AS RELAÇÕES HUMANAS

Nas relações humanas o que impera, no momento em que vivemos, é a competição predatória, uma realidade sem dúvida impulsionada pela lógica de mercado em que estamos presos; a falta de sinceridade, estabelecida por uma ideologia desumana e inflexível, mais a dificuldade de comunicação nos mais diversos setores sociais, onde o que se prioriza é ser sempre ''o-melhor-em-tudo'', só evidencia o fracasso e a fragilidade humana em manter, por um tempo permanente, as laços, ora de amizade, ora conjugais, ora familiares de um modo geral.

Mesmo assim, com toda essa mentira que muitos ilusoriamente nutrem por aí,ou seja, de acreditarem que são ''superiores'' aos seus semelhantes somente pelo fato de ocuparem uma posição mais elevada socialmente do que outrem ou, o que é pior, por terem o poder nas mãos e assim determinar o destino dos que estão abaixo da hierarquia social, o ser humano, paradoxalmente, continua fracassando no consecução de seus objetivos pelo mundo, ameaçando toda e qualquer harmonia que possa fortalecer com serenidade as relações humanas.

Nesse cenário de competição predatória, é exigido muito de todos, havendo uma crença cega de que é possível haver alguém que possa ser perfeito no que faz; mas no fim das contas todos acabam sendo derrotados na busca exagerada da perfeição, no qual os indivíduos mais eficientes injustamente impõem para si mesmos uma auto cobrança capaz de leva-los as neuroses e as demais doenças da alma.

A lógica predatória de nossa sociedade chega a ser tão perversa que inúmeras pessoas sentem necessidade de se afirmar frente aos demais somente para encobrir, de todas as formas, a sua imperfeição e as suas carência, demonstrando atitudes imbuídas de cobiça e maldade.

E o que dizer daqueles que iluminam o mundo com sua luz? São logo vítimas daqueles que gostariam, bem no fundo do coração, de serem iguais a eles, mas não conseguindo realizar tamanha façanha, se arriscam em destruir o objeto de sua admiração, tudo isso em razão de um desejo de estarem numa condição de ''superioridade'', quando na verdade só o que conseguem é revelar a sua extrema fragilidade aos demais, denunciando com suas expressões carregadas, uma inveja capaz de destilar seu veneno por onde quer que esteja.

Quando os vícios da alma se mostram dessa forma, impossível que não haja estrago nas relações humanas, ainda que haja uma tentativa exagerada de encobri-la com uma imagem estranha à sua natureza, seja lá o que for que isso queira dizer! Com isso, esquecemos de notar que o não-reconhecimento da própria imperfeição é a imperfeição e o crime mais grave que o indivíduo comete e infligi contra si mesmo!

As relações humanas, as mais verdadeiras e duradouras, obviamente falando, só acontecem quando estão para além de qualquer jogo de interesse; nelas a competição não tem vez, quanto mais qualquer estupidez de preciosismo que venha a reinar em seu meio ou, mesmo, qualquer tentativa de subir às custas do fracasso dos outros que buscam obter seu alcançar seu espaço na sociedade!

As relações permeadas de sinceridade, cuidado e autenticidade são, portanto, as mais saudáveis para a nossa constituição psíquica e espiritual, até porque são as que tem maior grau de simplicidade e humildade, a tal ponto que os horizontes do ser são ampliados quando o outro passa a ocupar um outro lugar, menos como objeto de controle-manipulação-interesse, e mais como um fim em si mesmo (a sua constituição psíquica e a sua integridade passam a ter um valor em si); dessa maneira, através de uma alternativa de vida que desvaloriza o nosso condicionamento a uma lógica desumana, criadora de valores para lá de suspeitos, que é possível o surgimento do diálogo desinteressado e, consequentemente, também a possibilidade da harmonia e da paz nas relações, dessa vez verdadeiramente singelas e humanas...

Do contrário, quando a inveja triunfa e o orgulho triunfam no coração dos homens, as tribulações e o desrespeito por si mesmo e aos outros irão prevalecer; o caos da falsidade e da falta de dignidade serão a ordem do dia; e um estado de natureza anárquico, tal como foi exposto por Hobbes em sua obra máxima, o Leviatã, continuarão a se manifestar tal vemos nos dias de hoje, onde quase tudo parece ter se congelado, inclusive o calor das mais nobres paixões!

O mais incrível de tudo isso é que o poder que muitos homens tem nas mãos se transforma numa arma poderosíssima, a fim de dominarem e controlarem a vida de outrem; sem dúvida, é um desejo que muitos nutrem por aí. Para falar com sinceridade, ser o dono de outras vidas povoam o sonho até daqueles que estão abaixo da hierarquia social; porém, não conseguindo realizar suas ambições malsãs, escolhem, como estilo de vida, encher a paciência de seus ''superiores'' com a repugnante arte de bajular, pois quem sabe a partir daí conseguem subir na hierarquia social e se tornarem tão carrascos quanto ou até pior, a depender de seu ódio represado.

Dê possibilidade de ascensão para alguns homens e verá o estrago que irão fazer onde quer que passam e caminhem. Só escapam dessa lógica aqueles que fizeram de sua vida não uma ferramenta egoísta de dominação, a fim de se sentirem numa posição mais favorável do que outros, mas um cântaro cheio de amor capaz de auxiliar o seu semelhante no desenvolvimento de suas potencialidades; e ao iluminarem a vida daqueles que precisam de seu socorro, conseguem ampliar os horizontes inimagináveis daqueles que carecem de afeto somente pela arte da palavra, que é sem dúvida um instrumento com chance de libertar, em vez de aprisionar! Pessoas com disposição para o amor e a caridade são raras; mas sua coragem sempre é suficiente para destruir muros imponentes enquanto são desafiados por gigantes no ápice de sua prepotência...

Se as relações humanas estão deturpadas por um aparato social deprimente e desumano; se nada mais faz sentido nesse caos social afundado pela discórdia e pela estupidez; se a liberdade dos entes, no caso a dos seres humanos, se reduziram ao ''fazer o que bem entender''; então cabe a cada um de nós buscar um outro caminho, trilhando dessa vez não uma avenida com tamanho espaço de largura (tão perseguida por uma massa de pessoas em estado de dormência espiritual), mas uma senda estreita que possa nos levar ao desvelamento da sabedoria e da paz interior e, também, a um processo de fortalecimento da espiritualidade. Com efeito, proporcionar integridade junto daqueles que verdadeiramente amamos e criar uma bela comunhão de entes que buscam um maior fortalecimento nas relações humanas através de uma con-vivência ética (onde a co-existencia seja pacífica e de solidariedade), é uma oportunidade única para nos aproximarmos do amor de Deus, pois é dele, e unicamente dele, que tudo aquilo que se perdeu nas ruínas da corrupção da simples verdade, pode ser resgatado; e também trazido à luz da solidariedade e da honestidade (somente quando os homens forem munidos dessas virtudes é que conseguirão disseminar a concórdia e a paz nas suas relações interpessoais).

Alessandro Nogueira
Enviado por Alessandro Nogueira em 03/02/2017
Código do texto: T5901354
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