Premio da saudade

Embarquei numa canoa

Para ir ao fim do mundo

A maré estava boa

O porto pouco profundo

Nesse mar que não enjoa

Não há risco de ir pro fundo.

Não havia impedimento

Para um leve navegar

Era só divertimento

Talvez um pouco pescar

Mas naquele isolamento

Comecei raciocinar.

O que vale a minha vida

Se na certa vou perdê-la

Pouco ou muito esclarecida

Não vejo razão pra tê-la

Porque breve é a partida

Para nunca mais revê-la.

Não pensei em me matar

Entretanto eu vou morrer

Certamente eu vou tentar

Com a morte combater

Dela eu vou me afastar

Porque pretendo viver.

Meu viver é o destino

Que ganhei ao escolher

Ser um sabido menino

Que escolhe o que vai ser

Preferi ter pouco ensino

Mas ter um grande saber.

Fiz as contas do que fiz

E tirei prova dos nove

Na verdade eu sempre quis

Ter alguém que me socorre

Eu queria ser feliz

E também ser quem resolve.

Vi o meu tempo passando

Eu naquela mordomia

Pouco a pouco ia engordando

Trabalhar eu não queria

Ia aos poucos fracassando

Por comer em demasia.

Quase não podendo andar

Tive medo de morrer

Resolvi ir consultar

Pro doutor me socorrer

E de mim ele cuidar

Porém sem intrometer.

Perto do final da linha

Senti o corpo cansado

A preguiça que eu tinha

Me deixou preocupado

E a vida que era minha

Virou um fardo pesado.

Para carregar o fardo

Comecei fazer regime

Parei de comer salgado

Voltei a jogar no time

Desisti do ensopado

Que para a saúde é crime.

No começo foi difícil

Tinha riso e gozação

Mas eu tinha o compromisso

De cuidar do coração

Procurei logo um serviço

Para ter ocupação.

Tanto a chuva como o sol

Eram bons divertimentos

Eu servia de farol

Para alguns menos atentos

Que pensavam ser escol

Abusando de alimentos.

Cada um desconhecia

Os sinais do seu morrer

Alguns um pouco sabiam

Mas fingiam nada ver

Outros que até sorriam

Dizendo nada temer.

Quando a noite chegava

Começava a discussão

O marido que roncava

Andava na escuridão

Pra mulher que descansava

Era só chateação.

No final dessa jornada

Cada um ia morrendo

Encerrava a caminhada

Com o coração doendo

Pra família endividada

Deixa pouco rendimento.

Eu talvez morra assim

Conseqüência da idade

Não sei se será o fim

Ou outra realidade

Mas o que couber a mim

É o prêmio da saudade.

Renato Lima
Enviado por Renato Lima em 20/01/2017
Código do texto: T5887378
Classificação de conteúdo: seguro