A PETECA DO MINEIRO NÃO CAI NUNCA!

O jeitinho do mineiro fazer as coisas!

A década era de sessenta. O dia? Segunda Feira.

O dentista era seu Adamastor. Dentista prático, que nunca havia estado em uma faculdade o que era comum na época na pequena cidade de pouco mais de cinco mil habitantes. O que fazia era acudir a população que sofria com as dores provocadas pelas grandes bifurcações dentárias que acometia maioria da população. A família de seu Adamastor quase toda exercia atividades voltadas para a carência da População. Nenhum dos filhos de Rafael Polidônio, seu pai, havia estudado para exercer suas atividades, porém atuavam como pós graduados em qualquer das áreas. Como seu Adamastor, Amaury, seu irmão, o segundo filho de Rafael Polidônio conciliava os perrengues da cidade com maestria, além de fazer cobranças e separações como ninguém. O que o padre, pároco da cidade, casou em cinquenta anos Amaury separou em questão de meses. Abnel tocava todos os instrumentos possíveis e imagináveis, chegando até a montar uma banda, naqueles idos 1950, sem falar nas aulas que ministrava fazendo a maioria da população músicos renomados, alguns tocam até hoje.

Seu Adamastor acordou naquela segunda feira muito animado pronto para exercer sua atividade o que fazia com muito amor. Na sala de espera de seu consultório havia apenas uma pessoa que esperava ansioso. O local de atendimento era um dos quartos de sua residência que ele havia preparado com todos os instrumentos necessários ao exercício da profissão. Ali ele podia executar desde o mais simples tratamento até extrações dentárias que já “nesta altura do campeonato” , deixava metade da população desdentada. Tudo que os pacientes necessitavam era cessar a dor o que ele fazia com extrema habilidade. Chamou então o paciente e o colocou sentado na cadeira própria para o atendimento. Nestor ao sentar-se já se posicionou com a boca aberta indicando o prémolar do lado direito que se apresentava com o nervo exposto justificando a dor que o mesmo sentia e o tremendo inchaço que o mantinha com os olhos fechados. -Tá “osso” disse seu Adamastor vamos fazer um pequeno curativo e fechar este “Rombo”. Com o barulho infernal de uma broca minúscula retirou a parte danificada do dente e inseriu ali um líquido com cheiro de álcool misturado com anestésico e recomendou “não feche a boca “ vamos aguardar alguns segundos para o curativo fazer efeito.

Deixou Nestor sentado na cadeira e foi na cozinha que era há dois passos do local. - Maria quer algo da venda? Perguntou seu Adamastor a sua esposa.

-Sim traga um litro de óleo para o almoço.

Seu Adamastor olha com o rabo do olho ao passar pela porta do quartinho onde se localizava o consultório e avista seu Nestor também com o olho esquerdo fechado além do outro obstruído pelo inchaço. Pé ante pé alcança a porta de saída e noutro passo entra no boteco do senhor Samuel, seu vizinho de mais de cinquenta anos. Pede no balcão: - me veja o de sempre! Seu Samuel lhe atende e como de costume lhe serve a aguardente guardada em tonel de madeira, daqueles utilizados nos alambiques da região. Seu Adamastor fica a jogar conversa fora mais de meia hora, sem nem atentar pelo fato do senhor Nestor sentado na sua cadeira de dentista com a boca aberta. Nunca mais se lembrou. A hora do do preparativo do almoço se aproxima, olhando para o litro de banha ele se lembra do pedido de Maria. Se despede do vizinho e se encaminha para casa e ao passar pela porta do quartinho enxerga seu Nestor ainda com a boca aberta o que o faz recordar que estava no meio de um atendimento .“Meu Deus” me esqueci completamente da dor de dente do seu Nestor. Chega de mansinho exclama para o seu Nestor: Só mais um minuto e está pronto!

Quarenta e dois minutos exatamente durou a boca aberta do seu Nestor. Até hoje ele não sabe que foi esquecido na cadeira.

Mineiro é assim. A peteca não cai nunca!

Mariana Quintanilha
Enviado por Mariana Quintanilha em 22/09/2017
Reeditado em 27/09/2017
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