Caçada com Rosa da Caatinga


Rosa me convidou pra uma caçada
No sertão, no meio da Caatinga
Mas não podia levar uma cartucheira
Arma branca, de pólvora e nem pinga
Nem cachorro, apito ou peixeira:
- Esqueça no mato até da mandiga,
Pois a minha arma é que é certeira!

Estranhei o seu jeito novo de caçar
Mas topei a aventura sem banca
Botei jeans, bota e chapéu de couro
Sem fazer cara feia ou carranca
E partimos em busca do tesouro
Eu e a fotógrafa da mata branca
Atrás no sertão, do que vale ouro

No caminho ela foi me explicando
- Armadilha, rifle, faca ou espada
Tatuzeira, gaiola ou alçapão
Não se pode levar nessa caçada
Que o lindo é ver nesse sertão
O canto e o vôo da passarada
E revoada da ave de arribação.

Já encontrei ela no ponto de bala
De jaqueta e chapéu, toda arrumada
Bota cano longo e um rádio do lado
Uma linda calça jeans meio surrada
Parecendo cangaceira do passado
Pensei até que fosse pra vaquejada!
Só então mostrou o seu preparado

E me entregou uma parafernali​a
Um tripé e outras geringonças
Um cantil e outros paramentos
Pensei até que fosse caçar onças
Ajudei a carregar os equipamentos
Chamou atenção e deu uma bronca:
- Paciência, agora importa o momento!

Embrenhamos na mata bem cedo
Já se ouvia galos ao alvorecer
As flores abertas davam boas vindas
E ela, instigada pôs-se a se benzer
Ah, meu Deus, que xanana linda!
E sem um pingo de tempo perder
Sacou sua arma em rápida ginga

Disparou mil cliks bem impiedosa
Atingiu o alvo com sua mira certa
Prendeu na armadilha de 32 Gigas
Pra não ocupar a gaiola interna
Olhou, conferiu e sorriu gasguita
Fobando pra mim, apostou esperta
- Duvido prender​ coisa mais bonita!

E foi encontrando milhares de alvos
Em lugar até do mais improvável
Numa folha, uma borboleta azul
Em uma flor, a abelha amável
E até uma cobra, a surucucu
Sem pestanejar, sempre impecável
Clickou a tal fruta do mandacaru

Foi prendendo tudo na sua gaiola
Repetidamente em ângulo diverso
Fogo-apagou, seriema e até jacu
Guardou difetente e de jeito inverso
Perequito, inhuma e uma lambu
Do que faz o tal caçador perverso
Que mata sem pena até urubu

E seguiu o dia, nada de cansaço
Tudo o que viu, foi prendendo ali
Aroeira, cerca, menino e casa
Macaco, soim e até bem-ti-vi
Pescador, o rio, tudo ela levava
Carcará, gavião, beija-flor e juriti
Num espaço que nunca acabava

Pra fim de história, nada escapou
Até ser humano entrou na sua mira
Menino com roda, bola ou pião
Vovó na igreja cantando sua lira
Vaqueiro encourado até de gibão
Tim-tim por tim-tim, nada é mentira
Não conto lorota ou embromação

E a nossa caçada chegou a seu fim
O cartão de memória encheu até topar
Descanso pra câmera, a lente e o tripé
Porque ela não cansa de fotografar
Até outra vez, se assim Deus quiser
É a hora da caatinga nas redes bombar
Sua estratégia para o sertão valorizar.

Foto: mosaico com fotos de Rosa Melo.