O FASCÍNIO DA POESIA

Algo me chama a atenção na Poética: é que o poeta-autor cria sem nenhuma ligação com a realidade. Porque a literatura não se destina a ser aplicada diretamente sobre o mundo dos fatos. Ela, especialmente em Poesia, é uma criação assentada em cima do sonho, da farsa, da fantasia. Quando o poeta cria, ele procria para vencer a hostilidade do dia a dia... Quer ser feliz, então ele recria a vida com uma proposta poética. E ai vem uma questão muito interessante... Curiosamente, para que ele possa convencer, se conectar com poeta leitor – o receptor do texto – ele tem que ter uma intensa carga de verdade, um estado de veracidade criado a partir daquelas farsas e fantasias. Isto é o curioso: a dose de verdade que o texto tem é que desassossega o poeta-leitor. Pode acontecer também, que o leitor, a partir daquela proposta despretensiosa do poeta-autor, transcenda a si próprio... Não que ele se convença daquilo que o poeta-autor disse, mas ele toma para si como verdade, e faz do texto uma verdade plena, esquecendo a sua raiz fantasiosa. É isto o que mais me impressiona na Poesia: o seu fantasioso fascínio de conseguir mudar o entorno (e a condenação individuada) de viver, simplesmente através da singeleza da Palavra...

– Do livro OFICINA DO VERSO, 2014/16.

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