Caminho - Viagem

4. Viajem

Para toda viajem há um destino. Conceber que esta poderia ser indefinida é tentador, contudo, deve-se admitir que, sobre certos aspectos, toda a viagem será sem fim.

Uma viagem normalmente é antecedida de preparativos e planejamentos. Estas etapas têm seus méritos, porém quando queremos muito rapidamente, a felicidade, precipita-nos a por o pé na estrada.

Desta que falo não prescindiu de planejamento, tampouco foi cercada de preparativos. Tinha um destino, tempo, os meios e o caminho eram conhecidos. Mais do que a decisão de fazer a viagem, o duro é a partida, se por a caminhar.

A partir deste momento, dependendo do que nos move, um deslize pode ser traumático, tanto no sentido literal como figurado. Torcer o pé na partida pode significar a não viagem, ou um retorno antecipado, infrutífero.

Quando iniciamos uma jornada, o lugar de onde saímos é conhecido, as pessoas da mesma forma e as coisas que nos cercam. Julgamo-las imprescindíveis.

Como uma viagem sem preparativos necessita-se ao longo da estrada acolher o que nos parece útil. Uma rápida passada na casa de quem nunca esteve disponível, para apanhar uma sacola, pois assim que andamos carregamos e acumulamos coisas e objetos. Nas aparências estes objetos podem ser entulhos ou mesmo quinquilharia, noutro momento serão referências de nossa memória, pixels em uma grande imagem.

Um livro, seu conteúdo também tem significância. Vai dentro da sacola, a tiracolo.

Iniciar uma jornada abdicando do conforto do veículo motorizado, para percorrer um caminho conhecido não é mais o menos meritório é uma decisão contextual e cultural. Um mesmo caminho nem sempre é o mesmo. Como um rio que caminha para o mar a cada instante é um e único.

Construindo a jornada aos passos pode ser uma alternativa, mas devemos observar que poderia ter sido percorrida de outras tantas formas.

Na escolha dos meios estão intrínsecas as necessidades, traduzidas pela pressa de se alcançar o destino traçado. Para quem anda passo a passo, a escolha d e um veículo mais rápido denota a angustia da espera.

Para quem normalmente anda de carro, a bicicleta passa a contribuir com uma diferente percepção do caminho. Por vezes mais do que alcançar um destino é preciso viajar, e ai os meios independem.

Às vezes penso que se Deus existisse deveria ser desafiado. Um desafio não para estabelecer um novo domínio, mas para comprovação de sua existência e poder.

Acredito que muitos homens julgados santos pela cultura católica, só o são porque desafiaram, enquanto homens, pelos seus atos e atitudes, a assumir o lugar de Deus. O que muitos de nos fizeram foi desafiar com a vida numa busca destrutiva.

Não é aconselhável. Não há vitórias e nem construções, só mau exemplo, declínio moral.

Questionaram sempre meu silencio mesmo quando o defendi como arma política entre os homens. Era menos efusivo. Propiciava ao interlocutor a reflexão. Não podemos esquecer que se se construiu um país com a arma do silencio e da renegação. Temos que perceber que as palavras ofendem, tanto quanto podem construir, mas o árbitro ou o livre arbítrio estará presente.

O jejum é uma prática que segundo alguns enobrecem a atitude do ser. Não pode ser assim tão restrita sua interpretação. Poderíamos falar do jejum de vida. Enquanto alguns deixam de alimentar o corpo sacrificando a vida, outros o alimentam de forma errada. São vícios bebidas, que levam a um jejum de vida.

O meu corpo é barulhento, meus ossos estalam, meus intestinos com suas manifestações desagradam os que estão por perto. Os odores que distribuímos também são perceptíveis. Mas minha alma está quieta, esperando um fim na viajem.