Herdeira do Caos - Capitulo 06 - Captura

-O que foi isso?! – exclamou ítalo despertando do topor da visão que o tomou.

-O que, você viu isso também? - perguntou Lilian, atormentada com a visão e agora assustada pela possibilidade de que ambos foram acometidos pela mesma alucinação – De mim tendo aula com alguém?

-Sim! Nunca pensei que conheceria uma bruxa! Mas você podia ao menos ter-me avisado que iria mostrar-me isso!

-Primeiro, eu não sou bruxa, segundo, eu não faço ideia do que aconteceu. Não sei quem é aquele, apesar que a imagem dele é muito vivida na minha mente, como se eu tivesse convivido com ele por muito tempo, mas não consigo lembrar de nada relacionado a ele. E que papo de magia é esse?

-No Brasil não se usa mais magia? Aqui é algo comentado a boca pequena, mas todo mundo sabe que ela existe. Dizem ate que as grandes empresas e gangues poderosas tem um mago ao seu serviço. Nunca vi ninguém que realmente fizesse mais do que truques, e nem ouvi falar de onde ou como se aprende, mas hoje eu sai de casa andando sem rumo, sentindo-me atraído pelo destino ate aqui, e quando percebi, ouvi raios e te encontrei caída nesse beco. Acho que alguma força conduziu nosso encontro.

Lilian sentia-se estranha. Percebeu que algo não era mais o mesmo em si. A única vez que havia se sentido assim foi quando havia atingido o auge de seu ultimo namoro. Hoje arrependia-se de todo o tempo que passara naquele relacionamento e de muito do que fizera, e a sensação de que havia feito algo que não havia retorno assomava sobre ela. Talvez realmente fosse a magia, no fim das contas, afinal, na visão havia sido advertida sobre a dificuldade e o preço de fazer magia. Mas o que desencadeara isso?

-Ok, vamos assumir que eu consiga, veja bem, consiga e não saiba, fazer magia. Eu estou me sentindo meio mal, adoraria descansar, tem como irmos pra algum canto menos fedido que esse beco imundo para que eu possa pensar nisso?

-Vejamos, demorei umas horas andando pra chegar aqui, mas aposto que deve passar ônibus para o centro em algum lugar por aqui. Duvido que você tenha dinheiro, certo?

-Apenas Reais, e se estamos em noventa e dois, esse dinheiro não vai ser aceito pelos próximos dois anos. E a menor nota que eu tenho é de dois Reais, que acho que so vai ser criada depois do ano dois mil, então não, não tenho dinheiro. A passagem aqui é cara?

-Depende de qual linha e empresa precisarmos pegar. E parando pra pensar, não deveríamos continuar por aqui, boatos dizem que coisas muito ruins tem acontecido aqui na zona portuária.

-Ruins tipo?

-Ruins tipo escravistas, sequestradores satanistas e sei mais o que, além dos assaltantes e estripadores que sempre podem estar nas sombras de uma cidade grande como essa.

-Escravistas? Em pleno século XX? Que ilha maluca é essa?

-Uma das maravilhas do anarcocapitalismo. Nunca pensaram que ter policia privada e não ter um governo para fazer leis abriria brecha para coisas horríveis assim acontecer. – respondeu Ítalo com claro sarcasmo. – Já ouvi falar de casos de pessoas que passaram décadas escravizadas em mansões ou industrias, ate pagar uma divida ou conseguir fugir. Não me espantaria se surgissem um bando de escravistas aqui e tentassem nos levar como premio.

-Mas você trabalha como segurança, você deve ter uma arma, deve saber se defender e me defender né? Não deixaria uma donzela em perigo na rua, deixaria? – perguntou Lilian com cara de cachorro sem dono. – Se serve de ajuda, tem um canivete aqui na minha bolsa. Acho que posso usar ele pra me defender. – disse enquanto remexia na bolsa e pegava o canivete.

-Bom, eu sei lutar, sei atirar, mas não estou armado, o porte de armas não é crime mas é um convite a encrencas, então melhor evitarmos pessoas esquisitas ou suspeitas.

-Tipo aquelas do outro lado da rua, la fora do beco?

Ítalo olhou sobre o ombro, e percebeu que haviam dois homens conversando do outro lado da rua, logo fora do cone de luz emitido pelo poste. Não pareciam boas pessoas, pelas suas roupas largas e os sobretudos num dia que fizeram ceu claro e sem previsão de chuva. Eles aparentavam conversar, mas Ítalo percebeu que eles não haviam desgrudado os olhos do casal no beco.

-É, tipo eles mesmo. Esse canivete esta amolado? Ao menos ele é bonito, parece bem trabalhado.

Lilian olhou para o canivete, tentou abrir sua lamina, mas ela parecia emperrada. As outras ferramentas abriram, mas não pareciam ser exatamente armas. Abridor de garrafa, de latas, saca-rolhas, lixa de unha, uma tesoura minúscula que provavelmente não cortaria nada além de papel. Tentou encaixar alguma das ferramentas na mão, e o máximo que conseguia era ficar com a ponta do saca-rolhas para fora dos dedos e o abridor de latas que era vagamente afiado saindo pra baixo da mão. Não era uma arma, mas poderia servir para pegar alguém de surpresa.

-A lamina esta emperrada, mas acho que da pra usar como um soco inglês se eles vierem pra cima - e ao olhar para a possível ameaça, percebeu que eles haviam saído de vista – não que eles ainda estejam ali pra gente ter de testar.

-Acho melhor agente ir andando, não quero saber se eles vão voltar.

Lilian estava pensando em como tudo isso se parecia com um jogo ou um livro, como tudo acontecia de uma forma teatral, e ela percebia-se como a protagonista de uma historia, porem, mal Ítalo tinha terminado de falar, um barulho de lata caindo sobressaltou a dupla, e uma fumaça amarelada tomou conta do beco. Lilian, surpreendida pela fumaça e ainda desnorteada por toda a situação, não conseguiu se decidir se corria ou procurava a fonte da fumaça, e começou a sentir-se tonta. Caiu escorregando pela parede, enquanto sua visão embaçada registrava Ítalo tentando correr para fora do beco, apenas para ser surpreendido por um dos homens que os vigiavam de longe acertando-o com uma joelhada na barriga, enquanto o outro lhe empurrava de volta pro beco. Ambos agora tinham lenços vermelhos amarrados no rosto, talvez para lhes proteger do gás. Lilian tentou não respirar, mas a consciência a deixou antes que pudesse perceber, conseguindo apenas murmurar.

-Mas que anti-climático.

Fernando Salgado
Enviado por Fernando Salgado em 16/06/2017
Código do texto: T6028896
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