O tempo do amor!

"Bom dia! Posso falar com você?"

"Bom dia! Claro, José. Veio ver Açucena?"

"Não, vim conversar com você. Acha que pode me ouvir um pouquinho?"

"Tá bem. Mas vamos conversar noutro lugar. Mainha está por chegar e parece que o assunto é sério."

Dirigiram-se para a praça em frente. A enramada de amor-agarradinho subia pelo pergolado derramando suas flores cor-de-rosa pelos entremeios das vigas, exalando um perfume suave. Sentaram-se no velho banco desbotado. Repentinamente o vento sacudiu as ramas e caiu uma chuva de florzinhas rosadas salpicando o cabelo de Camélia. Sorriu feito criança. Zé ficou ali parado, encantando-se com a cena. Mas seu encanto mesmo eram os olhos dela. Aquele verde que fazia com que ele tivesse vontade de saltar do trampolim pra dentro deles e nadar de braçadas.

"Camélia?!! Acha que poderá me perdoar? Fui um bocó, eu era tão moço... Me arrependo tanto. Poderíamos ter sido tão felizes, nós três. Se tivesse me contado que estava grávida jamais eu teria me casado com alguém que não fosse você."

"Zé ..."

"Não me interrompa. Camélia, deixe eu falar tudo, por favor. Na época em que te conheci eu namorava aquela moça, a ¬Margarida. Desde a primeira vez que vi você saindo da escola, não consegui mais tirar você do pensamento. Pensava em você o tempo todo. Me sentia muito mal, não me sentia livre para te amar. Mas o sentimento tomou conta de mim a tal ponto que não consegui resistir e me aproximei de você até que começássemos a namorar. Mas eu tinha um compromisso o qual não sabia como terminar. Haviam muitas coisas envolvidas.

Eu pensava " Encontrei a mulher da minha vida!", mas ela chegou na hora errada.

Fui procurar meu padrinho, ele é um homem muito culto. Embora pobre de dinheiro, era rico em sabedoria, lia muito e tinha uma experiência de vida fantástica. Contei a ele sobre você. Ele me disse algo mais ou menos assim:

"Zé, na ordem divina das coisas jamais existe hora errada. O amor quando surge, chega no momento exato. Através da sintonia dos seres que se atraem enredados palas tramas do destino, exatamente como planejado pela força maior do universo que a todos comanda. Não há acaso, Maktub: Tinha que acontecer! Mistérios e desígnios inerentes à nossa vontade, porém necessários à nossa jornada evolutiva.

Não há condição social, moral, econômica, geográfica, religião, que o impeça de existir ou que o comande. Surge! Implacavelmente! É como se já existisse, milenar, no âmago da alma, latente, porém adormecido. Repentinamente, tal qual o Big-Bang torna-se um universo em expansão e vai ocupando todos os nossos poros e veias.

Não há nada que o impeça de prosseguir. Nem convenções, dogmas, medo, culpa, nada. Simplesmente ocupa os vácuos existenciais, renova os sonhos, revolve as águas estagnadas dos planos e projetos, enchendo-as da vida nova, onde florescem novos anseios e desejos.

A cada pulsar "contamina" tudo ao seu redor! Reluz na retina, expande-se no sorriso, acelera na pulsação, fervilha nas veias, afogueia-se nas faces, arde no ventre, umedece os lábios. Muda-se até a vibração celular. Se o rufar dos corações pudessem ser ouvidos a cidade inteira seria tomada por enorme poluição sonora.

Sussurra "Eu te Amo" no singelo aperto das mãos unidas ou no abraço demorado. Torna-se insone na ausência, lacrimal na despedida! Incompletude, mutilação quando separados. Como fora repentinamente guilhotinado, reduzido de uno à metade.

Reconhece-se pelos uníssonos pensamentos. Chegam a ser ouvidos alto e claro entre os que o sentem.

O amor tem sentidos que vão além das percepções sensoriais conhecidas. Possui outras bem mais amplas. Diria até extra-sensoriais! Advinha-se. Busca-se. Encontra!

É acima de tudo "Encontro".

Rompe as fronteiras do ego, das regras, de tudo!

Jamais desiste, persiste, insiste sobreviver às intempéries. Desespera-se ao aceno do rompimento.

Urge existir!

Desnecessário descrevê-lo tão longamente.

Por ser amor, basta... Sentir!

Deixar fluir!

Amar!

Se for assim com você, ela é o amor da sua vida! Não a perca!"

"As palavras dele me comoveram profundamente. Eu tinha que tomar uma decisão. Queria ser feliz com você. Mas na mesma semana você terminou tudo. Desisti de lutar por você. Fui covarde".

Camélia suspirou fundo, muito fundo.

"Camélia, aceitaria recomeçar?”

"Zé, eu te disse sim desde o dia em que nos conhecemos naquela festa junina. O que aconteceu de lá para cá foi desenhado pelas mãos do tempo e pelo lápis do destino. Eu adoraria que sua alma de morcego sugasse todo o meu néctar e que pudéssemos recuperar nosso tempo! O tempo do amor!"

Colaboração: Ângela Fakir e Jeanne Martins

Desenho: Ângela Fakir

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