Morrer e ainda sofrer

“Pelo menos parou de sofrer”, dizem as pessoas a fim de se conformarem com a morte de uma pessoa que já vinha padecendo muitos tormentos físicos. De fato, toda a dor física que pudessem sentir cessa no instante da morte – tenha vida depois dela ou não tenha. Admitindo que haja uma continuidade naquilo que podemos chamar de “mundo espiritual”, será que podemos estar certos de que ela representa o fim também dos padecimentos da nossa consciência?

Se tudo se resumir a “céu” e “inferno”, uma parcela da população, de fato, não irá sentir qualquer espécie de dor ao se encontrar no paraíso, incluindo, portanto, as dores “psicológicas”. Como que por encanto, todas aquelas questões de consciência que tanto nos afligiram (e também aos outros) durante a nossa vidinha terrena terão sumido. Bem, esta é uma crença.

Mais comum às tradições espiritualistas (das quais o espiritismo é apenas uma das vertentes) é a idéia de que, do lado de lá, você irá continuar o desenvolvimento que começou aqui, inclusive do mesmo ponto em que parou. Nesse sentido, uma pessoa que passou a vida perturbada por problemas psicológicos iria continuar sofrendo por conta deles do lado de lá.

Não haveria um “descanse em paz” e, provavelmente, caso se dessem conta de que não escapariam do seu sofrimento mesmo com a morte, essas pessoas iriam experimentar o mais profundo e inconsolável desespero. Não pediram para viver, mas viveram, e no tempo em que estiveram aqui mais sofreram do que qualquer outra coisa. Ao chegar do lado de lá, eles continuariam a viver uma vida que não pediram, sofrendo todas as dores advindas dessa mesma vida tão insuportável aos seus olhos, a qual lhes foi dada – cúmulo do desespero – por toda a eternidade.

Assim sendo, não haveria outra saída senão evoluir, mesmo que não se julgassem capazes ou decidissem se rebelar – nada escaparia da inexorável lei da evolução, implacável nesse sentido. Por não contarem mais com o corpo físico, essas almas perturbadas não teriam também o benefício das distrações com que nós tentamos, quando vivos, fugir dos nossos problemas: eles seriam unicamente a sua consciência e teriam que pensar, o tempo inteiro, nas perturbações do seu espírito.

É um cenário terrível e, no entanto, existe uma possibilidade de que seja realmente assim. Morrer e continuar sofrendo por uma vida que não pediu.

Frederico Milkau
Enviado por Frederico Milkau em 18/10/2017
Reeditado em 18/10/2017
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