Meus relacionamentos tóxicos

Eu sempre fui o tipo de pessoa reservada, de poucos amigos. Na escola era a excluída, considerada a feinha perto das outras. Sempre tive meu amor platônico, aquele que eu não tirava os olhos nem um segundo. Um dia ele soube o que eu sentia e ignorou. Quando acabou a escola, jurei que não iria gostar de mais ninguém. Fiz amizades novas e entre elas conheci um rapaz, ficamos bem amigos e logo ele se disse apaixonado por mim, e eu boba, adorei aquilo. "Como assim, alguém gostando de mim?". Criei expectativas e deixei rolar. Um dia na frente do museu do Ipiranga aqui em SP, ele me beijou e me pediu em namoro na mesma hora, e eu aceitei. Foi surreal. Eu transbordava felicidade. O tempo foi passando e era tão perfeito. Ele me deu aliança em uma rosa de surpresa, era tudo lindo.

Até o dia que achei um segundo Orkut dele (sim, é dessa época), lá ele só tinha mulheres adicionadas, marcava encontros, fotos... Meu mundo caiu. Não me lembro como mas descobri senha do MSN dele, entrei e lá estava quem ele realmente era. Tantas conversas, traições. Brigamos.

Ele jurou não fazer mais. Eu acreditei. E seguimos, ele me enganando, eu descobrindo, ele jurando não fazer mais e eu acreditando. Eu tentava terminar e ele dizia que iria se matar, se jogava no chão, se batia. No fim eu estava exausta, surtada, ele me chamava de louca, que fazia aquelas coisas por culpa minha mesmo, que eu não confiava nele. Não me lembro bem como foi, mas um dia terminei. Durou 2 anos e meio. Foi na semana do meu aniversário de 21 anos. Me dei a liberdade como presente.

Mas mal sabia que viria coisa pior.

Comecei sair com minha amiga, comecei beber como se não houvesse amanhã, conheci alguns rapazes, me divertia e não queria saber de outra vida. Até conhecer um cara no bar. Mais velho, maduro, com um papo diferente.

Começamos sair, nos conhecer. Ele me tratava como princesa, se preocupava comigo. Começamos namorar, e tudo eram flores, o casal 20. 1 ano, 2 anos... E o castelo começou cair. Um dia numa festa de um amigo, ele bebeu mais do que devia, por algum comentário bobo meu ele se alterou e começou a gritar, me pegou pela mão e disse que íamos embora. A casa dele ela no final dá rua. No meio dá avenida ele gritava comigo, me ofendia, até segurar meus braços, me chacoalhar e me jogar no chão, ali na calçada.

Eu boba me levantei e ia atrás dele, chorando, implorando pra ele me desculpar (por algo que não fiz, e nem sabia o que era). Enfim, no final daquele dia louco, só me lembro que "tudo se resolveu" e no dia seguinte nada tinha acontecido.

Mas aquela foi só a primeira vez. Houveram várias sequências iguais. Gritos, humilhações, ofensas, e eu chorando, e pedindo desculpas por coisas que eu nem mesmo sabia o porquê. Comecei pisar em ovos, me policiar em cada palavra dita com medo das reações dele, deixei de ser eu mesma, espontânea, alegre, animada, e virei uma bolha, guardando tudo pra mim, meus sentimentos, minhas opiniões, minhas vontades. Nisso se foram 3 anos. De uma hora pra outra ele comecou me tratar friamente, me evitar na cama, me tratava seco, fazia insinuações sobre traição. Até que me acusou de estar o traindo, sem nenhuma base, sem nenhum fundamento, simplesmente decidiu que eu estava. Começou passar em frente a faculdade pra ver se meu carro estava lá, começou me ligar com frequência pra saber onde estava, me tratava mal, me ofendia. Um dia conversamos, ele me explicou os motivos dele pela desconfiança (questões religiosas) e eu o perdoei, ele jurou melhorar. Mas só piorou, cada dia mais frio, mais grosso, mais indiferente. No meu aniversário de 25 anos, comemoramos com amigos num bar. Indo embora de carona, nos dois no banco de trás do carro de um amigo, estávamos abraçados e por algo muito bobo, um comentário aleatório, ele me empurrou pra longe, começaram os gritos, as ofensas. Ele me deu um soco no braço, puxou meus cabelos e bateu com minha cabeça no vidro. O amigo parou o carro para resolver, ele desceu e saiu andando... Sumiu. Só apareceu no dia seguinte pedindo perdão, chorando, dizendo que a bebida era uma maldição e jurou parar de beber. E eu aceitei. Ele acalmou por um tempo, porém continuava me tratando rispidamente. Em dezembro, na virada do ano, pedi a Deus que me ajudasse sair daquilo. Eu me sentia suja, baixa, não tinha mais vontade de estudar, de comer, de sair, de me arrumar. Antes eu era vaidosa, não saia sem maquiagem, me arrumava, tinha gosta em me cuidar, mas a essa altura já não tinha mais vontade nem de viver. Pedi muito a Deus naquele momento. Nunca tive "intimidade" com Deus, mas naquele momento eu me entreguei a ele, e pedi com toda força que me ajudasse, que me mostrasse algum caminho. Em janeiro me formei, em fevereiro arrumei emprego. Estava feliz pela conquista, feliz por começar a ser independente, fazer novos amigos, respirar um novo ar.

Nesse período de tempo ele não estava mais sendo agressivo, mas era indiferente, me tratava seco, não tínhamos mais intimidade a meses. Eu criei forças e estava esperando o próximo ataque para terminar, afinal, eu precisava de um motivo concreto, se não seria injusta.

Em maio fomos em um show com um casal de amigos. 20 minutos após nossa chegada, ele disse que iria ao banheiro e simplesmente não voltou mais. Desesperei, chorei... E então caiu minha ficha de que aquele era o fim, seguiria minha vida dali em diante.

No dia seguinte ele me mandou áudio dizendo que acabou e eu confirmei e sumi. Uma semana depois ele começou me ligar pedindo pra conversar, eu recusei. Quinze dias depois acabei aceitando pra colocar um ponto final. Fomos a um restaurante. Após 10 minutos de conversa, ele se levantou, foi ao balcão e voltou com um buquê de flores e um cartão. Pela primeira vez naquele dia não soltei nem uma lágrima. E ao ver aquele gesto dele, me despertou muita raiva. A essa altura já havia lido muita coisa sobre relacionamentos abusivos e achei de muita cara de pau, após 4 anos e meio juntos, em meio a grosserias, agressões e nenhum gesto de carinho, agora ele me dar flores. Ele me pediu uma chance pra provar que havia mudado (em 15 dias). Eu agradeci e recusei, ele insistiu, fez drama, jogou na cara os 4 anos e meio "maravilhosos" que vivemos, chorou. Insinuou que estávamos passando por uma crise devido a falta de sexo e sugeriu que tivessemos tal intimidade, que tudo iria melhorar. Senti nojo de olhar para a cara dele naquele momento. Recusei e pedi que fossemos embora. Ele pediu que eu pensasse durante a semana e que tivéssemos um encontro definitivo então. Concordei, na hora, pensando apenas em encerrar tudo aquilo e ir embora o quanto antes.

Nós nos encontramos uma semana depois e eu reafirmei que não queria mais que queria seguir minha vida. Ele chorou, me abraçou forte, pedia perdão. E por fim, após muita negação minha, ele concordou.

Acreditei ali que havia acabado e teria paz. Mas nos dias seguintes foram piores. Ele me ligava o tempo todo, ora pra pedir perdão, chorar e dizer que mudou, ora pra me ofender, me chamar de ingrata e me culpar por tudo.

Um dia de domingo me deparei com uma moça chamando meu nome no portão de casa, com flores na mão enviadas por ele, pedi que levasse de volta e que nunca mais aceitasse encomenda dele para mim.

Já esgotada, liguei para ele e ameacei dar queixa na delegacia caso não me deixasse em paz. Não me recordo bem, mas após algum tempo, houve 2 ou 3 ligações dele na tentativa de sermos amigos. A essa altura já havia o excluído e bloqueado de minhas redes sociais e cogitava mudar de telefone caso as ligações continuassem.

Alguns meses depois me aproximei de um rapaz no meu serviço, começamos a sair. Tinha muito medo de meu ex ficar sabendo e ter alguma reação. E 1 mês depois ele soube, não sei como, me ligou dizendo estar feliz por mim, que queria ser meu amigo, pedi que ele seguisse a vida dele e deixasse eu seguir a minha. Ele nunca mais me ligou. Algum tempo depois soube através de amigos que ele estava me difamando, dizendo que o rapaz que eu estava já era meu amante enquanto estava com ele, inventava calúnias. Mas ao mesmo tempo dizia que um dia ainda iriamos nos casar. Após um tempo já não tive mais notícias dele.

Ainda tenho medo de cruzar com ele em algum lugar. Não tenho a menor vontade de ve-lo novamente, tenho pânico de me lembrar do nome dele.

Muitas pessoas não entendem os motivos que levam uma pessoa a continuar com alguém que só lhe faz mal. Acham que se a pessoa está se sujeitando aquilo, é porque gosta e então merece.

Mas isso vai muito mais além. Isso começa com a nossa autoestima. Eu era a menina rejeitada, ignorada é ridicularizada na escola, não me sentia bonita, não me sentia querida. Minha autoestima era baixa, nula. Eu me odiava, me mutilava, tive anorexia, distúrbios alimentares.

Quando surge alguém demonstrando afeto, a gente fica cega. Acha que a vida vai mudar, que tudo vai ficar bem. Mas diante dá nossa fragilidade ficamos sujeitas a nos deparar com pessoas abusivas e tóxicas. Elas sabem te levantar, mas também sabem seu ponto fraco para te destruir. Apesar do texto imenso relatando meus relacionamentos, isso foram apenas algumas coisas, tem muito mais além disso, muitos detalhes de como foram me destruindo pouco a pouco. Eu que já nunca me senti inteira, terminei de ser destruída por pessoas que eu AMEI, amei do mais profundo do meu ser. Eles me destruíram tocando em feridas, conhecendo minhas fraquezas, meus pontos fracos. Sinceramente, os tapas, socos e empurrões a gente acaba superando, o roxo sai dá pele e a dor passa. Mas as palavras não. Essas entram e não saem nunca mais de dentro de nossas almas. Dói, dói a cada dia. Por mais que a vida siga em paz, mas continua doendo. O medo de passar por algo parecido de novo dói.

Apesar de tudo que passei na adolescência não derrubava uma lágrima, isso pra mim era demonstrar fraqueza demais, humilhação. Mas me mutilava pra aguentar o tranco, tinha pensamentos suicidas, e tive muitos ainda durante os últimos anos.

Depois de tudo isso que passei nos últimos 7 anos, eu choro, e eu choro muito. Por um mínimo que qualquer pessoa seja ríspida comigo, eu choro. Instantaneamente. Algumas pessoas acham que eu sou sensível demais, que não deveria ser assim. Mas não sabem do histórico dá minha vida. Das vezes que engoli o choro pra não ouvir mais ofensas ou não preocupar outras pessoas. Das vezes que fui parar no hospital com dores sem motivo aparente, dor psicossomática devido ao emocional.

Hoje eu prefiro chorar.

O amor? Nesse não acredito mais. Acredito em pessoas que se respeitam, se fazem bem. Mas não sei o que é o amor, minhas experiências não me permitiram viver isso, se é que existe. Na verdade acredito sim que exista, mas tenho certeza de que não é para mim. Talvez tenha alguma explicação espiritual, vidas passadas... Algum karma, fardo ou sei lá o que que carrego, sei lá. Pensar nisso dói, mas ajuda afagar o peito e aceitar que por algum motivo não mereço ser amada.

Atualmente me encontro num relacionamento a 9 meses. Graças a Deus está indo tudo bem. Nos respeitamos, somos amigos. Gosto muito dele e sei que é recíproco. Sei também que ele não me ama e que provavelmente nem vá chegar a isso algum dia. Aprendi a ser realista na minha vida, fica mais fácil assim do que esperar por coisas que não virão.

Apesar de eu mesma me magoar com esses pensamentos e chorar vez ou outra encolhida no meu travesseiro, estou tentando ser feliz. Felicidade é feita de momentos, então sigo assim, um dia após o outro, as vezes trupico e recomeço e assim vou tentando viver...

BT
Enviado por BT em 22/05/2017
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