CHAPEUZINHO VERMELHO........-PARTE III

1---Nova versão de CARLOS:

“A história de CH sempre me pareceu mal contada e não há esperança de se conhecer exatamente o que se passou entre ela, a avozinha e o lobo. Começa que Chapeuzinho jamais chegaria depois do lobo à choupana da avozinha. Ela vencera na escola o campeonato infantil de corrida a pé, e normalmente não andava a passo, mas com ligeireza de lebre. Por sua vez, o lobo se queixava de dores reumáticas e foi isto, justamente, que fez CV condoer-se dele. É o que conta uma versão da história contada por tia Nicota, no começo do século, em Macaé. Segundo ali se dizia, CV e o Lobo fizeram boa liga e resolveram casar-se. Ela estava persuadida que o lobo era um príncipe encantado, e que o casamento o faria voltar ao estado natural Seriam felizes e teriam muitos gêmeos. A avozinha opôs-se ao enlace, e houve na choupana uma cena desagradável entre os três. O lobo não era absolutamente príncipe, e Chapeuzinho, unindo-se a ele, transformou-se em loba perfeita, que há tempos ainda uivava à noite, nas cercanias de Macaé.”

2---Versão retorcida - HQ do MAURÍCIO:

Mãe de MÔNICA mandou pegar uma encomenda em casa de dona Gumercinda. Se pudesse, a visitaria todos os dias. “Mora num lugar tão bonito!” Atalho, passar no laguinho, no bosque, ver passarinhos e árvores enormes! Achava que (imaginação?) alguém a seguia. Seria o Cebolinha?! Era o Lobo que perguntou se a Vovozinha morava ali. “Sou o Sr. Lambão, lobo ao seu dispor.” Apertaram-se as mãos, isto é, patinha dele e mão dela. De ‘diferente’, ele disse, ela não usava o chapeuzinho nem levava a cestinha de lanche. Era só o vestido vermelho......... “Tadinho! Deve ter me confundido com outra pessoa!” - pensou. E ele calculou chegar “lá” antes dela: “Mas aonde?” Ofereceu acompanhá-la. Bom, ela iria buscar em casa da doceira algum bolo, doce ou coisa parecida. Lobo, desesperadamente guloso, planejando... Chegaram juntos à tal casa. Lobo esperaria do lado de fora, ela pegaria a encomenda e depois o protetor a levaria para casa. “ O bosque é muito perigoso!” A menina VV (vestidinho vermelho) pegou o pacote, lobo de olho em cima Mesma ladainha: “Por que você tem olhos tão grandes?” “Por causa de um cisco que eu tinha neles! Usei um colírio e...” “E esse focinho enorme?” “Isto é por causa da poluição! Sou obrigado a respirar mais ar!” Lobo se enfezou. “Escuta aqui! Que tal parar de esticar o papo e me entregar logo essa encomenda?” “Não posso! É da minha mãe!” O assaltante pegou na marra o pacote dizendo que ia engolir inteiro. Fugiu e a deixou atônita na estrada, olhando para um lado e outro... “Mamãe vai ficar danada comigo!” Depois, em casa: “Ora filhinha, não fique triste” A encomenda não era assim tão importante para mim - apenas um quilo de fermento pros meus bolos!” Em minutos, na floresta: “Eu mereço isto! Eu mereço! Eu mereço!” Sr. Lambão deitado no chão, um barrigão enooooorme.........

3---Agora versão de ORLANDO MIRANDA, professor de sociologia na USP e escritor - “Chapéu vermelho II - as bocas do Lobo”:

Sinopse - “Dona Zenóbia chega em casa, um sobradinho no Bom Retiro, salão de beleza ainda cheio de clientas e chama a filha Magali, quase 15 anos: levar remédio de dormir para a vovozinha, muito velhinha e já tomara o último comprimido. Sábado, programação boa para sair. “ - Tá bom, tá bom!” Mãe recomendou não chegar perto de lenhador e tratar bem o lobo, se o encontrasse. Ônibus direto para a casa da avó, Santana-Paraíso a cada 45 minutos: ah. rua da Consolação! Roteiro curto era pegar qualquer ônibus, saltar no largo do Arouche e subir uma das ruas até a Consolação. Excitada pela floresta de luzes-mistérios-sombras, vida noturna, prédios e cavernas. Armário: jeans rasgado no joelho, meias soquete, tênis e blusão folgado da escola. Em passado não remoto, vestidinho plissado e sapatos de plástico, fez caminho mais curto pelo centro da floresta e encontrara o lobo - irritava-se ao lembrá-lo. Após o lobicídio, final feliz de estória... “e todos foram felizes para sempre”. Bom, lobo era um “Lupus falantis”, espécie em extinção, e a Liga dos Direitos da Fauna falou em jornais sobre “massacre a machadas’, interrogatórios de famoso delegado... lenhador indiciado por homicídio loboso, avó como autora intelectual do crime, a pivô com detestável chapéu vermelho... Desobedecer como ‘destino’... Mudou para short preto curtinho, camiseta estampada com cava grande, sandália de amarrar e maquilagem pesada - pose adulta e ‘sexy’! No ônibus, um provável líder de garotos, ofereceu companhia, entrada da floresta, pequeno pássaro a espantar, respondeu que “quem gosta de criança é creche”... desaponto e risadas dos companheiros. Queria brincar de mulher, emoções mais fortes. No Arouche, balançou os quadris, muita gente, a semana de trabalho terminara. Parou numa vitrine de perfumaria, ainda não centro da floresta, apenas pequenos animais - coelhos, quatis, ratinhos-do-campo. Avançou e em outra rua a iluminação era mais fraca, lojas com portas de ferro baixadas; adiante, luzes brancas dos bares, vermelhas e azuis de boates e cabarés. Coração bateu mais forte, homens assobiando para ela. Casa de espetáculo anunciava “striptease, lindas garotas, sexo ao vivo”. Aflição e curiosidade. Mulher já velha, sonolenta, vendia os ingressos. Um dos homens, rosto de pele avermelhada, babosa fuinha nojenta, sarnenta, dentes escuros, aproximou-se, mão no bolso, ela trocou de calçada. Parou com os remelejos, escondida nas sombras, como sendo a caça, mudando de rumo ao final do quarteirão e diminuiu a marcha. Observou distraída duas mulheres ‘caçadoras’ com vestidos chamativos e um furtivo ratinho roubou-lhe a bolsa; tentou fugir, mas a mulher fumante, verdadeiro rosto e idade sob camada de tinta e peruca, esticou a perna, o garoto caiu, recolheu a bolsa e perguntou se a garota, tomada como primeira vez nas ruas, era “nova ali” - fininho de voz: “Tô só passando.” Naquele ponto, elas não queriam mais ninguém. Sentiu-se menina muito pequena, dependendo da mãe, a mulher à sua frente; agradeceu, afastou-se sem olhar para trás: mulheres raposas... Parou de tremer. Mas a estória exigia um lobo. Mais cem passos, rua da Consolação! Fora de si e sem condições de raciocinar, como hipnotizada, entrou num bar - tamborete alto, pediu refrigerante e canudinho. Um homem apresentou-se, nome Lobo, de novo se ela era “nova no pedaço”... Bonito, rosto redondo, bem barbeado, cabelos lisos penteados, brilhantes pelo uso de fixador. Sempre ali, a espera de garota nova. Numa espécie de tontura, disse ter somente 13 anos. Começou o ritual: olhos grandes, a garota completava, “para ver melhor, narizinho lindo, “para sentir o perfume”, orelhas encantadoras, “para escutar melhor”, pernas........ Pareceu acordar de repente, jogou uma nota sobre o balcão; ele vira o remédio na bolsa aberta e ofereceu ficar com ele para arrumar algo mais forte. Encanto quebrado de uma aventura fascinante e misteriosa. Correu pela ladeira em fuga ao lobo malvado de olhar gelado e chegou à rua desejada. Não deveria ter falado com o lobo que a devoraria, comeria sua carne e deixaria os restos para animais menores. Sem parar de andar, prendeu o cabelo com fivela e grampos e pelo tato achou lenço de papel para tirar maquilagem e enxugar lágrimas. Sentiu saudades da jeans, do tênis, do blusão folgado. Escutou atrás de si passos pesados, masculinos, o apartamento da avó perto, entrou no prédio e tocou a campainha. “- Ói, vó! Vim trazer o seu remédio!” Avó logo na bronca: “ - E isso lá é traje?” Avó já fechando a porta, porém garras impediram e a empurraram para dentro - era o lobo, rude e ameaçador mandando calar o boca ou a trancaria no armário. Corpo assustado e frágil, tombou sentada numa poltrona; a neta parecia congelada, os ouvidos se recusando a escutar a fala do homem. Sorriso do lobo se apagou ao ver ali e reconhecer Seu Machado, antigo lenhador, atual investigador, grande revólver que subiu e desceu sobre o lábio do lobo, espirrando sangue. “ - Tu vai por bem, proxeneta?” Lobo se encolheu: “Não me bate ou eu conto tudo na delegacia.” “Delegacia? Teu caso é mais além.” Deu-lhe um soco e levou para o carro da policia. “ - Tu vai virar presunto.” Avó e neta não entenderam muito bem e avó foi fazer um chá - Magali voltou para casa de táxi. Nunca mais elas viram nem o Lobo nem Machado. A estória continua. São Paulo, imensa floresta...”

FONTES:

“Mônica, a de vestidinho vermelho”, HQ de MAURICIO DE SOUSA - sem identificação --- “História mal contada”, conto de CDA - SP, jornal FOLHA DE SÃO PAULO, 24/5/79. --- “Sete faces do conto de fadas”, vários autores, SP, Editora Moderna, 1993.

F I M

Rubemar Alves
Enviado por Rubemar Alves em 30/07/2017
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