SEU CAZUSA O BENZEDOR!!!

Seu Cazusa, um preto velho,

Da região de Caieira,

Era neto de africanos

Filho de uma benzedeira,

De quem herdou esse dote,

E foi desde molecote

Que começou a rezar,

Sua reza era tão forte

Que só a maldita morte

Podia lhe atrapalhar.

Por mais que a doença fosse

Braba, sem jeito e sem cura,

Cazusa se preparava,

E armava a sua estrutura,

Com um charuto, uma vela,

E água numa tigela,

Não sei se era benta ou não,

Na boca um cachimbo aceso,

E os males sentia o peso,

Da sua forte oração.

Com uns galhinhos de arruda

Ele ficava rezando,

Com os olhos bem fechados

E o “raminho” balançando,

O velho gesticulava,

E a entidade invocava,

Cheio de fé e confiança

Por mais que fosse a mazela

Saía dessa procela

E entrava em plena bonança.

Conseguiu muitas proezas

Com sua oração potente,

Curava dor de barriga,

Dor de mulher, dor de dente,

Caxumba, frieira, inchaço,

Puxado, dor de espinhaço,

Olhado e pé desmentido,

Nascida, íngua, queimor,

Pereba, enjoo e tumor,

Bucho inchado e dor de ouvido.

Luxação e calo seco

Verruga e carne trilhada,

Pé rachado, passamento,

E junta desconjuntada,

Se caísse a espinhela,

Ou se surgisse remela

Nos olhos do cidadão,

Ou mesmo uma dor no peito.

Seu Cazusa dava um jeito

Em qualquer situação.

Arroto choco, tersol,

Gripe, nariz entupido,

Pipoca roxa, soluço,

Engasgado, esmorecido,

Maleita, tremor, cirrose,

Bronquite, tuberculose,

Tosse braba e dor no rim.

Chegasse se lastimando,

Seu Cazusa ia rezando,

E os males levavam fim.

Argueiro, artrite e artrose,

Calombo, bucho quebrado,

Bicho de pé, caduquice,

Defluxo, dor de viado,

“Estalicido”, papeira,

Entojo, gogo, e tonteira,

O nó na tripa, o cobreiro,

Cazusa quando benzia

O mal desaparecia,

Na mesma hora, ligeiro.

O bico de papagaio

Ou mesmo a escoliose,

Torcicolo, hérnia de disco,

A tosse braba, a fimose,

A dor no pé da barriga,

O desarranjo, a lombriga,

Dor nas cruzes, “inquizila”,

Seu Cazusa quando orava,

A pessoa se acalmava,

Ficando bem mais tranquila.

E o idoso que perdeu

O vigor, a rigidez,

Procurava seu Cazusa,

E na metade de um mês

Estava recuperado,

Com o defeito reparado,

E a masculinidade

Da reza sentindo o efeito,

E ele bem satisfeito

Curtindo a virilidade,

E não eram só mazelas

Do povo, que ele curava,

Pois toda e qualquer encrenca

Cazusa desencrencava,

Um casamento desfeito,

Uma máquina com defeito,

Alguém desaparecido,

Um namoro desmanchado,

Se fosse solicitado

O freguês era atendido.

Escutava com cuidado

Qualquer solicitação,

Tomava uma providência

E logo entrava em ação,

Pra que armasse seu plano,

Sem que houvesse nenhum dano

Pra seu nome e seu prestígio,

E na força da sua prece

Sem cansaço e sem estresse

Encontrava algum vestígio.

Além disso, ele sanava,

Qualquer desordem no pasto,

Curava berne, bicheira,

E até capava no rasto,

Algum bicho fugitivo

Se estivesse morto ou vivo

A oração indicava

Como um recado, um aviso,

De modo muito preciso

Onde aquele bicho estava.

Cazusa rezava tudo

Que ofendesse ao vivente,

Fosse mordida de cobra,

Ou de cachorro doente,

Ou mesmo de escorpião,

Até cavalo do cão

E aranha caranguejeira,

Se alguém fosse atacado

Ele estava preparado

Com aquela oração certeira.

O viciado em cachaça,

Ou mesmo na cocaína,

Nos estragos que o fumo

Causava com a nicotina,

Se a droga fazia efeito

E não encontrava um jeito

Pra se livrar desse mal,

Seu Cazusa era chamado

E o vício era eliminado

De uma maneira geral.

Hoje tem doutor pra tudo

Por conta da evolução,

E os velhos benzedores

Estão quase em extinção,

Logo a classe se extermina.

Admiro a medicina!

E todo o bem que ela traz,

Mas, aquelas rezas fortes,

No outrora, deram suportes,

Aos nossos ancestrais.

E assim foi seu Cazusa

Esse velho benzedor,

Jamais cobrou um centavo

O que fez foi por amor,

Ou para ajudar alguém,

E aquele que faz o bem

Como Seu Cazusa fez,

Ao partir pra eternidade

Vai deixar muita saudade

E no céu terá voz e vez.

Carlos Aires

13/04/2017