção de espaço se modifica radicalmente, na medida em que ele é um lugar de arquitetura fluida com uma topologia de dimensões e alcances diversos. É um espaço-tempo que se aproximado espaço relativo de Einstein. Espaço que pode ser orientado para as experiencias agregadoras de sentido,estruturado em torno de conteudos direcionados, como por exemplo para a educação, por onde pode se dá dinâmicas históricas, permitindo relações de solidariedade e a participação na esfera pública. É, também, o lugar que pode nos levar a irrealidade, ao distanciamento, ao desenraizamento, a irreferência,a privatização. Se o conceito ancestral de distância é o afastamento, que na contemporaneidade é gravitado positivamente pelas tecnologias; na antiguidade foi gravitado negativamente pela política.
Labareda
Enviado por Labareda em 07/06/2015
Reeditado em 08/06/2015
Código do texto: T5268809
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