POR QUE FOI ELE?

— Por que foi ele, meu Deus?

A Celeste estava inconsolável com a morte do Edyr.

Aliás para nós todos, tinha sido um choque vê-lo um mês antes, brincando e indo para o hospital para uma operação programada. E agora...

Apesar de ter convivido com ele apenas por uns quinze anos e apesar da diferença de idade sentia-o, não como um pai, mas como um irmão. O irmão que nunca tive. Acho que também ele me considerava assim. Nele foi quem me inspirei para começar a compor, já depois de velho, beirando os cinquenta e foi ele quem me incentivou a fazê-lo.

Interessante que apesar disso tínhamos apenas duas músicas em parceria e as duas com letras minhas. Acho que eu é que ficava inibido de interagir com ele. Afinal quem tinha feito Bom dia Belém e outras jóias não era pra ser parceiro de qualquer um.

Assim foi com um certo receio que, durante aquela conversa com a Celeste, tivesse recebido a sugestão de musicar o poema que ela havia feito e publicado após seu falecimento. A responsabilidade era muito grande!

Não quis demonstrar o meu súbito sentimento de incompetência para desincumbir-me da missão e comecei a tentar. Consegui musicar a primeira e a última parte, mas o meio não saía. Chamei então o Gervásio, meu parceiro em muitas outras músicas, também Camelo, também amigo do Edyr como eu e com um conhecimento harmônico bem maior.

Conseguimos, & quatro mãos, musicar o poema. E mostramos à Celeste...

POR QUE?

(Almir Morisson, Gervásio Cavalcante e Celeste Proença)

Por que foi ele?

Por que foi ele o escolhido

Para cantar entre nuvens

A canção da despedida

Quando tudo era afeto,

Esperança e compreensão

Entre amigos leais,

Que tanto o estimavam

Abraçado ao violão

O eterno companheiro

Por que o levaram

Em tarde tão ardente

E o colocaram

A conversar com a brisa

Que o carregou, calada,

Chorando a sua ausência atormentada

Numa despedida triste,

Como um cantochão...

Despediu-se da amada

Em silêncio profundo

Pedindo-lhe um sorriso,

Um olhar dos olhos seus

Então sofreu, calado,

O abraço da saudade

Silenciosamente a escutar

O chamado de Deus...

Algum tempo depois, fizemos um show em homenagem ao Edyr e Pepê, que tinham sido levados de nosso convívio no mesmo ano e usamos uma foto linda dos dois abraçados como que num passeio ao infinito. E o Edyr com um microfone na mão!

Apresentei a música, acompanhado apenas pelo Gervásio no violão. Engasguei de emoção no meio, desafinei e quase que paro, mas depois fui até o fim. Deu pra consertar depois na edição da gravação que fizemos durante o show. Terminado o show estávamos tão emocionados que não deu pra falar com ninguém, quanto mais com a Celeste, mas depois quando a encontrei não mais a vi lamentar-se. Alguém disse que o Edyr apareceu a ela em sonho, dizendo que estava bem e pedindo que não chorasse tanto sua ida.

Ouçam como ficou nossa apresentação no teatro Margarida Schivazappa:

http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/74216