Quando um poeta descobre o amor

Os dedos de um poeta não sabem o que estão fazendo.

Sua obra são um emaranhado de trechos de si mesmo ou de outro, a quem ele pensa conhecer.

O poeta quer colocar para fora aquilo que não sabe entender, mas tem a capacidade de definir, descrever...

Ele sente mais que todos. Ele respira sensualidade.

Um chacoalhar dos cabelos de uma mulher bonita lhe renderá poemas e poemas...

Rimas e rimas... Quando o lermos, lhes seremos íntimos. E até mesmo de sua musa inspiradora.

Para qualquer pessoa, seu reflexo na água passará despercebido; talvez arranque alguns sorrisos pela imagem levemente distorcida.

Para um poeta, aquele é um encontro único; seu significado não tem preço. Afinal, quais as chances de deparar-se consigo mesmo, num encontro fortuito, no aconchego da natureza?! Quão belo momento. Quão belos textos lhe renderão.

Ao poeta está proibido fechar os olhos por mais de cinco segundos. Tempo suficiente será para perder-se na estruturação de uma obra que descreva, de forma profunda, o quanto o silenciar-se lhe permite ser ouvido.

Ah, Poeta! Não ames mais do que teus textos possam expressar. O que será de ti quando a inspiração for a dor de não querer poetar a saudade?

Poupa-te, Poeta. Tua sensibilidade aguçada se contentará em transformar um beijo roubado em uma festa qualquer, por um desconhecido, em paixão ardente e repentina, ao som de uma música tão agitada quanto os batimentos do teu coração à luz da Lua - ainda que a mesma estivesse sendo contemplada pela janela.

Poupa-te do amor, Poeta. O amor te será demais. O amor em si só é poesia. Amor em si só é um acontecimento. Onde encontrarás as palavras que o possam fazer jus?

Quando o amor te inspirar, serás pego num súbito arrebatamento, um estado de transe do qual não sairá poesia. Tu mesmo serás as rimas, os versos... Teus olhos fitarão o amor e dele não desviarás para o papel pra que possas escrever. O transe e o silêncio te serão plateia.

E tu não mais te ouvirás.

Fiques longe do amor e permaneça como o arquiteto de tuas obras primas. Tenhas controle do que dirás e de quanta energia desprenderás ao criá-las.

Mas se amar... É o próprio amor quem arquitetará a ti próprio. Tu não controlarás a energia de tuas ações. E serás todo energia. As palavras te serão insuficientes.

Produzirás teus poemas e não te contentarás. Jamais poderás conter o amor em versos. A ansiedade de não saciar-te em teus escritos te tomará.

Por isso te aconselho. Não ames. Se queres fazer poesia, não ames. Se amares, não farás poesia. Serás poesia.