JACI E A NOITE

Tudo estava pronto pra para a peça. Criança e adultos esperando. As cortinas se abrem. Então a voz do narrado soa, era grave como um trovão e em um instante cortou as conversas paralelas.

- Há muito tempo, antes dos pais dos seus pais estarem aqui - começou ele - antes mesmo dos animais que hoje vivem aqui aparecerem, existiam criaturas enormes e mortais. Antes mesmo de existir reinos e reis, servos e senhores, antes da lua - concluiu no momento que soa as primeiras notas de uma flauta.

- O sol reinava - entra uma grande bola amarela - reinava e protegia todas as criaturas do perigo da noite. E aqui onde vocês estão, nestas mesmas montanhas existia uma tribo.

Com leveza nos dedos do titereiro os bonecos deslizaram entrando em cena. Três deles, um homem alto, uma mulher e uma menina, toda com a pele avermelhada e rostos pintados.

- Plantavam, colhiam, caçavam, dançavam e cantavam perante a proteção do sol. Mas até mesmo o rei dos astros se cansava, e caia em sono ao fim do dia. E é ai senhora e senhores que o Rei noite dominava - neste momento aparecia um boneco que representava um homem, ele não possuía um rosto e era coberto de panos negros.

As crianças menores se assustavam e apertavam o braço de suas mães. Era possível ouvir alguns choramingo.

- E com ele vinha seus servos - aumentando a voz o narrador - seres das sombras, seres que vagam em buscam de almas. Mas a tribo conheciam os perigos da noite. Por isso se escondiam em suas casas, após o sol dormir. – Os bonecos correndo para uma pequena cabana no canto do palco simulava a entrada da família na cabana.

- Mas num belo dia, uma linda menina que brincava no rio esqueceu a regra mais importante, aquela que não se deve esquecer. E quando as sombras levantaram, ela ainda estava nas margens - então surge uma sombra, algumas crianças escondiam os rostos e outras gritavam para que a menina fugisse.

- Olá criança - disse uma voz mais estridente e assustadora - parece que está perdida.

- Ela percebendo o seu erro, correu para dentro da mata de volta para sua tribo de volta para casa, mas a sombra a seguiu. - disse o narrador. A mão do titereiro dançava fazia o boneco da menina e a sombra balançarem rapidamente. E quando a sombra estava quase alcançando a menina.

- Buuum !! - Ecoou um tambor. E o boneco do pai da menina apareceu, segurando uma lança, pronto para a briga. Os dois bonecos se embolaram ao som dos tambores e de suspiros do público.

- Seu homem lutou e lutou, e depois de uma noite de luta derrotou o mostro- o mostro cai com um grito agudo, esperando o barulho do publico diminuir, continuou - mas foi muito ferido - falou diminuído o ritmo da narração - e não resistiu - o boneco caiu, e um choro da menina foi simulado enquanto alguns verdadeiros eram ouvidos na plateia.

- A tribo ficou de luto, mas sabiam dos perigos da noite, sabiam que não podiam lutar contra isso. Enterraram o corpo e seguiram a vida. Mas não a sua filha. - Ao som dos tambores acelerados o narrador aumentou o ritmo e a voz. - Ela decidiu que mudariam as coisas, que sua tribo não temeria mais a noite.

– O tempo passou, ela cresceu, aprendeu a usar o arco e a lança aprendeu sobre as criaturas, aprendeu sobre a noite. Então um dia resolveu que era a hora, despediu-se de sua mãe e dos seus irmãos, recebeu a pintura de guerra do chefe da tribo e a benção do Pajé. E escolheu seu nome, como fazem as crianças que passam da infância e vão para a vida adulta - fez uma pausa para que a expectativa aumenta-se – Agora seu nome era Jaci.

- Sabia que para que a senhor da noite não mais atacar o seus, deveria trazer a luz. Foi atrás do fogo que nunca se apaga, o fogo que estaria lá iluminando quando o sol fosse dormir. Só existia um lugar onde poderia achar está chama – neste momento a música muda, se torna mais agressiva.

- Seguiu mata adentro, atravessou rios, percorreu caminhos que ninguém antes percorrera, até que viu ao longe, enormes chamas vermelhas, maiores que as arvores. Podia sentir o calor de longe, o que a fez suar e sua mão tremer, mas Jaci precisava confrontá-lo, segurou com força o cabo do arco e se caminhou até ele - Neste momento entra em cena uma cobra laranja com fitas vermelhas e amarelas simulando fogo.

- Quem é que incomoda meu descanso? - aumentou à voz o narrador e as crianças saltaram - se busca a morte encontrou.

- Preciso de seu fogo para proteger minha família - Agora uma mulher criava a voz de Jaci, era firme e forte.

- Perdeu a sanidade no caminho criança, posso devorá-la sem esforço. - ameaçou a serpente.

- Me desculpe mais eu preciso de seu fogo, eu preciso para livrar meu povo das criaturas da noite.

- Meu fogo é para proteger as criaturas da floresta.

- Mas não somos nos também filhos da flores, nascemos e crescemos amando estas terras.

- Então a serpente abriu sua boca - retomou a historia o narrador - e centenas de olhos fitaram Jaci, Ela se sentiu mais desprotegida do que jamais esteve. -E uma ultima vez a voz grave falou – Vejo em você bom coração, as sombras da noite arrancaram uma parte de você como fazem com os seres da floresta. Pegue uma parte de mim e siga sua missão. - A música subiu. Tambores e cordas tocavam enquanto a cobra passa uma vela com seu fogo. Então o ritmo mudou novamente, tambores marcavam a macha, enquanto o cenário mudava atrás o boneco cambaleante. Mudou de florestas para o rio depois paras as montanhas.

- Jaci chegou numa montanha, não uma montanha qualquer a mais alta delas, tão alta que tocava as nuvens, escalou, subiu e subiu. E o tempo passou, a noite chegou. Então... - a música parou. Uma sombra surgiu no palco, era à sombra do homem sem rosto.

- O rei da noite - um grito na plateia antecipou o narrador.

- Sim o rei da noite- concordou ele - veio desafiar Jaci. Partiu a para cima dela, com uma lança negra. - A música subiu, e o narrador teve que aumentar o volume da voz - Jaci tirou o arco e com movimentos leves e rápidos disparou varias flechas contra o inimigo. Uma delas acertou o peito do mostro. Mas o rei na noite era poderoso, impiedoso e cruel, continuou a estocada e os dois lutaram, lutaram por toda noite. Jaci era forte. Lutou com bravura. Feriu-o com sua lança varia vezes, e ele a feriu em um dos seus olhos, mas ela continuou tinha coragem, tinha motivos para lutar, mas era Humana e o Rei um demônio.

Mas no fim - O Boneco de Jaci ajoelhou e começou a tombar devagar - Jaci sucumbiu a força do oponente - neste momento som da multidão era confuso, tinha choros e lamentações, também havia gritos de incentivo e motivação para a protagonistas. O narrador esperou as vozes se acalmarem, e começou novamente, num volume mais baixo quase cochichando - Então com as forças que ainda restava Jaci ela pegou o fogo, com as mãos. Ignorando a dor levantou e partiu pra cima do Rei, e antes que ele percebesse a mão de Jaci estava em seu peito – Silencio. Toda a plateia segurava a respiração.

- AAAAAAAAAA!!!- um grito alto e estridente, o grito se misturou com o grita de animação do publico.

- Porém... - O narrador cortando a euforia do público - Jaci estava bastante ferida, não conseguiu cumprir sua missão, perdera o fogo e não teria forças para voltar, sentou-se numa pedra e observou o sol surgir no horizonte, seus olhos fecharam devagar. - E mais uma vez silencio. O silencio continuou enquanto o circulo laranja subia devagar no palco. Os olhos do público estavam vidrados.

A flauta começou algumas notas suaves.

- O sol viu o final da jornada de Jaci. Ele se compadeceu dela, tirou uma parte de si. Soprou sua essência em seu rosto, fogo vivo.

As cordas balançaram suavemente, o corpo pouco a pouco se levantava. E o som voltava ao ambiente, sons de alivio.

- Jaci - disse uma voz ao fundo do palco, grave, mas suave, era a voz do Sol.

- Quem é você? - perguntou Jaci

- Eu sou o sol, protejo você e seu povo dos terrores da noite, mas não pude proteger você.

- Então como estou viva?

- Eu vi sua coragem, sua vontade de proteger os seus. Então dei parte da minha essência a você. Não poderá retornar a terra, mas poderá proteger os humanos quando eu não puder.

- Jaci compreendeu - Retorna o narrador - sabia que seu local agora era os seus, que não estaria ao lado de seus irmãos, mas que assim poderia cuidar deles e das futuras gerações para sempre.

- Assim Jaci decide morar no céu. Para sempre observando o mundo com seu olho gigantesco - fez uma pausa - mas assim como o sol descansa todas as noites, ela também deve descansar. Seu olho se fecha à medida que o cansaço a domina, até que se feche por completo - A imagem da Lua que havia aparecido no céu estrelado do palco mudava de forma conforme o narrador prosseguia, até sumir e o palco ficar negro.

- E é ai senhoras e senhores que os servos da noite voltam, e as famílias se escondem como fazem a séculos. – Finalizou o narrador

Aplausos e gritos ecoam da multidão. Todos os bonecos voltam ao palco para fazer uma reverência ao público, às cortinas se fecham. E público se levanta, e parte de volta para casa. Pois o sol já estava indo descansar e Jaci não os protegeria hoje, a noite era sem luar.

Filipe Cruz
Enviado por Filipe Cruz em 14/01/2017
Reeditado em 14/01/2017
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