DESritmado,DESentoado e DEScoordenado

DESritmado,DESentoado e DEScordenado.

Uma coisa que invejo nas escolas das crianças de hoje. Prática de coordenação motora. Não tive. Quando muito, aprendi a preencher as linhas pontilhadas do caderno de caligrafia, onde copiava as letras, aprendendo assim a escrevê-las. Só isso. Daí vem minha dificuldade em fazer movimentos com os pés ou as mãos, alternados e uniformes, com ou sem cadência, assim como com a voz. Quero dizer: sou desritmado, desentoado e descordenado.

Da minha geração muitas pessoas são viciados em games, jogos eletrônicos e afins. Alguns até jogam muito bem. Eu não. Não acerto um. O de futebol nem pensar. Aqueles que dá golpes ou tiros, pior ainda. Tinha umas teclas, que eram setas, (para guiar a direção), numeral zero, (que era a ação), eu só teclava trocado ou atrasado. Aí criaram o “joystick”, pensei que ia facilitar minha vida, tinha que mexer pra cima, pra baixo, pro lado, era demais pra mim. Errava todos. Induzi e incentivei meu garoto no estudo da computação e logo ele se familiarizou com os jogos, aí não acompanhei. Tem um joguinho que todos conhecem, e não é eletrônico não, é o “Totó”. Pois bem, perco todas as partidas. Giro para o lado errado e faço gol contra.A bola vem de um lado, coloco o goleiro no outro. Não tem jeito.

Aos quarenta anos, resolvi mudar de vida. Deixei de fumar. Fiz “check up” completo. Comecei a usar tênis, calça jeans, usar óculos escuro, tudo que eu não gostava, e fui fazer ginástica aeróbica, incentivado por um compadre meu. Que beleza, dirão os menos avisados. O tênis, a calça jeans e os óculos, tudo bem. O problema foi na tal ginástica aeróbica. Tínhamos um professor de educação física, jovem, entusiasmado e o nosso grupo era todo na faixa dos quarenta. Ele então disse vamos começar com “baixo impacto”. Pensei comigo: baixo deve ser para iniciante, e era justamente o que eu queria. Topei. Primeiros movimentos: pique no lugar, tirei de letra. Seguia ele: braço direito pra cima, braço esquerdo. Com um pouco de lentidão, prestando atenção nos outros, conseguia acompanhar. Quando ele disse: braço direito, perna esquerda. Braço esquerdo, perna direita. Aí era querer demais. Por mais que eu me esforçasse, errava toda sequência. Olhava para os outros e via que não estava na mesma coordenação, mas não desisti. O ruim mesmo foi quando começamos a nos movimentar para a direita e para esquerda, ou para frente e para trás. Choquei-me logo com uma moça que estava a minha frente. Tudo indica, pela minha experiência com movimentos, que o errado era eu, mas disfarcei, me desculpei e sorri. Agora, quando tive que dar um passo pra esquerda e girar, encontrei-me com uma coluna e quase fui a nocaute. Passados alguns meses, não vi resultados, a não ser os músculos doloridos, desisti.

Alguém me falou que era melhor fazer hidroginástica, pois os músculos sofriam menos. Me inscrevi e já na primeira aula quase morro afogado. Explico: começamos caminhando na piscina. O comando era: vá e volte. Mais ligeiro, mais ligeiro. Tudo bem. Depois começou, levanta a perna direita. Levanta a perna esquerda. Perna direita, braço esquerdo. Braço direito, perna esquerda. Devagarzinho, concentrado, fui bem. Quando ela disse: acelera. Errei. Levantei as duas pernas com a água nos ombros. Comecei a fazer uns movimentos que não constava da aula: bater atabalhoadamente os braços tentando emergir do fundo da piscina. Ainda tentei um mês, porque já tinha pago, mas desisti também.

Agora imaginem eu dançando. Não digo nem agarradinho. Solto mesmo. Aquelas coreografias baianas, ou aqueles passos de samba? Frevo nem se fala. Só danço agarrado com a minha mulher, porque ela já sabe que vou para o lado errado e me acompanha, quando não piso no pé dela. Até parabéns com palmas eu me atrapalho. Saio do ritmo. Rock? Nem me atrevo. Na igreja tem alguns cânticos que se acompanha com palmas. Para não atrapalhar fico com as mãos postas. As pessoas pensam que estou rezando.

Cantar é um desastre. Tenho um amigo que toca violão muito bem e vez ou outra fazíamos, digo, ele fazia uma seresta com a gente. Quando ele chegava já dizia: tu faz só o laiá, laiá. Porque eu trocava a letra. Tipo uma música de Roberto Carlos, eu cantava assim: Olho no céu e vejo uma “multidão” que vai caminhando. Olho na terra e vejo uma “nuvem branca” que vai passando. Então me proibiram de cantar. Mas eu fiquei triste mesmo foi quando ele disse, na frente de todo mundo: Massilon, TEM GENTE QUE EU ACOMPANHO. TEM GENTE QUE EU PERSIGO, MAS TU SÓ CAÇANDO.

Nunca mais fui para uma seresta dele.

Massilon Gomes
Enviado por Massilon Gomes em 13/02/2017
Reeditado em 13/02/2017
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