871-DIVERSIDADE ÉTNICA NA LITERATURA BRASILEIRA

Inicialmente quero agradecer aos dirigentes de VIVA BRASIL o convite para preferir esta palavra cujo tema e’

A DIVERSIDADE ÉTNICA NA LITERATURA BRASILEIRA

ETNIA é um termo de origem grega cujo significado é POVO. Etnia é utilizado para denominar um determinado grupo de indivíduos que possuam afinidades de idioma e cultura, independente do país em que vivam.

Falar da diversidade étnica na literatura brasileira, é, antes de mais nada, prestar uma homenagem e um agradecimento a todos o grupos de povos que participaram e participam na formação de nossa cultura, e, portanto, de nossa literatura.

A Literatura Brasileira constitui-se, como a literatura de todos os países das Américas, de verdadeira composição e adaptação de idiomas, já que no Novo Mundo aportaram gentes de todas as latitudes e longitudes de nosso planeta, com as mais variadas linguagens.

Os primeiros colonizadores e comerciantes portugueses que chegavam à Terra de Santa Cruz, na necessidade de estabelecerem contado com os povos indígenas, para o comércio e para o estabelecimento de povoados e vilas, tiveram de aprender e assimilar inúmeros vocábulos e expressões da língua geral usada pelos gentios, que era o TUPI-GUARANI.

Dessa necessidade surgiu uma língua rudimentar , conhecida hoje como “LINGUA BRASÍLICA”. Era uma língua de contato entre os índios de diferentes tribos e portugueses e seus descendentes.

O uso dessa língua rudimentar se intensificou de tal forma que passou a ser falada por quase toda a população que integrava o sistema colonial brasileiro. A partir da segunda metade do século XVII - anos de 1650 em diante - passou a ser chamada de LINGUA GERAL.

Essa resultante de uma verdadeira associação de etnias foi a primeira influência que a língua portuguesa recebeu no Brasil e que deixou marcas no vocabulário popular falado atualmente no nosso país.

Os padres jesuítas, aos quais a catequese católica havia sido incumbida, foram os primeiros a manifestarem interesse metódico pela linguagem tupi-guarani, que não tinha escrita.

Padre Anchieta, recentemente canonizado Santo pela Igreja Católica, foi o primeiro a organizar um registro da língua tupi, com o livro intitulado ARTE DE GRAMÁTICA DA LINGUA MAIS USADA NA COSTA DO BRASIL. Foi a primeira gramática contendo os fundamentos da língua tupi.

Em seguida, os africanos chegaram como escravos e pela diversidade de tribos das quais se originavam, enriqueceram de maneira especial a língua oficial.

As Invasões de holandeses em Pernambuco e Franceses no Rio de Janeiro deixaram sua contribuição, ainda que pequena, mas digna de registros.

As grandes levas de imigrantes italianos nos últimos decênios do século dezenove, para suprir a mão de obra dos escravos libertos, acrescentaram diversas variantes na expressão da língua portuguesa falada no Brasil.

Em números absolutos, os italianos formaram a maior corrente imigratória no Brasil. Desse modo, foi natural a grande interferência da língua italiana na transformação da língua portuguesa no Brasil.

Japoneses e espanhóis vieram a seguir, bem como os levantinos: povos do Mediterrâneo oriental, como gregos, turcos, sírios e libaneses. Todos, cada qual a seu tempo e por todo o Brasil, trouxeram sua bagagem cultural, seus idiomas, que permearam a nossa linguagem, influenciando sem menor dúvida, a literatura brasileira.

Os imigrantes eram pessoas que chegavam ao Brasil por vontade própria, cheios de esperança por uma nova vida, por uma oportunidade de FAZER A AMÉRICA, de vencer e enriquecer.

Os africanos, ao contrário dos imigrantes, foram arrancadas de seus lares, de suas famílias e de suas tribos no interior da África, para servirem aos grandes proprietários de terras ou aos insaciáveis donos dos garimpos insalubres.

Todos que chegavam traziam a herança cultural – costumes, línguas, religiões e tradições — as quais constituíram, ao longo do tempo, elementos de formação que, mescladas à cultura brasileira teve como conseqüência grande influência em nossa literatura.

A influência das diversas etnias na literatura brasileira inicia-se, então, pelo uso, na linguagem, de termos oriundos de outros idiomas, adaptados ou não.

Vejamos em primeiro lugar o que usamos da herança idiomática do tupi-guaraní.

— Palavras para expressar nomes de pessoas, como Cecí, Peri,Iracema, Igaiara.

— Topônimos ou nomes de lugares: Pernambuco, Ceará, Maracanã, Pindamonhangaba, Tupanciretã. Piracicaba, Piraju

— Frutas silvestres: Jaboticaba, Goiaba, Araçá, Urucum.

— Peixes: lambari, pirarucu, cará, obarana.

— Comidas – Pamonha – Palmito – Inhame

— Animais – Jararaca, Arapuà, Arara, Jaguatirica, Capivara.

— Arvores: Aroeira, Jacarandá e o nome de nosso país, Brasil, que significa pau-vermelho.

E assim, milhares de palavras e expressões do tupi-guaraní estão hoje inseridas no nosso vocabulário de língua portuguesa falada no Brasil.

Dos escravos africanos, alguns dos quais eram chefes de tribos e “imperadores” em suas terras de origem, temos também um vasto vocabulário, cujas palavras de significado religioso são as mais conhecidas e usadas, porque deles herdamos também uma importante cultura de fé e de práticas religiosas.

Vejamos alguns: Candomblé, Iemanjá, Exu, Oxalá, Xangô, congada,

Estamos falando de vocábulos isolados mas que serão usados nas obras literárias – poemas, cartas, crônicas, relatórios, histórias, novelas e romances - de escritores brasileiros ou mesmo estrangeiros quando tratam da literatura brasileira.

Das línguas de Espanha e da Itália temos, inseridos na nossa literatura, milhares e milhares de palavras e expressões, que enriquecem a língua portuguesa falada no Brasil.

E para cada grupo étnico, para cada região, para cada situação, criam-se novos vocábulos — a princípio gírias ou corruptelas que passam a ser de uso comum e inseridas na linguagem normal.

É a primeira etapa de um processo de reconhecimento oficial, quando os novos termos ou expressões são chamados de REGIONALISMOS.

No Nordeste há uma verdadeira linguagem regional, e cada estado se orgulha de ter suas expressões particulares.

A literatura de Cordel, expressão literária típica do nordeste brasileiro, é legítima disseminadora dos regionalismos.

Eis alguns versos do cordel O LINGUAJAR DO CEARÁ de autoria de Carlinhos Cordel:

Dentro da nossa linguagem / Tem o nosso CEARÊS Agora nesse cordel / Falarei só pra vocês Como o cearense fala / Um bonito português.

No ORÉLIO CEARENSE / Por favor, preste atenção Pois ele vai te ensinar / Boa e velha lição A língua do Ceará / Venha comigo, irmão.

De início vou mostrar / O verbo ABUFELAR Que é agarrar com força. / ABAICAR ou ARROCHAR Tem mais significado / Pode ser também brigar.

GASTURA aqui é enjôo / O mesmo que mal-estar Correr se diz DAR NO PÉ / NEGAR FOGO é brochar Ter desejo sexual / Aqui se chama VIÇAR.

E finaliza de modo bem contemporâneo:

Uma bebida, um drinque / Se chama de BIRINAITE

Coisa que não se sabe o nome / É chamada BREGUENAITE

Se você quer saber mais / Faça pesquisa num SITE.

Em Minas, já no tempo da ‘corrida do ouro” , da mineração intensiva, apareceu uma linguagem característica, própria dos mineiros, que hoje se consagra sob o nome de “mineirês”.

O gaúcho é um tipo étnico oriundo de indígenas guaranis e espanhóis e é um termo que se aplicava originariamente aos habitantes dos campos do sul do continente – os pampas - que se generalizou a todos os naturais do Rio Grande do Sul, do Interior do Uruguai e parte da Argentina.

Os gaúchos do Rio Grande do Sul são orgulhosos das danças, dos costumes, do folclore e de seu linguajar bastante típico, que inclusive dão novos ou diferentes significados para termos da língua portuguesa. Por exemplo: faixa é estrada asfaltada, erva é o chimarrão, china é meretriz, e por aí vai...

Está sendo exibido na TV Globo a novela “Meu pedacinho de chão” , do consagrado escritor de novelas de Televisão Benedito Rui Barbosa. Trata-se de uma história simples, quase um fábula, desenrolada numa vila de Santa Fé, de ambiente evidentemente riograndense. Todos os personagens, com poucas exceções, falam com diversos sotaques regionais: o forte linguajar do gaúcho, o caipira de Minas, o italiano e até mesmo o arrevesado falar de um padre da Finlândia, cada qual contribuindo com sua etnia na mistura de sotaques.

Étnicamente, é uma amostra da presença das diferenças étnicas em nossa lingua portuguesa falada no Brasil.

Nos vales, serras e cidades de Santa Catarina, os termos advindos e adaptados da língua alemã são comuns, principalmente para as deliciosas comidas e as bebidas: chucrute, chope, malzbier, etc.

Esta riqueza da linguagem aparece primeiro no coloquial, para depois ser usada na música popular, nos ritos religiosos, nas trovas e improvisos, e só mais tarde será incluída na literatura escrita.

Os literatos, poetas ou prosadores brasileiros , começaram dar atenção à riqueza da diversidade étnica na linguagem, na primeira metade do século passado.

Olavo Bilac, ao mesmo tempo que exaltava a língua portuguesa em poema “A Última Flor do Lácio”,assim dizia do idioma falado entre o povo:

“A Pátria não é raça, não é o meio, não é o conjunto dos aparelhos econômicos e políticos. A Pátria é o idioma criado ou herdado pelo povo”.

Graciliano Ramos e Jorge Amado foram autores nordestinos que buscaram na diversidade do linguajar popular elementos para enriquecer seus textos.

Monteiro Lobato criou o antológico Jeca Tatu em 1915, personagem típico do interior paulista, com linguagem exclusiva e fiel ao caipira. Foi uma peça de propaganda de remédios, como se dizia dos medicamentos, mas o tipo criado era tão bem estruturado, e a história, tão bem engendrada, que o JECA passou a ser o símbolo do homem do interior, com suas mazelas, analfabetismo e doenças.

Mais tarde, nas décadas de 1950 e 1960, o Jeca Tatu foi levado para o cinema, com o artista Mazaropi, que conservou a fidelidade do caipirês do Jeca, ou seja, do interior de São Paulo, principalmente da área do vale do Rio Paraiba. .

Lobato usou com propriedade, todos os recursos proporcionados pela diversidade étnica para fazer sua literatura, principalmente a literatura infantil do Sitio do Pica-pau Amarelo.

O Capirês de Minas Gerais, tal qual se fala no presente, está muito bem registrado no livro do jornalista Teixeira de Carvalho, chamado “Bravuras e Bravatas de Um Caipira”.

O AUTOR teve a gentileza de enviar, por meu intermédio, exemplar para a biblioteca de “Viva Brasil”, Vale a pena ler, pois a trama é envolvente e cheia de lances de humor.

Hoje, na música regional, nas comédias de teatro e cinema e TV, nos monólogos e principalmente na contação de “causos”, a linguagem capiria está presente com grande impacto.

O uso de recursos proporcionados aos escritores modernos, pelas muitos termos, palavras, expressões advindas da variada influência étnica de tantas origens, colaboram para o enriquecimento e leveza do texto.

O processo de incorporação de termos, palavras e expressões que chegam à língua portuguesa através dos elementos étnicos passa por diversas etapas.

Em primeiro lugar é a adaptação do português, através da oralidade, do falar popular. As pessoas começam a usar novas palavras, falando da forma que ouvem, e então ocorre alterações.

Há palavras que nem passam por esse processo e são ajuntadas pura e simplesmente ao idioma, como, por exemplo, PIZZA, a deliciosa iguaria napolitana, que é grafada e pronunciada tal qual os italianos falam em sua terra. Ou a palavra francesa REVANCHE, significativa de desforra, muito usada na linguagem esportiva.

Afirmam alguns estudiosos que a expressão o UAI muito usada pelos mineiros, vem da palavra inglesa WELL, usada constantemente pelos engenheiros e funcionários ingleses que foram trabalhar nas minas de ouro em Sabará e Diamantina, em Minas, exploradas por mineradoras inglesas. .

Em seguida à oralidade vem a escrita. Os escritores usam nos diálogos do personagens, na forma dita como coloquial.

OS dicionários passam então a registrar o termo como regionalismo e assim a palavra está definitivamente incorporada ao nosso idioma.

Autores existem que escrevem exclusivamente sobre outros povos, outras etnias, como é o caso de Malba Tahan (pesudônimo do professor carioca Julio Cesar de Melo e Souza) com seus contos e novelas de cunho estritamente orientais, que traduzem e introduzem na língua portuguesa elementos novos ou oficializando o uso de termos árabes, como quibe, xeique, ou esfirra.

Desta forma, as diferentes etnias dos habitantes do Brasil proporcionam uma diversidade não só da língua portuguesa tal qual se fala no Brasil hoje em dia, como também adentra na literatura, enriquecendo a forma e ampliando as possibilidades de expressão de nosso idioma, tornando-o cada vez MAIS EXPRESSIVO, MAIS PRECISO E MAIS BONITO.

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Antes de colocar um ponto final nesta curta palestra desejo expressar minha admiração e dar meus cumprimentos efusivos a todas as pessoas que estão envolvidas no VIVA BRASIL – pela objetividade da atividade proposta, que é a de manter vivo o interesse pelo nosso idioma, o moderno português tal qual se fala no Brasil hoje em dia. Tarefa digna dos maiores elogios, pois que resulta também no fortalecimento das relações entre brasileiros e norte-americanos, enriquecendo a nossa amizade de povos irmanados num desejo de democracia com prosperidade e paz para o toda a humanidade, qualquer que seja a A LINGUA OU IDIOMA DE CADA POVO OU CADA NAÇÃO.

- Agradecimentos extensivos A Sra Ciléia Miranda, pela cessão deste espaço a para a realização deste encontro.

-Passo á VIVA BRASIL alguns volumes da COLEÇÃO MILISTORIAS para sua biblioteca.

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Palestra (em português): "A Diversidade Étnica na Língua Portuguesa", por Antônio Roque Gobbo

Local: Belas Artes, 1854 Russel Boulevard, St. Louis, MO 63104

Horário: 6:00-8:00pm

ENTRADA FRANCA________________________________________

Texto criado em abril/2014, PL 1135 – para palestra proferida na entidade VIVA BRASIL, em St. Louis, em 16.maio.2014.

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 07/09/2015
Código do texto: T5373651
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