Xeque-não-mate

Ainda esperava o ultimato. Valeria a pena depois dos 30? Talvez. Não se agarrava muito à ideia da vitória. Afinal, é cansativo estar anos a fio de destino tentando escapar da própria sorte. Depois dos acontecimentos, havia tanto tempo de solidão e condenação, que acreditava ser esse seu futuro. Não importava mais nada. Estar sozinho, estar vivo, estar morto. E no momento em que se desconectava das memórias, encontrando fundamento para a vida, uma presença em forma de anjo, arcanjo, uma alegria querúbica aparece. Apesar da intensa timidez, e do pitoresco episódio de olhares e de conversa não convergida, no castanho dos olhos enxergava-se a profundeza da alma, a prioridade poética extremamente necessária. Os instintos mais humanos e criativos encontravam a verdadeira negativa: “No, the happiness is NOT a warm gun”. Carregava-se uma faísca de esperança. E assim seguiu. Acreditou-se. Entregou-se. Conectaram-se através da alma. Os perfis encaixavam-se como uma peça polida artesanalmente pelo destino. As personalidades identificavam-se. A música os unia. A atração era um presságio. Vinha a se apresentar e se concretizar algum tempo depois. Os desejos mais simples e íntimos transbordavam através da eletricidade estática de suas peles, onde a energia potencial estava altíssima. A profecia dos sentidos se materializava e se deu oportunidade ao amor, à felicidade. Conheceram os mundos mansos e pacíficos consequentes da entrega. Cultuava-se a forma mais antiga, lógica e substancial de crença: a paixão. A entidade dos mortais amantes. Com tal desfecho, o recurso a favor do rei de si mesmo foi oficialmente imposto e sua absolvição concedida.

Ubirani
Enviado por Ubirani em 20/02/2017
Reeditado em 20/02/2017
Código do texto: T5918655
Classificação de conteúdo: seguro