Um pedaço da Síria

Hoje, ao observar as notícias de jornais eletrônicos, a fim de coletar dados para a minha pesquisa acadêmica, deparei-me com uma situação que mereceu uma pequena pausa na minha investigação, enquanto linguista, para me colocar na posição de leitor, apenas. A matéria foi publicada no site do Portal G1, no dia 11 de março do ano de 2017, cuja manchete se intitulava “Ong reencontra 6 crianças vivendo sozinhas por dois meses em casa bombardeada de Aleppo.” O texto relata o episódio de resgate de seis crianças de uma casa marcada pela destruição da guerra na Síria.

Na matéria, percebeu-se que o resgate destas crianças foi realizado por uma ONG que fazia uma ronda pelo local. Os funcionários da organização humanitária relataram que dentre as seis crianças, havia uma de nove meses. Relataram também que o pai era um ativista da guerra, e a mãe foi presa. Logo, essas crianças passaram a viver sozinhas em uma situação extremamente precária no interior de uma casa parcialmente destruída.

O texto relata que as crianças viveram sozinhas durante oito semanas e que conseguiam comida com a venda de metais que elas encontravam nas ruas da cidade. Além da fome, as crianças tiveram de enfrentar o frio e os adultos que tentavam entrar na casa para roubar o pouco da comida que elas conseguiam. Uma situação assustadora, que deixa qualquer leitor perplexo.

A matéria informa que os sobreviventes foram levados para um orfanato de uma cidade não revelada, mas pelo menos lá, essas crianças podem comer, beber e dormir um pouco mais tranquilas. Toda essa situação me deixou extremamente pensativo, assim como fiquei quando li os comentários postados pelos leitores na parte inferior da matéria.

Havia gente que questionava a postura da mãe, chamando-a de ignorante por gerar tantos filhos em um país marcado pela guerra. Outros leitores pareciam desconfiar das informações do texto, pois levantaram questões acerca da possibilidade de as crianças não serem irmãs, uma vez que apresentavam pouca semelhança.

Contudo, precisamos abandonar a nossa visão superficial acerca dessa situação e realizar uma reflexão mais profunda, pois só assim verificaremos que o foco não está na mãe, que gerou muitos filhos, ou na desconfiança das informações levantadas pelo meio de informação quanto aos irmãos. O fato é que a Síria vive uma guerra intensa, e o que está em risco é a dignidade humana.

Aliás, a luta pela dignidade humana não é uma característica somente da Síria, mas de todo o mundo. O comentário de um dos leitores pode ilustrar perfeitamente o meu posicionamento “Será que alguma ONG internacional já viu o que acontece nessa latrina imunda chamada Brasil?” A cada dia somos bombardeados com políticas desumanas, com criação de leis que pouco beneficiam a classe trabalhadora do país, com elaborações de projetos de leis que criminalizam as manifestações, com reformas trabalhistas que culpabilizam o trabalhador pelos escândalos de corrupção, entre outras.

Nunca foi e não é nenhuma novidade que os nossos dirigentes políticos pouco se preocupam com a melhoria da educação no Brasil. De um modo, ou de outro, eles sempre contribuíram para o atrasa na formação intelectual da classe estudantil. Nos dias atuais, não está sendo diferente. Diante de um cenário marcado pela corrupção, um fator que parece se manifestar como concorrente à criação de escolas, é a liberação de mais recursos para as penitenciárias, as quais estão abrigando, e ainda vão abrigar muito mais, os rebeldes corruptos da política nacional. Essa é mais uma interferência negativa de nossos dirigentes políticos na construção da educação brasileira. Assim, faltariam ONGs para lutarem pela dignidade humana, pois aqui mesmo no Brasil há um pedaço da “Síria” edificado.

A matéria na íntegra pode ser acessada em:

http://g1.globo.com/mundo/noticia/ong-encontra-6-criancas-vivendo-sozinhas-por-2-meses-em-casa-bombardeada-de-aleppo.ghtml. Acesso em: 11.03.2017, às 12:00.