A garota - II
A vida fez com ela coisas estranhas. Não poderia rir, brincar, ser infantil – tudo isso era sinal de bobice.
E quando surgia alguma dúvida, ínfima dúvida, ouvia da mãe “para um bom entendedor meia palavra basta”. Várias vezes ouviu isso e ela nem sabia bem o que isso significava.
Então resolveu não perguntar mais e entendeu que deveria ser adivinha. E teria que adivinhar tudo com certeza e exatidão. Nem pensar em adivinhar errado algumas coisas da vida.
Uma criança que não pode rir, que não aprende a brincar, a jogar, a achar graça das coisas triviais só poderia crescer no recalque, na eterna dúvida cruel da existência.
A vida ia e vinha morna, de outono. A primavera, não, não poderia chegar. Outono sombrio de um tempo que teimava em não passar ligeiro. Arrastavam-se as horas.