Resenha impressionista para "Expressões Populares: origem e significado"

Hoje terminei de ler "Expressões Populares: Origem e Significado", organizado por Alexandre Rangel, da Editora Leitura, 2010.

Desde criança, gosto muito de Etimologia, de conhecer o sentido original dado a expressões que utilizamos no dia-a-dia.

Acredito que o conhecimento do processo de, digamos, "construção" das expressões nos oferece uma oportunidade de aprofundamento para entender a fantástica e maravilhosa sistemática de surgimento, desenvolvimento e evolução das ideias, conceitos e visões de mundo.

(Pasmem, posso dizer que "Marcelo, Marmelo, Martelo" foi um livro que mudou a minha vida, talvez até bem cedo! hehehe)

Dentre os diversos livros sobre o tema, este de Alexandre Rangel me pareceu interessante, sem dúvida alguma.

Gostei de saber da origem de "Tio Sam", "tratado a pão-de-ló", "tudo nos trinques", "macaco velho não mete a mão em cumbuca", "meter o bedelho", "novinho em folha", "olha o passarinho", "outros quinhentos", "pão-duro", "passar a noite em claro", "por um triz", "pulo do gato", "gatos pingados", "guardado a sete chaves", "lavar a égua", "leão de chácara", "levou um puxão de orelhas", "elefante branco", "erro crasso", "farinha pouca, meu pirão primeiro", "fazer fiasco", "a cavalo dado não se olham os dentes", "andar à toa", "batismo de fogo", "bicho de sete cabeças", "bode expiatório", "o canto do cisne", "cavalos de potência", "cheio de nove horas", "cuspido e escarrado" e tantas outras expressões!" :-)

Mas devo "meter o bedelho" e dar um "puxão de orelhas", dizendo que eu esperava uma melhor qualidade da obra, que tem errinhos "a dar com pau"! :-(

O texto organiza as dezenas de expressões em formato de catálogo ou glossário, contendo, para cada uma, Exemplo, Significado, Local e Origem. Cada um desses itens apresentou probleminhas recorrentes, que dificultaram um tantinho o aproveitamento da obra.

Origem não Explicada:

A "origem" de algumas expressões não está claramente associada ao seu significado. (p.ex. "a toque de caixa", "façam o que eu digo, mas não façam o que eu faço". e outras.) Em outras palavras, a "origem" não explica a literalidade da expressão (p.ex. "água mole em pedra dura tanto bate até que fura"). Ou seja, o livro de fato não a explica.

Exemplos Mal Escolhidos e Mal Escritos:

O "exemplo", em muitos casos (chega a ser irritante), não condiz perfeitamente com o significado dado para a expressão em "esperto como uma raposa", "fio de Ariadne", "fim da picada", "isto é marmelada" (e a explicação da origem poderia se resumir às três frases finais), "com a faca e o queijo na mão", "com o rabo entre as pernas", "memória de elefante", "meter o bedelho", "misturar alhos com bugalhos", "negócio da china", "onde o sapato aperta", "ovo de Colombo", "ponta do iceberg", "presente de grego", "meter a catana", "pagar o pato", "pagar tintim por tintim", "que bicho te mordeu" (repentinamente), "quebrar o galho" (dificuldade, e não corrupção), "quebrar o gelo", "se a montanha não vem a maomé, maomé vai até a montanha", "ser barbeiro", "será o benedito?", "surdo como uma porta", "tal pai, tal filho", "tirar o pai da forca".

"Exemplos" geralmente relativos à experiência de um homem de classe média, no contexto do trabalho em escritórios, nem um pouco representativo da população usuária das expressões, nem do público leitor.

"Exemplos" repletos de juízos de valor (p.ex. "Treinamentos são sempre muito demorados." em "na bucha"). Conselhos entremeados ao texto que deveria apresentar o exemplo de uso da expressão. Percebi também nos textos dos exemplos um tom geral de insatisfação com o ambiente de trabalho e inveja dos demais colegas, especialmente mulheres. Estes exemplos são, muitas vezes, desnecessariamente sexistas e/ou misóginos, p.ex. "a regra se bota na boca do saco".

Em vários casos, o "exemplo" utiliza outras expressões populares (que podem exigir do leitor a consulta a outros verbetes), expressões de gíria, jargões e termos usados em sentido conotativo (que podem exigir do leitor a adivinhação do sentido pretendido), em "meter a catana", "pagar o pato", "pagar tintim por tintim", além do uso de ironia no exemplo de "negócio da china". Isso prejudica totalmente a apreensão do completo significado da expressão original, e até mesmo dos exemplos.

De maneira geral, o exemplo que precede a explicação do significado das expressões (que deveria ilustrar claramente seu uso comum), é, na maioria dos casos, de tamanha inadequação, que seria prudente dispensá-lo do texto. Melhor ainda seria adequá-los.

Estilo:

Há uma explicação gigantesca da origem de "ficar a ver navios" que poderia ser resumida ao essencial.

Faltou a explicação da origem na Ilíada de "no fio da navalha". Foi apenas citada, mas deveria ser desenvolvida.

Faltou associar "ter uma telha de menos" a "ter um parafuso a menos".

Há expressões com origem na Grécia (p.ex. "pomo da discórdia") referindo nomes latinos de deuses (Juno, Minerva, Vênus), em vez dos nomes gregos (Hera, Atena, Afrodite).

Repetições:

Há repetições das expressões do catálogo, como nos pares: "cortar o nó górdio" e "é um nó górdio", "entrar com o pé direito" e "entrar com o pé esquerdo", "estar na embira" e "estar na pindaíba", "ovelha negra" e "é a ovelha negra da família", "farinha do mesmo saco" e "são todos farinha do mesmo saco", além de "pagar tintim por tintim" e "tintim por tintim".

Há um grande techo de "lavar roupa suja em público" (uns quatro parágrafos) repetido (e perdido) no meio de "lamber os dedos" (que ficou incompleto).

Falta de Referências:

Várias explicações de origem escritas em estilo flagrantemente diferente do restante dos textos, o que faz supor cópia (mas sem referência à fonte ou autoria original, ou seja, plágio). Na maioria das expressões, o texto não indica referências em que se possa buscar mais informação sobre a declarada origem da expressão. A obra pareceria mais verossímil se apresentasse as fontes da pesquisa.

Falta de Revisão:

Fiquei negativamente surpresa por encontrar muitos erros de digitação, formatação de parágrafos, ortografia, acentuação e gramática no texto. Vários casos de inversão tu/você/seu/seu e concordância verbal (p.ex. "não é flor que se cheire"). Muitos erros de pontuação, por falta e por excesso. Alguns casos comprometem o entendimento da explicação.

Esses inúmeros errinhos evidenciaram para mim a insuficiente revisão da obra.

Parece que foi "feita nas coxas", "mal e porcamente", "aos trancos e barrancos", "a toque de caixa", evidenciando que "a pressa é inimiga da perfeição".

Mas, como "não adianta chorar o leite derramado", então "tirei de letra": procurei curtir o conteúdo do livro e não fazer "tempestade em copo d'água", para não "jogar fora o bebê junto com a água do banho", pois sempre se aproveita alguma coisa, e "quem não tem cão caça com gato".