IDOLATRIA DO CAPITAL

Walter Benjamin escreveu em "O capitalismo como Religião" que o sistema capitalista é a religião cujo deus é o dinheiro. Marx já havia apontado em escritos como "O Capital" que tal sistema converte o próprio trabalhador em mercadoria, e autores da Escola de Frankfurt, como Adorno, Horkheimer e Herbert Marcuse sublinharam o fato de que no capitalismo itens do mundo da vida são transformados em bens de consumo. Agora, Papa Francisco, em "Evangelli Gaudium" vem nos lembrar do óbvio: o caminho da espiritualidade exige que nos libertemos do egoísmo e do apego, e que neguemos idolatrar ao dinheiro como deus e ao consumo como ética. Francisco exorta a rompermos com a idolatria do capital:

"Uma das causas desta situação está na relação estabelecida com o dinheiro, porque aceitamos pacificamente o seu domínio sobre nós e as nossas sociedades. A crise financeira que atravessamos faz-nos esquecer que, na sua origem, há uma crise antropológica profunda: a negação da primazia do ser humano. Criámos novos ídolos. A adoração do antigo bezerro de ouro (cf. Ex 32, 1-35) encontrou uma nova e cruel versão no fetichismo do dinheiro e na ditadura duma economia sem rosto e sem um objectivo verdadeiramente humano. A crise mundial, que investe as finanças e a economia, põe a descoberto os seus próprios desequilíbrios e sobretudo a grave carência duma orientação antropológica que reduz o ser humano apenas a uma das suas necessidades: o consumo.

Enquanto os lucros de poucos crescem exponencialmente, os da maioria situam-se cada vez mais longe do bem-estar daquela minoria feliz. Tal desequilíbrio provém de ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira. Por isso, negam o direito de controle dos Estados, encarregados de velar pela tutela do bem comum. Instaura-se uma nova tirania invisível, às vezes virtual, que impõe, de forma unilateral e implacável, as suas leis e as suas regras. Além disso, a dívida e os respectivos juros afastam os países das possibilidades viáveis da sua economia, e os cidadãos do seu real poder de compra. A tudo isto vem juntar-se uma corrupção ramificada e uma evasão fiscal egoísta, que assumiram dimensões mundiais. A ambição do poder e do ter não conhece limites. Neste sistema que tende a fagocitar tudo para aumentar os benefícios, qualquer realidade que seja frágil, como o meio ambiente, fica indefesa face aos interesses do mercado divinizado, transformados em regra absoluta".

Mokiti Okada ensinou, no século XX, que o homem religioso não precisa de um voto de pobreza para seguir as sendas do espírito. Ora, entre não fazer um voto de pobreza e adotar uma irresponsável teologia da prosperidade há uma enorme diferença. O homem deve ser próspero, mas a prosperidade não pode ser fruto de um modelo econômico fundamentado na degradação do meio ambiente, no uso industrial intensivo e extensivo de toxinas, na exploração hobbesiana do homem pelo homem. Mokiti Okada nos convida a eliminar e egoísmo e o apego, e a renascer, para enfim, possibilitar a efetivação de um mundo justo, bom e belo.

Evangelli Gaudium

https://w2.vatican.va/content/francesco/pt/apost_exhortations/documents/papa-francesco_esortazione-ap_20131124_evangelii-gaudium.html#N%C3%A3o_a_uma_economia_da_exclus%C3%A3o