Mona Lisa Overdrive (William Gibson) [Trilogia do Sprawl]

Antes de tudo, é bom esclarecer:

"O que é a Trilogia do Sprawl?"

R: Uma famosa série de literatura cyberpunk, escrita por William Gibson, um dos fundadores deste subgênero.

"Em que ordem devo ler?"

R: Segue abaixo a ordem de leitura e também links para as respectivas resenhas:

1º) Neuromancer - Resenha: http://www.recantodasletras.com.br/resenhasdelivros/6065003

2º) Count Zero (Trilogia do Sprawl) - Resenha: http://www.recantodasletras.com.br/resenhasdelivros/6065004

3º) Mona Lisa Overdrive (Trilogia do Sprawl) - Resenha: (neste post, mais abaixo)

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FINALIZANDO A TRILOGIA DO SPRAWL

O derradeiro livro da trilogia traz uma narrativa através de 4 personagens e, ao contrário de Count Zero, este recurso não traz grande dinamismo e sim uma certa dispersão. Um dos personagens principais é bem desinteressante no que tange a suas ações e personalidade mas, verdade seja dita, serve como fio condutor da trama.

A alternância de linhas narrativas resultam em capítulos curtos, ainda assim, o desenvolvimento do enredo se dá de forma lenta e não traz grandes empolgações nesse sentido nos 2/3 iniciais. O que não significa uma leitura maçante, o fiel da balança está nos detalhes secundários. E, nestes, encontramos o grande mérito do livro em relação a seus antecessores.

Se tratam de descrições tecnológicas, práticas culturais, flashbacks de personagens etc.

Uma de suas assistentes era uma garota num exoesqueleto de policarbono azul que lhe permitia carregar as malas Hermès com o guarda-roupas como se fossem blocos de espuma sem peso, o traje esquelético e sussurrante descia suavemente a escada, com passos acolchoados por seus rudes pés de dinossauro. Esqueleto azul, caixões de couro.

Desta forma, se você aprecia esse “pano de fundo”, gosta de comparar as tecnologias previstas pelo escritor nos anos 80 e confrontá-las com o que está à disposição hoje, ficará bem entretido até o momento em que a obra apresenta trechos mais empolgantes, com maior dose de ação. A exemplo da citação a seguir (CONTÉM SPOILER, mas não do final do livro).

"Estava saindo da cama quando Prior atravessou a porta, literalmente através da porta, já que ela ainda estava fechada quando ele a atingiu. Ele a atravessou de trás para a frente e foi parar sobre estilhaços e pedaços de papelão.

Ela o viu chocar-se contra a parede e depois o chão, e então já não estava se movendo mais e uma outra pessoa estava lá na porta, iluminada por trás, pela luz do outro quarto, e tudo que ela podia ver do rosto eram aqueles dois círculos de luz vermelha, reflexo do pôr do sol falso.

Colocou as pernas de volta na cama, encostou-se contra à parede, sua mão escorregando para…

— Não se mexa, sua vagabunda. — Havia alguma coisa realmente amedrontadora naquela voz, porque era alegre demais, como se atirar Prior através da porta fosse algo realmente divertido. — E isso quer dizer realmente não se mexer… — A mulher atravessou o quarto em três passos, muito próxima, tão próxima que Mona sentiu o frio da jaqueta de couro.

— Ok — disse Mona — , ok…

Então as mãos a agarraram, rápido, e ela estava jogada de costas, ombros pressionados fortemente contra a espuma e alguma coisa — a arma de choque — bem em frente ao seu rosto.

— Onde você conseguiu esta coisinha?

— Oh — disse Mona, como se fosse algo do qual ela havia se esquecido — , estava na jaqueta do meu namorado. Eu peguei a jaqueta emprestada…

O coração de Mona estava acelerado. Havia alguma coisa a respeito daqueles óculos…

— Esse merda aí sabia que você tinha esta coisinha?

— Quem?

— Prior — disse a mulher, e largou-a, virando-se. Estava chutando Prior, várias vezes, com força. — Não — disse ela, parando tão abruptamente quanto começou. — Acho que Prior não sabia. — Gerald estava na porta, como se nada houvesse acontecido, exceto por seu olhar triste para a parte da porta que havia sobrado no caixilho, correndo seu polegar sobre uma ponta de laminado lascado. — Café, Molly?

— Dois cafés, Gerald — disse a mulher, examinando a arma de choque. — O meu, forte".

A exemplo de Neuromancer, o autor deixa aqui alguns trechos um tanto confusos, mas nada que enseje o abandono da leitura. Pelo contrário, gera até mesmo o desejo de revisitar a trilogia no futuro, para um melhor aproveitamento.

Não darei spoiler do final, o que posso dizer é que gostei. Entretanto, na hipótese de realizar essa leitura há 10 anos atrás, acredito que não teria a mente aberta o suficiente para apreciá-lo.

No mais, Neuromancer trouxe novos conceitos interessantíssimos, a ponto de ser uma das fontes de inspiração do filme Matrix. A alternância entre mundo real e ciberespaço é um de seus pontos altos. Count Zero chama atenção pela escrita dinâmica, narrativa mais fluída e ação. Já Mona Lisa Overdrive, traz um destaque maior no entorno, carece um pouco de ritmo, sendo o livro mais fraco da trilogia, sem deixar de lado o bom humor:

"— Segurança?

— O quê? — As lentes brilharam.

— Você é da segurança da Net?

— Claro que não, estou sequestrando você.

— Você está?

— Pode apostar.

— Por quê?

— Não pelos motivos usuais."

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Ficha Técnica:

Título: Mona Lisa Overdrive

Autor: William Gibson

Tradução: Carlos Irineu (com Candice Soldatelli)

Edição: 1ª

Editora: Aleph

Ano: 2008

ISBN: 978–85–7657–051–6