Só por hoje - Capítulo 1

História originalmente postada por mim no site wattpad.

user: https://www.wattpad.com/user/AnneGOliver

Não deixe de comentar o que achou. Faz bem para a alma do escritor. <3

Insanidade. É tudo o que me dizem quando repito pela décima vez os meus planos. Sair de São Paulo para ir morar no Rio de Janeiro, sozinha é insano. Agora, o motivo pelo qual eu estou fazendo isso é que está deixando meus pais de cabelo em pé. Trocar de faculdade de engenharia no sexto período seria mais fácil se o curso que eu escolhesse fosse medicina ou algo de nível muito elevado, não artes visuais. Mas insano mesmo, é ter que decidir parte da sua vida aos 17 anos, sem uma prévia do que vai ser, como será, se eu vou gostar do que vou fazer, será que é realmente isso que eu quero pra minha vida? Ninguém sabe o que quer da vida aos 17. Mal sabia as roupas que deveria usar, quanto mais meu futuro! Não foi fácil, agora com 20 anos, quase na metade da faculdade, decido o que realmente quero. Ninguém entende nem nunca vai entender porque eu fiz isso. Mas só quem sabe que está fazendo algo que não é destinado a fazer, por pura pressão dos pais e família, vai saber do que estou falando. Desde sempre minha vida foi dedicada a arte, desde sempre consumi cada gota que podia de conhecimento. Me dedicava, fazia projetos lindos e amava desenhar e pintar. Meu lado criativo sempre falou por mim, mas infelizmente não decidia o que eu queria e quando eu finalmente me matriculei em engenharia, percebi o quão burra foi dar ouvidos a quem não pode falar por mim. Ter crescido em uma família de engenheiros complicou bastante as coisas pro meu lado. Mas finalmente percebi! Percebi que só quem pode me fazer feliz são minhas escolhas e engenharia não foi uma delas. Quando anunciei minha mudança de curso, eu e meus pais estávamos jantando. Assim que eu falei que iria sair da faculdade, os talheres da minha mãe caíram no prato e meu pai se engasgou com o suco. Fiquei paralisada enquanto os dois me olhavam esperando que eu terminasse o que eu comecei. Gaguejando e falando baixo, disse que tinha passado para artes visuais no Rio de Janeiro. E foi nessa hora que minha mãe finge ou realmente teve um desmaio curto. Depois disso, todos os dias foram os mesmos, brigas atrás de brigas, conversas atrás de conversas e birras atrás de birras. Nada do que eles me dissessem iria parar o que eu comecei. O pior já passou...

“Alie... Você tem certeza disso?” minha mãe pergunta atrás de mim enquanto eu guardo as minhas roupas para viajar amanhã.

“Óbvio que eu tenho certeza mãe. Chega de me perguntar isso todos os dias. Já está feito! Sei que nossa família, a maior parte são de engenheiros, mas eu não faço parte disso. Não é o que eu amo e você sabe disso.” Digo exasperada e cansada de ter que repetir isso todos os dias até que ela finalmente entenda.

“Eu sei, mas...” ela olha pra baixo segurando o choro “Você estava tão feliz quando entrou no curso, o que houve? E... você sabe, como vai ganhar dinheiro com artes?” ela pergunta desesperada.

Reviro os olhos, realmente não tenho mais energias pra me explicar.

“Mãe... por favor.” Suspiro. “Tá bom.” Ela diz quase inaudível e sai do quarto.

Meu pai ainda não veio falar uma palavra comigo desde que anunciei que estava indo pro Rio, talvez minha mãe esteja se esforçando tanto para eu ficar só por causa dele. Sei que para ele seria importante me ver formada em engenharia, mas eles tem que entender que os sonhos deles já foram realizados, agora preciso realizar os meus. Deito na cama exausta dos dias que tive, estou há uma semana nesse inferno astral e já não aguento mais. Olho para minha estante e vejo meu primeiro projeto real de artes de quando eu tinha sete anos. É o chapéu seletor de Harry Potter. A professora pediu que fizéssemos algo com argila do qual gostávamos muito. A maioria dos meus amigos da época tentaram fazer os pais, os cachorros e objetos estranhos. Eu escolhi o chapéu seletor porque como toda criança que amava Harry Potter, queria ir para Hogwarts e fazer parte da grifinória. Sonhava com o dia em que aquele chapéu se tornasse real e me escolhesse para a minha casa favorita. Obviamente, nunca aconteceu. Me levanto e pego meu chapéu de argila, todo torto e meio feio, mas que na época achei perfeito. Todos elogiaram, até meus pais. Acho que por isso ele é a minha coisa favorita nesse mundo. Não consigo expressar a satisfação de ter feito algo na época tão perfeito, onde coloquei todo meu sentimento de amor e dedicação. Fiquei um dia inteiro tentando acertar os detalhes do chapéu. Recebi dez por ele. Acho que foi ali que eu soube o que eu queria fazer da vida para sempre. Colocar meus sentimentos em algo que me representa e me faz sentir viva e livre para fazer o que eu quiser. Decido levar meu chapéu como um amuleto de boa sorte. O embrulho com jornal e coloco dentro de uma caixa de papelão e vou dormir, esperando ansiosamente o primeiro dia da minha vida chegar.

No outro dia, estava de pé as 5:30. Tinha que chegar ao aeroporto as 6:20 para não me atrasar. Após choros e mais alguns apelos para ficar, enfim chega meu voo. Olho pro meu pai, que desde então só fica quieto, e ele pega minha cabeça entre as mãos e diz.

“Você sabe que seguir no ramo da família era algo muito importante para mim, não é?” assento com a cabeça concordando. “Pensei muito na sua decisão ao longo desses dias...” “Pai...” interrompo e ele continua “E sei o quanto isso é importante para você. Soube disso quando abri a pasta de desenhos que venho colecionando desde a sua primeira pintura. Aquela que tinha eu e você e o lanny no parque, lembra?” meu pai sorri e eu também ao lembrar do nosso antigo cachorro que faleceu. Só tive lenny como animal de estimação. Depois de sua morte, nunca mais quis ter esse vinculo de amor com qualquer animal que fosse. Foi a pior dor que senti. “Quando vi aquele primeiro desenho, tão bonitinho para uma criança de 4 anos, soube que esse era seu caminho. Então se você está feliz, eu também estou.” Ele para e eu me sinto completamente aliviada por saber que ele concorda comigo. Tudo que digo é um obrigado travado no meio da garganta para não chorar e sou interrompida pela chamada do voo. Minha mãe ainda está triste, mas ela tem que se acostumar. Pego minhas malas e sou encaminhada pelo portão de embarque. Abraço Sr.e Sra Alcântara e parto para a maior decisão da minha vida.

Anne G Oliver
Enviado por Anne G Oliver em 17/09/2016
Código do texto: T5764196
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.