Melhor que Clark Gable

Pivor. Não tinha jeito, o primo Zenrique assim falava e ir ao dicionário ninguém se animava. E pivor ficava. Era o trabalho dentário que ele fora procurar em Pitangui, vindo lá de São José da Varginha. E olha que tinha o Pará de Minas ali bem mais pirtim, uma boa parentela lá espalhada. As amenidades de uma cidade plana, bem organizadinha, com três cinemas, moça bonita em quase toda janela, e o Zenrique viera pra Pitangui.

Mas era a acolhida que parecia fazer a diferença. Na casa de vovó, que abrigava ainda quatro tias solteironas e um tio bem dom ruão, o Zenrique tinha o carinho das tias, principalmente de Tirrita que, além dum doce de pessoa, tinha a pachorra de arrumar o quarto só pra ele, com roupa de cama imaculada, o despertador, a baciinha esmaltada e o jarro d´água pra abluções matinais. E ainda de lambuja, folgava o guarda-roupa só pra ele dependurar as suas mudas de roupa, que vinha na maleta marrom, com capa de brim cáqui pra evitar a poeirada da estrada...

E adolescente, de idade regulando com a mana primogênita Vitória, Zenrique já usava calça comprida, relógio de pulso, um Lanco de 21 rubis, e um bigodinho com jeito de que dele iria fazer outro Clark Gable...

E, embora sem o recurso do telefone, sempre chegavam a ele os recadinhos de moças da vizinhança, irriquietas com a presença daquele mocinho falador e inventivo.

Do pivor, o Doutor Ubaldo ia cuidar. E pensando bem, melhor que Clark Gable até, que usava dentadura...Ou seria tudo intriga da Scarlett O´Hara, que não tinha um pingo de vergonha na cara?

Paulo Miranda
Enviado por Paulo Miranda em 24/01/2017
Reeditado em 24/01/2017
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