SE O MEU FUSCA FALASSE.

Natal de 1976. Eu tinha comprado um Fusca, daqueles bem antigos, acho que o ano de fabricação era 1.968. O meu primeiro carro. A cor azul calcinha. Meus dois filhos, André e Adriano eram pequenos, e havia um espaço entre o banco traseiro e o motor do carro onde eles se alojavam para ver os carros que vinham atrás.

A minha pequena loja de cosméticos ficava na região central do Mercado Municipal de Taubaté, e ali aos poucos fomos fazendo a nossa vida.

As vendas de Natal tinham sido boas, e os meninos ganharam o presente que pediram, porém eles foram deixados embaixo da árvore de Natal que ficava na casa dos meus pais.

Minha mãe e o meu pai adoravam o Natal, e presenteavam todos os netos com presentes simples, mas que com certeza vinha do fundo do coração. Minha irmã Cleuza preparava os doces, porém a comida; o frango, a leitoa, o peru, o arroz a grega, era a minha mãe que fazia.

Os presentes eram todos deixados embaixo da árvore e meu pai ia chamando os netos e a minha mãe também, um por um, depois nós dávamos o presente também para os nossos filhos, e também para os nossos pais.

O que tem o Fusca Azul calcinha a ver com tudo isso. Já explico.

Morávamos em um bairro distante da casa dos meus genitores, tinha fechado a loja um pouco tarde para aproveitar o máximo os clientes da festa natalina.

Mandei lavar e lubrificar o famoso Fusca, e ele estava lindo. Não tinha nenhum amassado, mandei fazer a funilaria, e troquei algumas peças do motor. Meu amigo se pudesse falar, com certeza agradeceria tanto cuidado.

Andava no meu veículo a motor, como se andasse em um avião a jato, um Boeing ultramoderno, tinha orgulho daquele carrinho.

Cheguei a casa, e a esposa e os meninos já prontos para ir para a casa dos meus pais, estavam ansiosos, para receberem os presentes. Eu cansado, porém, admirava a alegria que minha mãe sentia em receber todos os netos, noras e os filhos naquele dia.

Tudo pronto, pé na tábua. Lá vamos nós cortando toda a cidade, em nosso veloz Fusca Azul, entrei pela marginal a Dutra, Avenida Dom Pedro, uma subida, uma descida, outra subida, outra descida.

Já estávamos próximos a hoje onde fica o Supermercado Shibata, quando olhei para o meu relógio Mirvane, que naquela época, não sei agora, era um excelente relógio.

Faltavam 10 minutos para a meia noite, e o meu pai e minha mãe tinha o costume de entregar todos os presentes antes do jantar natalino. Pisei fundo no acelerador, o ponteiro do velocímetro disparou.

--- Claiton... Vai mais devagar o carro está a 100 por hora, e ele é velho não vai agüentar. – disse a esposa preocupada.

--- pai corre mais, quero o meu presente. – disse André o mais velho.

--- eu também quero o meu. – retrucou o Adriano.

Todos receberiam seus presentes, eu tinha certeza disso.

Acelerei um pouco mais, e fui trocar de marcha. Meu Deus. O cambio saiu em minha mão, e nós estávamos sem velocidade descendo o último morro para chegar à avenida desembargador, que naquela época era ainda com o rio não canalizado.

Com o cambio na mão, perplexo, diante dos meus olhos, dos olhos da esposa, porém vendo a felicidade dos filhos que gritavam.

--- agora sim pai vai chegar logo.

Pobres meninos, não percebiam que estávamos à deriva, prontos a chocarmos com algum carro, ou transeunte que resolve passar por nossa frente.

Num lampejo de incredulidade, peguei o cambio e forcei junto ao encaixe, não seu se foi pela engenharia alemã, o por Deus, o mesmo se encaixou como se fosse um procedimento corriqueiro para aquele veículo, diminui a marcha, de quarta, para terceira, de terceira, para segunda, e fomos seguindo agora, já menos trêmulo até a porta da casa dos meus pais.

A rua estava iluminada, meus sobrinhos brincavam em frente à casa dos meus pais. Eu tinha contratado um Papai Noel, e havia pedido para que chegasse exatamente a meia noite, chegamos praticamente juntos.

Eu no meu possante Fusca Azul, agora sem o cambio na mão. O Pai Noel, em um carro preto, antigo, acha que um Studebker. Foi um alvoroço, uma gritaria, os adultos também saíram para a rua, era uma surpresa que eu fazia. Minha mãe mesmo sabendo do que eu tinha feito, ficou com os olhos cheios de lágrimas. As crianças alvoroçadas, e eu feliz, muito feliz, de ter um FUSCA, E SE ELE PUDESSE FALAR.

Um natal maravilhoso.

Benção minha mãe. Benção meu pai, Benção Cleuza, com certeza estão no Céu, rindo desta h

SE O MEU FUSCA FALASSE.

Ton Bralca
Enviado por Ton Bralca em 21/06/2017
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