A terceira margem de mim
 
     Eu arrodeava as margens de minha existência, mas nunca me encontrava – o tempo, carcereiro, fazia-me prisioneiro de forças impossíveis de abarcar. Seguia perdido de mim, tronco descendo rumo ao precipício, refém de correntezas alheias. Enxergava minha vida ser navegada por remos que fugiam de meus domínios – não queria recuperar o comando, deixava-me levar.

     Depois fui margem a limitar a pequena demanda de minhas vontades. Ninguém, mais do que eu, apertou tanto as amarras que teimavam em extremar aqueles sonhos mais caros. Em caminhos diferentes fui borda a deter, outra vez, os únicos passos que, enfim, me levariam a um caminho sem tantos meandros – novamente curvei rumo ao nada. Sabotei-me na imensidão vazia dos limites que cerceavam a poesia dos meus dias - fui razão debilitando a força de minhas escassas rebeldias.

     Sentei, ali, na beirada de mim e escutei Vander Lee cantar - naquela hora, também quis morar no interior do meu interior, chorar até cansar, ir para qualquer lugar onde Deus pudesse me ouvir - queria escutar o silêncio que gritava alto dentro de mim. Entendi a vastidão da minha busca. A viagem, enfim, começava...

     Sou barco, canoa... navegante... travessia. Remo ao acaso, o mundo é mistério. Ainda carrego incertezas, procuro respostas em infinitas profundidades e assim sou, verdadeiramente, margem de mim, em mim - parto ao meu encontro.

 
Wal Bittencourt
Enviado por Wal Bittencourt em 23/09/2017
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