NA CONTRAMÃO DOS ESTIGMAS, RÓTULOS E BANALIZAÇÕES

Em época de humanidade desumanizada é comum a rotulação e a estgmatização, principalmente daqueles que fogem dos estereótipos criados pela cultura em que vivemos.O ser humano, principalmente os de grande riqueza espiritual (é importante frisar a todos aqueles que maliciosamente negligenciam a singularidade de cada indivíduo), é aquele que escapa de qualquer definição estritamente totalizante e fechada, definição que não contribui em nada para compreender a complexidade do ser de cada um.

Pois, infelizmente, estamos sujeitos ao discurso vazio que impera nos dias de hoje, um discurso que prefere apenas fechar os horizontes de compreensão de um tal indivíduo ao invés de vir junto deste, a fim de compreender as dimensões de sua existência e o significado que ele dá à sua própria vida. Ninguém é capaz de dizer corretamente sobre o que se passa na vida de outra pessoa se não for tiver o privilégio de ficar a par de sua história de vida e de suas experiências significadas e res-significadas a todo o momento.

Escutar a dor íntima de outrem é o que poucos sabem fazer. Ouvir uma pessoa com sabedoria, compreensão e humanidade é uma arte um tanto complicada. Escutar os conflitos de um ser humano sempre requer paciência e uma significativa pré-ocupação por uma existência que está sempre num processo de vir a ser; uma existência que é, portanto, indefinível a princípio, até o instante em que passa a ser ouvida por aquele que está engajado em compreender um vasto mundo (porém tão inacessível àqueles que são incapazes de dar abertura ao discurso do outro!)

Para falar com sinceridade, poucos mesmo são os que pro-curam fazer uma compreensão cuidadosa do seu semelhante; muitos por aí, acostumados a julgarem com acusações de todos tipos, e de forma um tanto desenfreada, a vida do seu ''próximo'', preferem diminui-lo com rotulações e distorções de todos os tipos, a fim de rebaixar a sua imagem a um nível degradante.É essa, de fato, a vida levada adiante por muitos homens numa cultura onde se privilegia o sucesso a qualquer preço sob a ''lógica'' da competição nos mais diversos setores sociais.

Escapar dos falatórios desumanizantes que perambulam na sociedade, só se ficarmos distantes de tudo e de todos; é inevitável haver em nosso caminho pessoas que se incomodam com nossa presença; mas e o que dizer daqueles que rotulam imediatamente o seu semelhante, formando um juízo precipitado e sem fundamento, apenas por um divertimento barato? Há pessoas que são tão pobres de espírito que a única gratificação que tiram na vida delas é denegrir a imagem de outras aos olhos de todos, não sossegam enquanto não sujarem a imagem de quem as ignoram (muitas vezes basta ser quieto e se manter distante dos falatórios dos demais para suscitar a ira dessas pessoas, acostumadas sempre a fazer fofocas e comentários maldosos...)

A deslealdade e a desonestidade com o outro, deixado imerso no esquecimento e no abandono, sempre insiste em se manter nos mais diversos núcleos sociais; todavia, aquele que escolhe atentar para o discurso que sai da boca de outrem, ao invés de desmentir a verdade deste com julgamentos precipitados, consegue descobrir as ilusões e a falta de sentido em se deixar levar pelo discurso vigente, um discurso produzido cinicamente pela mídia e pela agências de publicidade, pois estes meios de divulgação em massa só o que fazem é precipitar os homens para o abismo de uma gama de mentiras, de rótulos incoerentes, e de banalizações absurdas (...) Sim, demasiadamente absurdas! Tão absurdas que muitos nem sequer param para refletir a respeito dos valores que estão sendo construídos apenas para propagarem divisões e discriminações entre as pessoas. Nesse macro-cosmo social, vendedor de mentiras e estigmatizações, não há como os microcosmos, como os ambientes de trabalho e as rodas de amigos, não ficarem afetados, tão afetados que apenas reproduzem uma quantidade grande de valores deturpados e ideologias suspeitas! 

Como o ser humano não dá para ficar fechado num discurso, um discurso que negligencia a singularidade de cada um, temos o direito de reclamar de tamanha insensatez, desfazendo as mentiras que pretendem nos fazer acreditar que somos aquilo que querem que sejamos, mas não aquilo que somos e que nos caracteriza como tal.Estamos, cada um de nós, sempre abertos para sermos de uma outra maneira, vivendo num processo de mudança constante, um fluir perpétuo onde nenhuma rotulação é capaz de nos enclausurar e de nos estatificar dentro de um sistema enrijecido de pensamento calculador.

A vida não é fixa como uma estátua; ao contrário, está sempre deslizando desde a sua nascente até um desaguadouro incerto. Por essa razão, é que para compreendermos um outro ente necessita de algo mais do que um falatório vazio. Necessita, em vez disso, da habilidade do cuidado, da escuta descompromissada e da abertura, a fim de que o discurso pronunciado, repleto de significados, se revele tal como se mostra diante daquele que foi confiado os segredos mais íntimos e importantes.

Alessandro Nogueira
Enviado por Alessandro Nogueira em 04/03/2017
Reeditado em 04/03/2017
Código do texto: T5930724
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