A Arquiteta

A ARQUITETA
Miguel Carqueija


Eu projeto uma casa
como se fosse pra mim:
e minha mente ganha asa,
viajando no sem-fim!

Às vezes eu brinco e rio
procurando imaginar
um castelo bem sombrio
para o Drácula morar!

Porém no mundo real
trabalho com consciência;
Arquitetura é legal
e disso tenho ciência!

E isto faz bem pra alma:
tirar o tudo do nada,
a prancheta me acalma,
me sinto até uma fada!

Sou uma profissional
que ganha para pensar:
é um ofício mental
um imóvel projetar!

E quando ele está completo
janela, porta e garagem
pintura, assoalho e teto
ele vira uma mensagem!

Pois foi feito com amor
e com senso de beleza,
nele pus o meu calor
planejando em minha mesa!

E na construção civil
sou fator preponderante:
eu fiz faculdade, viu,
formei-me e fui adiante!



E também sei urbanismo,
desenho e pra completar
também fiz paisagismo,
não é pra se desprezar!

Mas sou simples na verdade,
não me julgo da elite!
Viver com simplicidade
é bem melhor, acredite!

Com treliças e pilares
até pontes eu planejo,
prédios cheios de andares,
e como artista me vejo!

E nós temos parentesco
desde a Engenharia
a pintura de afresco
e até a Geometria!

Gosto de Courbusier
e sua linha arrojada;
ele é grande, como vê,
e eu fico maravilhada!


Burle Marx me ensinou
que o verde também faz parte,
aí tudo vira um show,
uma linda obra de arte!


O Niemeyer estimo
pois ele eleva o Brasil,
o seu estilo é um mimo
e obras tem mais de mil!

Eu arquiteto com alma,
nem só de número eu vivo:
imaginar me acalma
e meu estro é bem ativo:

Pois é com amor enfim
que eu penso na obra finda:
janela, porta e jardim,
e uma varanda bem linda!



(17/1/17)







A BELA ARQUITETURA DE SPOLETO

(crônica de Izabella Pavesi)


FOTOGRAFIA: IZABELLA PAVESI

        Os olhos de Alice seguiam, fascinados, a cidade medieval tão rica de monumentos. Formada em arquitetura buscou especialização do lado de lá do Atlântico. Muito importante pra ela, ao conhecer outras cidades e as gentes do lugar, era subir num ônibus comum. E assim fez.
        Spoleto se desenvolveu sobre o Monte Sant’Elia, na Úmbria. Na idade do ferro, séc.VII – VI a.C., foi um dos maiores centros da região, segundo achados nas sepulturas, que apresentam ricos adornos daquela era. As descobertas e achados arqueológicos testemunham a vitalidade dessa cidade antes da Era Romana, pois em 90 a.C. já era Município e suas muralhas são antiquíssimas. No ano 570, foi ocupada pelos Lombardos, estes estabeleceram nela o Ducado de Spoleto, que durou até 1230. Em 1805, foi unida ao Reino Napoleônico da Itália e voltou ao domínio do Papa em 1814. Depois, passou ao Reino da Sardegna em 1860, que logo se tornou o Reino da Itália.
        No outro extremo da cidade Alice encontrou a Igreja e Monastério de San Ponziano (séc.XII), e um pouco adiante, a Basílica di San Salvatore que data do séc. IV e que, embora construída em estilo clássico pagão, foi adquirindo detalhes religiosos católicos, como a cruz com pedras preciosas, painéis em mármore, afrescos com temas religiosos e um presbitério muito expressivo.
        Depois de se demorar em frente ao Anfiteatro Romano, bem cuidado e reestruturado, cuja entrada estava fechada aos turistas àquela hora, ela caminhou umas quadras até chegar na “Mura ciclopiche”, ou muro poligonal, relíquia do séc. IV a.C, constituído de enorme massa de pedras calcareas, que bem fortificava a cidade. Com as mãos tocou de leve umas pedrinhas: - “Gente engenhosa” - disse consigo – “será quantos escravos teriam esculpido esse muro em épocas tão remotas!?”
        No complexo de Sant’Agata visitou o “Museo Archeologico Nazionale”, com vestígios e apetrechos provenientes de escavações e estátuas da época romana. Subindo a via Sant’Apollinare, ela chegou na Pinacoteca Comunale, que é um dos museus mais ricos e interessantes da região umbra.
        Encantou-se com uma coluna de arcos que ainda apresenta afrescos de antigas eras: l’Arco di Druso e Germânico, construído em 23 d.C. ao longo do traçado urbano que vai até a praça del’Mercato. Umas quadras além, a arquiteta se deparou com a Torre dell’Olio. Não foi a construção em si que a atraiu, mas um detalhe. Construída no séc.XIII junto com a “Porta Fuga”, é assim chamada porque dali, em defesa da cidade, jogavam óleo fervente sobre os inimigos que tentavam ultrapassar a primeira muralha que circundava a cidade, dita “porta fuga”; e diz-se que muitos inimigos, dentre eles o mais ilustre Federico Barbarossa, teriam sucumbido a esses “banhos”.
        O Duomo di Spoleto ou Catedral S.Maria Assunta é o monumento mais célebre da cidade, e em seu interior, em cruz latina, abriga belas obras e afrescos de grande valor, do séc. XV. É impressionante a ternura da “Madonna col Bambino” de Pintoricchio (1497), e um grande afresco na abside pintado por Filippo Lippi.
        De longe, Alice avistou a Rocca Albornoziana, imponente construção no topo da montanha. Pelo Cardeal Albornoz e por vontade do Papa Innocenzo IV, no séc. XIV, foi erguida essa Rocca , o monumento mais representativo da cidade, com a finalidade de reforçar o esquema defensivo e de controle sobre o vasto território de domínio da Igreja, tanto que chegou a ser sede do Vaticano por breve tempo.
        A jovem foi subindo a colina juntamente com transeuntes em trajes esportivos que se juntavam a outros corredores, pois a Via del Ponte, uma rua para caminhadas, circundava a montanha. Ali, uma edificação lhe causou grande impacto: a Ponte delle Torri. Que obra fantástica! Surpreende qualquer turista desavisado. Alice, fascinada por pontes, cruzou-a apreciando cada detalhe. Na época romana fora construído um aqueduto sobre a ponte e reconstruído no séc.XIII sobre a mesma estrutura. Impressionante! Nas suas extremidades estão a Rocca de um lado, e do outro, o Fortilizio dei Mulini. São 236 metros de largura sobre dez pilares (90 m altura) gigantes agregados em arcadas ogivais que mergulham num abismo entre duas montanhas, onde ali existia em época pré-histórica um lago: “Lacus Umber”.
        - “Estrategicamente, essa imensa ponte foi encaixada aqui” – falou Alice a um turista que se achegou naquele momento.
        Desceu a colina. O tempo corria velozmente, e Alice não pode se demorar na bela Igreja della Mamma d’Oro (1527). Subiu os degraus da Igreja de San Pietro, que possivelmente é a primeira igreja de Spoleto, construída inicialmente no séc. V, e restaurada no sec. XII. Eram tantas as riquezas, um dia era pouco pra visitar tudo.
        Na Piazza Del Mercato sentiu-se agraciada com novos cheiros e sabores que exalavam das barraquinhas. Ali saboreou uma porchetta, especialidade italiana.
        - “Onde fica a casa do Imperador?” – perguntou ao vendedor.
        - “Fica lá em Roma” – respondeu-lhe brincalhão... e riu. (Ele a presenteou com um guia da cidade).
        - “Grazie!”.  - E saiu à procura da tal moradia por ruas e vielas. Felizmente, logo a localizou. A elegante casa romana di Spoleto, séc. I d.C., é testemunha da grandeza das habitações imperiais daquela época. Pertenceu a Vespasia Polla, mãe do Imperador Vespasiano. Encanta pela beleza espetacular com seus afrescos nas paredes decorando o ambiente. O átrio, que é a entrada principal da casa, tem uma espécie de piscina retangular no centro que servia como cisterna, e sobre ela uma clarabóia ilumina o ambiente. Toda casa é pavimentada com lindos mosaicos e colunas em mármore separam os cômodos. Ainda se podem ver os condutores de água construídos em chumbo há tantos séculos.
         Anoiteceu. Alice queria muito ver o “Festival dei due Mondi”, que acontece todos os anos. Desde 1958 esse festival agita a cidade e é famoso pelos concertos, óperas, danças, teatros e exposições de arte e esculturas. Postou-se com outros turistas na Piazza Del Duomo, e pode assistir um emocionante concerto lírico sinfônico da orquestra de Carlo Palleschi.
        Ao final, voltou a Perugia, onde fazia mestrado em arquitetura romana, com uma grande bagagem cultural e pronta para novos desafios.



___________________________ IZABELLA PAVESI                                                            

Texto publicado na Revista INSIEME nº 154 - de outubro.2011 - em português e italiano.


FOTOGRAFIA: IZABELLA PAVESI

Izabella Pavesi, de Florianópolis, escreve no Recanto das Letras e é historiadora, cronista, contista, poetisa e fotógrafa.


 FOTOGRAFIA; IZABELLA PAVESI

imagens: moça no laptop, freepik; casa, pinterest; moça em frente à casa, pixabay. Fotografia de Izabella Pavesi em Spoletto gentilmente cedida pela autora. Aqueduto em Spoletto e interior da Catedral de Santa Maria Assunta com afresco de Giotto: fotos gentilmente cedidas por Izabella Pavesi.