VOZES E IDEAIS

Na insalubridade mórbida de minha cela

Toda a dor que eu sentia era só e apenas minha

Mesmo que eu quisesse, mesmo se eu pudesse

Jamais a daria ou a dividiria com alguém

Pois há na vida coisas que não se transfere

São seus ideais, seus princípios, lutas suas

Tenho eu que traçar meus próprios planos

E por enganos conheço as verdades nuas e cruas

Na insalubridade mórbida de minha cela

Sou brutalmente apresentada ao meu pré-destino

No canto jogada a minha própria sorte

Eu já sabia que o pré estava sendo o agora

E o destino não mais que a minha própria morte

Não gritei, não chorei e nem esmurrei a porta

Não adiantaria pois Deus aquele lugar não conhecia

E para todos, pela ditadura eu já estava morta

Na insalubridade mórbida de minha cela

Sei que o tempo passa mas eu não o vejo

Sei que outros morreram pois não mais os vi

Sei que sei muito, sei também que não sei nada

Mas quando eu chegar ao fim dessa jornada

Levarei para o túmulo todos os meus segredos

Onde o meu corpo se misturará a fria terra

E finda essa guerra, minha alma terá sossegO

Na insalubridade mórbida de minha cela

Eu começo a despedir-me desse mundo

Vejo, ouço, mas nada mais eu sinto

Nem meus amigos, os ratos famintos

Com quem eu tanto conversava sobre tudo

Meu corpo há muito cadavérico e sujo

Fez-se inerte chegou ao fim de sua jornada

Alguém o chutou revirou e disse: esse aí

Esse não presta não serve mais para nada

O regime deu sumiço, mentiu e prendeu

Matou todo e qualquer foco de resistência

Aplicando como sistema uma repressão voraz

Torturou todos os que queriam liberdade

Reprimindo em nós todos os anseios de paz

Agindo sempre na contramão e, de modo ilegal

Cometeram dois grandes e nefastos erros

Mataram inúmeros idealistas, mas...

Não mataram um só ideal.

Alvesombrinha
Enviado por Alvesombrinha em 10/01/2017
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