ILHA MORENA
ILHA MORENA
(Almir Morisson)
Edyr Proença e eu sempre fomos mosqueirenses. Nossas férias de julho, feriados prolongados, sempre que tínhamos tempo íamos para a ilha do Mosqueiro. Pra nós já era como ir ao quintal de casa. Setenta quilômetros de estrada boa e uma ponte de mil e seiscentos metros nos levavam rapidamente àquele paraíso tropical com praias de água doce, mas com ondas enormes às margens da baia do Marajó que não se enxergava a outra margem, de tão largo era o lado de cá da foz do Amazonas.
O nome, estranho para quem não conhecia, remetia, não às moscas, mas sim ao ato de moquear o peixe. Edyr brincava sempre com o outro balneário do Pará, Salinas, quatro vezes mais distante que Mosqueiro e para a qual fez também uma música, belíssima por sinal.
- Isso é pra não dizerem que eu não gosto de Salinas.
Não é verdade! Eu já fui lá duas vezes!
Salinas e Mosqueiro eram como Vasco e Flamengo ou Flamengo e Fluminense nos áureos tempos do Flu ou Remo e Paissandu no Pará.
Como não podia deixar de ser, já tínhamos feito algumas músicas endeusando nosso Éden. Eu tinha duas e o Edyr, que se lembrasse, três, sem contar as poesias da Celeste, sua esposa. Assim era natural que naquele ano do centenário da vila, existente na ilha, tentássemos fazer alguma coisa musical para homenageá-la.
O Proença sempre foi muito bem relacionado e, depois de algumas tentativas mal sucedidas, finalmente conseguiu falar com o prefeito Papudinho - como ele próprio se chamava - para que se gravasse uma fita com músicas alusivas à data. O doutor Hélio Gueiros - assim era o verdadeiro nome do prefeito -, quando soube da proposta, logo acedeu em fazer quinhentas fitas comemorativas com nossas músicas e as poesias da Celeste (na época ainda existia o cassete).
Começaram os preparativos. Contratamos um tecladista, o Lucianinho (Luciano Bastos Junior) e com ele fomos eu, o Edyr e o Gervásio gravar a fita no estúdio de uma rádio que pertencia aos filhos do Proença. Iniciamos pela minha “Ilha Morena”, uma canção com melodia muito bonita. Fizemos um ensaio sem gravar e saiu uma beleza.
- Agora gravando!...
Quem disse que saia igual. Comparando com o ensaio, minha voz agora estava péssima! Repetimos algumas vezes até que conseguimos um resultado aceitável.
Aquilo era inexplicável, pois nunca tive inibição para me apresentar em público. É verdade que não gostava de fazer discursos, mas cantar e dar aulas era comigo mesmo, desde a primeira vez que pisei num palco ou numa sala de aulas. E ali não tinha ninguém estranho. Éramos só nós. Ainda bem que tempos depois consegui uma gravação impecável da Lucinha Bastos, uma das melhores cantoras paraenses. A música merecia.
Quando compus a Ilha Morena estava inspirado. Além da melodia muito bonita, consegui citar, meio que camuflados, o nome de muitas praias e logradouros do lugar com a alusão à criação do nome derivado do moqueio de peixe. Assim é que ficaram entranhados na musica, sem serem explicitamente citadas, ou com apenas com uma alusão conotativa, as praias do Chapéu Virado, do Murubira, da Baia do Sol, do Paraíso, além da Ilha dos Amores que fica na ponta do Farol e dos olhos de boto, sementes abundantes nas praias do lugar.
ILHA MORENA
(Almir Morisson)
És desta praia
A mais linda morena
Teu corpo queimado de sol
Teus cabelos sementes
Na beira brotando
Com a luz da manhã
Vê nos olhos do boto
Rolando na praia
Toda essa língua de espuma
Provando teu corpo
Moreno de areia
És de tantos amores
A ilha mais bela
Seios de pedra surgindo
Das ondas que quebram
No muro que vira
Teu chapéu que protege
A baia do sol
Onde teu caboclo descalço
Moqueia este peixe
Colorindo o teu nome
Num paraíso de rio
Canto ao som da preamar
Mosqueiro,
Hei de sempre te amar
Meu Mosqueiro,
Hei de sempre te amar.
Fui muito feliz quando a Lucinha, acompanhada ao violão pelo seu marido Gerson aceitou meu convite para interpretar a música em um show, mostra de minhas produções artísticas.
Vejam o vídeo que fiz mostrando os encantos de uma das praias do Mosqueiro. A do Marahú, com fundo musical da “Ilha Morena”, cantada pela Lucinha.
https://www.youtube.com/watch?v=j777H_O369k
Escutem também a minha interpretação acompanhado pelo Gervásio Cavalcante ao violão e pelo Luciano Bastos ao teclado:
http://www.recantodasletras.com.br/audios/cancoes/73522
Como o paraense, do mesmo modo que todo o bom brasileiro, tem memória curta, a música caiu no esquecimento...
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