O ARAUTO DA POÉTICA

No texto artístico deve predominar a despersonalização, vale dizer, tentar escrevê-lo como terceiro – outra pessoa – mesmo que sempre presente: um alter ego que de tudo sabe, que a tudo assiste, porque hóspede dentro do criador literário. Para o escritor neófito – que não tem essa prática – é muito difícil assim proceder, porque em regra o seu texto é autobiográfico e o autor se sente “dono” dele, por possessão sobre o que é seu ou pretende que seja. O poema axiologicamente verdadeiro e esteticamente de valor é sempre confraterno, ou seja: uma proposta, uma sugestão aberta a todo o receptor. Por esta razão eu o denomino POETA-LEITOR. Porque este é um recriador, o arauto que vai levar a boa nova, os frutos verbais de um pensamento que possa conduzir à universalidade de entendimento do tema em pauta. É muito dificultoso fazer a peça poética em terceira pessoa. A regra, entre os iniciantes, é que seja concebido na primeira, ou seja, nos domínios do Ego. E, se isto ocorre, escafede-se a Poética. Ficam somente os versos em discurso possessivo. E a fala deste tipo só aproveita ao seu autor. Os versos com Poesia nunca são estanques nem exclusivos. São para os domínios da espécie humana. Ou do que um dia advir como proposta de lúcida e harmônica convivência.

– Do livro OFICINA DO VERSO, vol. 02; 2015/17.

http://www.recantodasletras.com.br/teorialiteraria/5880410