Saúde

São dez da manhã. Semana de carnaval. Estou em outro estado. Eu acordo e me sinto um pouco tonta, com sede, cansada. Vou até a cozinha, pego um copo de água, faço ovos mexidos e tomo meu café que tanto gosto. A comida não desce muito bem, me sinto enjoada. Pego outro copo de água. Outro. Outro. Mas que sede é essa? Ressaca? Não pode ser, eu não bebi ontem a noite. Subo as escadas pra falar com a minha mãe sobre o meu mal estar. Chego no quarto, olho pra ela e digo que não me sinto muito bem. Minha cabeça fica pesada de uma hora pra outra, minha visão embaça e meu coração começa a bater rápido. Rápido demais. Acho que vou desmaiar. Mãe, to sentindo uma coisa estranha. Começo a ter hiperventilação. Minhas mãos começam a tremer. Eu corro pro banheiro molhar meu rosto, meu pulso, minha nuca. O aparelho pra medir a pressão tá com você, mãe? Eu acho que estou tendo um ataque do coração. Ela coloca o aparelho no meu pulso. Puta merda. 17/10? Eu não entendo nada de pressão. Mãe, isso é alto? O que tá acontecendo comigo? Chama uma ambulância! Mãe! Eu acho que vou morrer. Chama uma ambulância, agora! Vamos pro hospital! Tem um hospital aqui perto? Mãe! 15 minutos? Será que eu aguento? Ok, vamos. Minhas pernas estão dormentes, eu não consigo descer essas escadas. Alguém tem que me carregar até o carro. Minha tia me coloca nas costas. É o único jeito de eu ir até o carro. Entro nele. Será que vai demorar? Chego no PS. Sento na cadeira de rodas. Ficha? Fazer ficha? Moça, eu estou tendo um treco e você quer que eu faça ficha? Eu quero um atendimento! Você vai me fazer esperar até quando? Começo a me acalmar. Respiro fundo. Mãe, pega água pra mim. Preciso ir ao banheiro. Espero alguns minutos. A enfermeira me chama. Pressão ok. Temperatura ok. Volto pra sala de espera. A médica me chama depois de um tempo, eu entro na sala dela, conto o que aconteceu e ela fala que eu pareço normal. Me diz pra eu ir para os fundos fazer um eletrocardiograma. Eu faço. Tudo ok. Ufa. Me sinto mais calma. Me sinto bem. Porém assustada. “Se tiver isso de novo volte para o Pronto Socorro.” Hum, ok. Não entendo o que aconteceu. Volto pra casa, com medo, muito medo. Não consigo ficar um segundo sem minha mãe do lado. Mãe, adia meu voo de hoje à noite porque não vou conseguir voltar para casa desse jeito. 7 da noite e tudo o que eu vivi mais cedo se repete. O que tá acontecendo comigo? Mãe, vamos pro pronto socorro. Todo o processo de hoje mais cedo é feito novamente. Estou me sentindo bem. Porém cansada. Por que eu tenho esses surtos do nada que duram 15 minutos? Eu chego no hospital e eles não tem o que fazer. Me mandam de volta pra casa. Não consigo entender. Conto pras minhas amigas o que aconteceu. Uma delas me pergunta se isso não foi uma crise de pânico. O que? Lógico que não. Eu nem sei o que é isso. Eu não estou com problemas psicológicos, sempre fui uma pessoa muito tranquila, talvez um pouco ansiosa... mas um ataque de pânico?! Tá doida? Vou pra cama. Demoro pra dormir, não acho uma posição confortável. Me sinto aflita. Com medo.Muito medo. Acordo no dia seguinte. Outro ataque. Vou no PS. Adio meu voo. Ah! Antes eu tivesse na minha cidade pra resolver isso. Amanhã eu volto. Durmo. Acordo no dia seguinte, outro ataque. Agora tá sendo feio. Eu to deitada no chão tremendo muito. Não consigo deixar minhas pernas paradas. Parece que meu coração vai pular pra fora da minha boca. Vou pro PS. O médico pergunta se sou uma pessoa ansiosa. Um pouco. Mas que diabos isso tem a ver? Volto pra casa pra ir pro aeroporto. Eu vou sozinha no voo. Faço check in. Começo a me sentir tonta. Ah não! Aqui não! O funcionário pergunta se eu to bem. Acho que não, moço. Meu coração dispara. Preciso de água. Me sento. Ele não pode me deixar embarcar desse jeito. Volto para casa. Adio meu voo. Vou dormir. Acordo. Tudo de novo! Mas dessa vez a gente vai pra um hospital do coração, mãe. Chego lá. Faço os exames. Tudo ok. A médica me passa um calmante natural. Eu tomo ele de manhã, me deixa com muito sono. Durmo o dia todo. Não consigo ficar um segundo sozinha. Minha mãe virou minha sombra. Tenho medo de me mexer muito e acelerar meu coração. Olho minha família tomando café e me sinto chateada de não poder tomar também. Cafeína, né. Me sinto tonta o dia todo. É um mal estar contínuo. Mal consigo me alimentar. Tudo me dá ânsia. Chegou a hora do meu voo! Finalmente, vou pra casa. Tomo meu calmante. O voo é tranquilo. Escuto música, mexo no cabelo, mexo na bolsa, converso com as pessoas do meu lado. Cheguei São Paulo! Que alívio! Minha amiga me fala pra procurar um psiquiatra. Psiquiatra?! Eu não sou louca pra ir em um psiquiatra! Não consigo viver normalmente. O mal estar virou rotina. Acho que devo marcar um psiquiatra. Eu não aguento mais! Chego no consultório e explico o que aconteceu. Doutor, me ajuda! Eu não sei mais o que fazer! Transtorno de pânico? Eu estou tendo ataques de pânico? Ok, vou tomar Escitalopram de manhã por dois meses e o Clonazepam se tiver crises. Pera aí. Clonazepam... você quer dizer Rivotril? Uau. 18 anos e tenho que tomar remédio de tarja preta pra conseguir me manter sã. Esse Escitalopram me dá uma baita dor de cabeça, parece que vai explodir. Mal consigo comer. A tontura e a falta de concentração me tiram do sério. Até quando vou me sentir assim? Eu só quero a minha vida de volta! Eu só quero poder sair, poder ficar tranquila em casa sem surtar porque não tem ninguém por perto. Décimo quinto dia de tratamento. Me sinto ótima, sem tonturas, sem enjoo, sem palpitações. Consigo me exercitar e até tomar um cafezinho de vez em quando. Me sinto uma nova pessoa. A terapia me ajuda muito. Foram os piores 30 dias da minha vida. Achei que nunca ia voltar ao normal. Foram inúmeras as vezes que eu tinha certeza que morreria. Crise de pânico não mata. Nunca dei tanto valor às pessoas que me ajudaram a sair dessa. Meu anjo da guarda não falha. Deus não falha. E eu tento, a cada dia, conviver com tudo que aconteceu. É difícil, foi difícil. Mas com coragem e fé é possível vencer tudo nessa vida. Já perdi a conta de quantas vezes eu estava crente que tinha enlouquecido. Estou viva, estou bem e estou lutando contra isso todos os dias, a todo momento. Aguento firme essas sessões de adrenalina que meu corpo recebe pois estou há um mês fazendo inúmeros exames que, graças a Deus, só mostram como sou uma pessoa com saúde. Saúde. É só disso que precisamos. E o pior de tudo: só nos damos conta da importância dela quando nos falta. Infelizmente.

Nathalia Santos Bueno
Enviado por Nathalia Santos Bueno em 23/04/2017
Reeditado em 23/04/2017
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