COMENTÁRIO EVOCATIVO

O ROSTO

Espelhos

roubam um pedaço do futuro.

E se há muitos na casa,

num dia se perde um ano,

se perde uma década,

se perde um cinquentenário.

Elias Borges de Campos

Enviado por Elias Borges de Campos em 31/10/2016

Código do texto: T5808300

Classificação de conteúdo: seguro

No rasto de “O Rosto” vou devagar como a lesma, tentando deixar marcas da leitura. Copiei para o programa de texto, programando-me para ter um programa lúdico literário, deixando-me levar pela inspiração da leitura.

Gosto da brevidade, ela tem em si condições inatas para nos dar de forma breve um todo. O que tenho de encontrar está ali, de forma concentrada.

«Espelhos» fixo este primeiro verso, deixo-me penetrar pela poesia, compenetro-me da sua essência e procuro dizer… «Espelhos». A palavra espalha-se, ganha sonoridade. De seguida leio a meia dúzia de versos, neles identificando dois parágrafos. O primeiro é uma afirmação que me leva a questionar “Como é que os espelhos roubam o futuro?”, procuro a resposta no segundo parágrafo. Percebo a importância do tempo, sem saber bem o que consigo perceber, apesar de pensar estar a pesar bem as palavras lidas.

Lidar com as palavras não é uma coisa simples ou linear, principalmente quando elas nos são dadas a ler formando versos. Tenho para mim que há na poesia um desejo de sonho, mesmo se o poeta nunca perdeu tempo a pensar sobre o que deseja quando escreve seus versos. Este é um pouco um desejo meu que encontro melhor quando, como leitor, me confronto com a tentação de ter, de me deter, a tentar encontrar esse desejo que julgo esteja no poema.

A ideia de um sonho poder ser evasão e devaneio não se aplica a todos os sonhos, não me parece ser o caso neste caso.

Leio “O Rosto” como se ele se desse a ler de forma rigorosa e exata, tudo está no que nos é dito, dado a ler. O poeta escreveu como quem olha naquele momento, imagino tenha feito de si mesmo um autorretrato, tratando o assunto (o rosto) de forma poética. Com exatidão, como se tivesse feito uma ata, deixando em palavras o resultado de uma reunião onde dissertou para si mesmo sobre os espelhos olhando ou imaginando “O Rosto”.

Penso que este poema é um momento cheio de magia, o que me leva a procurar uma conclusão diferente da primeira premissa de ler o poema expressão dum sonho ou desejo. O poeta é um alquimista em busca da Pedra Filosofal, o que conseguiu fazer foi dar-nos um elixir.

Enquanto olha o seu rosto o poeta tenta deixar o rasto desse momento, apodera-se da imagem no espelho, escreve a experiência da vida desse momento, nesse momento mói a expressão escrita deixando-nos olhá-la e lê-la tentando atingir o intangível das palavras: tocar o que nos toca.

Para que serve um poema? Longa vida ao poeta!...

Decidi que só comentaria autores que permitem a cópia dos seus textos mas, ao mesmo tempo, desinteressei-me de continuar a publicar. Aproveito para fazer um comentário evocativo desta experiência que foi ler e escrever neste Recanto das Letras, deixando um grande abraço a todos os amigos e amigas que aqui conheci. A todos que continuam a ser o presente deste espaço desejo o maior futuro, o que é válido para todos os que vêm já do seu passado. A_braços!!

Deixo poema que hoje escrevi no dia que já foi, dele deixando data, de ontem.

FORMA VIVA

A MÚSICA DO SENTIDO

à hora em que posso viver o esquecimento

em que se pode transformar a escrita

acordo o poeta capaz de se inventar

no silêncio de uma entrega à arte

de provocar o sentimento no sentir

do momento de sentir o esquecimento

de tudo que me preocupa e é agora nada

rodam os dias da semana e param

fim-de-semana onde nada se passa

a não ser a ilusão de criar em mim

toda a realidade onde o mito imita

a vida que emite do fim da história

até à glória do pensamento forjado

para a explicação de tudo o que há

há hora em que podendo o esquecimento

dá um podengo farejando (a) caça

sem me cansar de caçar o alimento

com o qual se alimenta esta procura

do que não tem cura nem nunca terá

do que não tem remédio nem nunca terá

do que não tendo cura é saudável pertença

o instinto inextinto do caçador regressa

na mão do poeta está o seu desejo

de moldar o silêncio em música

imaginando as palavras que escreve

ao procurar a voz da qual se faz

intérprete da língua mãe onde bebemos

do que não tendo cura é saudável pertença

onde sou o som que ecoa do significado

das palavras em si mesmas vivas

de uma forma viva mesmo quando

indefinida finta o vazio para o lembrar

do poder de ser preenchido da matéria

onde os sonhos se realizam à medida

daquilo que é possível viver deste modo

onde soa o silêncio que fica depois

de uma palavra se dar a ler no seio

de tudo o que nos alimenta ao usar

por instinto o extinto poder de ser

o caçador à caça de tudo cuja presença

vem no faro como um aroma raro

da flor onde floresce a origem do fruto

onde o pensamento é uma onda

a sondar o sólido magma da matéria

incandescente no núcleo que se move

como sem fim de um cordão umbilical

capaz de nos ligar das palavras aos sons

sempre que as lemos em silêncio

tentando acordar a música do sentido

11.08.2017

Francisco Coimbra
Enviado por Francisco Coimbra em 12/08/2017
Reeditado em 12/08/2017
Código do texto: T6081288
Classificação de conteúdo: seguro