A AGONIA DE UM RIO

Por Gecílio Souza

Do desmando ilegal

O Brasil virou uma usina

Corrupção em alta escala

É a cultura da propina

A nossa carta política

Reduziu-se à gelatina

Rumo ao autoritarismo

A democracia patina

Os direitos sociais

A direita recrimina

Confiscam tais direitos

Reajustam a gasolina

Mas agora vou falar

De minha aldeia, minha cantina

Onde a natureza é líquida

Pura água cristalina

Ao escrever essas linhas

Não contive a adrenalina

O sangue ferve na veia

De quem pensa e raciocina

As águas somem do rio

Lágrimas brotam da retina

O Nordeste ama a terra

A Bahia é nordestina

O medo de ir à luta

Com o baiano não combina

Uma onda conservadora

Invade a América Latina

Envenenando a natureza

E usurpando a medicina

As chuvas torrenciais

Se reduziram à neblina

Maqueiam–se a indigência

Que nos biombos se reclina

Destróem e devastam tudo

Como aves de rapina

Sob a omisão da imprensa

Vão agindo na surdina

Uma empresa japonesa

Gananciosa e suvina

Planta cebola e batata

Cenoura, alho e tangerina

No Oeste da Bahia

Onde o Estado termina

Um grupelho sem escrúpulos

Uma corriola traquina

Uma elite arrogante

Perniciosa e assassina

Matriz da exploração

Que aos explorados incrimina

Sua volúpia pelas águas

Se exasperou na rotina

Os desafetos do rio

Têm dinheiro e carabina

Infiltram-se na política

Que toda a região domina

Delinquentes ambientais

Atiram ao solo a toxina

O oeste baiano ostenta

Uma beleza que fascina

Mas é a riqueza natural

Que aos predadores alucina

Aos ruidos do motor

À sucção da turbina

A sede forja o ambiente

Onde a revolta germina

Morrer sem água é injusto

Viver lutando é uma sina

O explorador se apresenta

Como amigo e gente fina

Mas come em prato de ouro

E os trabalhadores, na latrina

E assim se multiplicam

Os mendigos na esquina

Contra a sanha capitalista

Não se inventou vacina

Só a resistência popular

Para conter essa ruina

Que o latifundio provoca

E maldosamente maquina

Frequentes abaixo-assinados

Que a população assina

A surdez das autoridades

A imprensa patrocina

Prefeito, honre seus votos

Padre, honre sua batina

Delegado, seja homem

Juiz, retire a cortina

Que o impede de enxergar

Essa injustiça desatina

A omissão judiciária

A sociedade abomina

A câmara municipal

Sem prestígio, mal rumina

Lhe falta protagonismo

Não acorda, não se atina

Mas se o povo lhe cobra

Ergue a voz, levanta a crina

Os rios não estão morrendo

De uma morte repentina

O fato é do conhecimento

Do palácio de Ondina

Ao governador, a palavra

Ele decide e não opina

O poder público só age

Depois da carnificina

Quando a justiça é morosa

Se torna cúmplice da chacina

Equivale ao carro velho

Que só funciona a buzina

Faz barulho e polui

Mas não sai da oficina

A impunidade dos grandes

Na revolta social culmina

A paciência se esgotou

Com esta política cretina

Coturnos não subestimem

A valentia da botina

Se a força policial

Do dinheiro é concubina

A comunidade é humilde

Gente simples, não mufina

Sem diplona, porém sábia

A honra é sua lamparina

Rechaça qualquer invasor

Venha do Japão ou da China

A burguesia nacional

Com sua ambição canina

Age como divindade

Numa Sodoma interina

O seu poder destrutivo

É proporcional ao Catrina

Ostensiva ou discreta

Sua investida é paulatina

Avança sobre o cerrado

Com voracidade felina

Grilando as cabeceiras

Com tratores na campina

Os verdadeiros invasores

Carecem de disciplina

Tomara que os baianos

Façam logo uma faxina

Devolvam-lhes aos pampas

São Paulo e Santa Catarina

Gringo invadindo o Nordeste

E aos nordestino discrimina

Veja quanto essa turma

Prejudica e azucrina

A polícia é um braço deles

Aos pobres bate e fulmina

Eles pensam com o bolso

O seu cérebro é de nicotina

Se alimento produzem

Causa câncer e melanina

Matam o cerrado e caem fora

Deixando a tóxica resina

O Oeste da Bahia

Atacado se declina

O sucesso dessas firmas

Não contribui patavina

Produzem para exportar

A outras bocas se destina

Plantam soja, sorgo e milho

Para fazer ração bovina

A relação com os rios

O lucro é quem determina

Devastam e desertificam

E invocam a força divina

Assim o Agro Negócio

Ao cerrado elimina

Grilam a bacia hidrográfica

Constróem canal e piscina

A sua visão de sociedade

É de percepção suina

Tem os olhos para baixo

O seu nariz que se empina

Quadrilha do latifúndio

Maliciosa e ladina

Anti-ética que merece

Um choque de amoralina

Quem apóia esse bando

Na cara tem vaselina

Mas a luta é uma escola

Que caleja e ensina

Muitos assumem a defesa

Da classe rica e “granfina”

A ousadia dessa gente

É pior do que se imagina

O seu culto ao capital

Gera uma guerra intestina

A justiça é toda vesga

Para o seu lado se inclina

Só resta à população

Sentar-lhes a jacobina

É a minha moção de apoio

Ao povo de Correntina

Oiliceg
Enviado por Oiliceg em 12/11/2017
Código do texto: T6169611
Classificação de conteúdo: seguro