Minha terra é Pio IX,
Tenho orgulho do lugar
Aprendi todas as bases
Falar "di" e caminhar
E que pra viver com ética
É preciso trabalhar
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Se saí de lá bem cedo
É o sertão que ensina
Cair na vida sem medo
Pra seguir a sua sina
A construir seu enredo
Na tempestade ou "librina"
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Ainda falo "lá em casa"
Me referindo ao lugar
Moro lá em pensamento
Sonhando um dia voltar
Ao sertão e minha gente
Como fez Odon Alencar
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Tanto lugar, tanta gente
Mas num é difícil lembrar
De cada canto e origem
Não é possível falar
Pois "du zói" corre enchente
Que atrapalha o rimar
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De São Bento à Cajazeiras
Detrás-do-Morro e Inharé
Na estrada de Fronteiras
Ipueira e Paradé
Vermelha do “Antõe” Bezerra
Conheça lá quem "quizé"
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No rumo do Jatobá
Tem o Cumbe e o Mercador
A terra de minha Bisa
Meninha de Zé Nestor
Alto Bonito e Nobreza
Só lugar que tem valor
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Terra de artista “escrincha”
Do nosso escritor Zezinho
De uma tal “Rosa da Caatinga”
Das fotos de passarinho
Do cordel de João Pereira
Lá da fazenda Cantinho
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Um amigo me lembrou
Da Baixa e da Cachoeira
E da Regeneração
Passando pelas “Porteira”
Todas aqui no sertão
Terra de gente guerreira
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De Quixaba a Pedra Branca
Água Branca e Primavera
No peito são encravadas
Conheço todas faz "era"
Chego por lá visitando
Quando menos se espera
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De tudo se planta lá
Do feijão à mandioca
No tempo da farinhada
Não esqueço da Taboca
E o milho pra bicharada
Pro mungunzá e a pipoca
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Na produção de caju
É a grande referência
Não há preguiça e “lundu”
O trabalho é a tendência
Suco, doce e cajuína
Produzir é da essência
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Nos projetos lá da serra
O caju se espalhou
Santa Fé e Paulo Freire
A produção prosperou
Nova Esperança e Gerais
O povo todo adotou
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A serra foi ocupada
Muita gente se mudou
Da Vertente e redondeza
Santa Cruz esvaziou
Tamanduá e Veneza
Pouca pessoa restou
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GuarIbas e São Luís
Assentamento virou
E parte da Odilândia
Terra que Odilo "grilou"
A serra mais povoada
Lá o progresso chegou
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Serra Azul e do Viana
Da Baraúna e Baliza
Da Aparecida, santa
Já bem perto da divisa
Ponta da Serra e Planalto
Bem na frente da Capisa.
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Outro destaque importante
É a produção de carneiro
Não há sabor tão marcante
O melhor sem exagero
O mel, então nem se fala
Vende até pro estrangeiro
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Nas entradas principais
As Várzeas dão boa vinda
Com as matas ciliares
Diferentes da caatinga
Andando só mais um pouco
Acha barzinho com pinga
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A cidade em crescimento
Se expande a englobar
Os lugares de pertinho
Pitombeira e Paquetá
Roça do Fausto e Orosinho
No rumo do Ceará
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Lagoa Seca e Oriente
Carnaubinha e Escondido
Vai encher tudo de gente
Se confirmar o que digo
Cuidar bem é necessário
Desse lugar que é bendito
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De Pau Ferro a Cova Donga
De Coivaras ao Condado
Brincando de vaquejada
Num alazão vou montado
E se um cabra fala mal
Ainda fico "espritado"
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Pedra Enfincada e Cangas
Não se meta em mangar
Cruz das Almas, Voo da Morte
São nomes de arrepiar
Temeroso e Carrancudo
Esquisitos pra danar
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Saco da Roça e Apertado
Saco aqui tem de eito
E o Saco das Melancias
Nome bonito, perfeito
Esqueceram o da esquerda
Mas não deixaram o Direito
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É nome pra todo gosto
Malhada Branca e Juá
Serra Verde e Jardim
Salina e Coroatá
Estreito e Belo Monte
Bela Vista e Saburá
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Poço Salgado e Contorno
Riacho do meio e Rocinha
Tem Castelo e Chupeiro
Barra d’Inharé e Serrinha
E Alagoinhas inteira
Já pertenceu à Terrinha
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Vanderléia e Massapê
Alegre e Povoação
Pé da Serra e Escorrega
Cupiras e Caldeirão
Que povo mais criativo,
Não faltou nem Travessão!
Â
Os Mananciais são belos
E vale apena “espiá”
A Cacimba do Gurguéia
Na divisa com o Ceará
E na Cacimba de Cima
Tenho meu pedaço lá
Â
Cacimba Velha e Lagoa
Perto do Alagadiço
Existe a Lagoa Grande
Não se admire com isso
Se salto a Lagoa Nova
Ia passar por omisso
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Riacho Verde e dos Bois
Tem riacho pra “lascar”
Só não sei se corre água
Nisso não vou apostar
É por que sobra poesia
Na hora de batizar
Â
Zoologia nos nomes
O meu povo aproveitou
De Galinha a Seriema
Bicho nenhum escapou
Tatu, Pavão e Traíra
Nem peixe se dispensou
Â
Confesso que nunca vi
Nem Arara e Jacaré
Mais o povo é inteligente
Pra criar só quer um pé
Gato tem de vários donos
Perto lá do São José
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Pereiro e Baraúna
Nome de pau a valer
Se tem árvore no lugar
Dê um “pulo” lá pra ver
Oiticica e Angico
Não se deve esquecer
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Macambira e Mudubim
Pau D’arco e Craibeira
Para a construção civil
Ou mesmo planta rasteira
Se não me falha a memória
Esqueceram da aroeira
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Cabaceira e Mulungu
Erva ou planta frondosa
Jurema e Mandacaru
De espinho ou tuberosa
Jerimum e Pajeú
Aí completo essa prosa
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Tem lugar alto e baixo
Lugar grande e pequeno
Baixa do Poço e Alto Riso
Baixios e Alto Sereno
Baixa do Arroz e Alto Belo
Pra cultivar amor pleno
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Pra caber a Palestina
Não pode existir fraqueza
Pois junte com o Canadá
E veja só que beleza
Nova África completa
A mania de grandeza
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Se esqueço do Marçal
Vou ser chamado atenção
Queimada e Baixa do Brabo
Não há desculpa ou perdão
Aproveito e acrescento
O Mourisco e Boqueirão
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De Sobrado à Sitio Novo
De Tanque até Recreio
Tudo é terra de meu povo
Não há nada de alheio
Do Baixão dos Atanásio
Até os Cinco Umbuzeiros
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A minha terra é imensa
O desafio deu medo
Ainda tem Juremado
Com nome de arvoredo
E pertinho do São Bento
O Anacleto e Lajedo
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Cada lugar uma história
Sua gente e tradição
Que não se troca ou vende
Por prata, ouro ou milhão
Riquezas que não se medem
Com grandezas de cifrão.
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Meu sertão é semiárido
Problemas tem sim senhor
Mas foi aqui que nasci
Criado com muito amor
Quer um pedaço dessa terra?
Casse outra, seu doutor.
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Dezembro/2015
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Sobre o Autor
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Paulo Gustavo de Alencar é natural de Pio IX, no sertão extremo leste do Piauí. Cresceu em contato com o mundo rural, rodeado dos forrós, festas juninas, farinhadas, ouvindo contos, causos, cordéis e mais autêntica musica nordestina. Fã da cultura nordestina, tornou-se poeta inspirando-se no sertão, em sua terra natal, no cotidiano, e em temas agrários, sociais e políticos, sempre publicando versos e poemas bem humorados nas redes sociais. A sua formação em agronomia e o exercício da profissão no INCRA permitiu-o manter-se vinculado a esse fascinante mundo da cultura sertaneja. Lançou seu primeiro cordel em dezembro de 2015, inspirado na turbulência política local e no conflito territorial entre Pio IX e Pimenteiras, que afloraram discussões intensas sobre o amor e o cuidado com a terra natal.