981-NOITE DE PÂNICO EM MOTEL

Luiz corteja Mirita há alguns meses. Trabalham no mesmo shopping e se vêem diariamente. Ela é arisca, ele persistente. O namoro é cheio de lances fortuitos. Ele avançando com mãos e boca, ela resistindo o quanto pode aos ataques. Os encontros mais parecem uma guerra de sexo. Aos poucos, entretanto, ele vai levando a melhor. Depois de muita insistência, ela consente em ir ao motel com ele.

— Aonde vamos? Pergunta ela, quando ele dirige o carro pelas bandas de Nova Lima.

— Ao Motel Sweet Love. É novo e meus amigos dizem que é espetacular.

O motel está brilhando de novo. Numa curva escondida de uma rua discreta, com magnífica vista para a morraria das Minas Gerais, é um local aconchegante e longe dos ruídos da cidade.

O apartamento é extremamente erótico: cama redonda, colchão de água, piscina ao lado, luzes discretas. TV de plasma, som de altíssima qualidade, espelhos por todos os lados. Isto é o que dá para se perceber. O que não notam a dupla de amantes é a câmara habilmente escondida entre enfeites arquitetônicos em um dos cantos do quarto.

— Ai, amor, espera um pouco. Me deixa pelo menos tirar esta saia justa.

— Num agüento mais de tesão. — Luiz puxa o fecho da saia, e a exuberância da morena aparece em curvas esplendorosas.

— Vamos, vem aqui pra cama, tou louco pra te amar.

Estão ainda nas preliminares da noitada, que promete ser de um calor tórrido, e não se dão conta da algazarra que vem da portaria e dos outros quartos.

A ação dos dois assaltantes já estava em curso quando Luiz e Mirita entraram no apartamento. Os bandidos haviam assaltado a portaria, tendo rendido a atendente, que a fez refém. Com a moça amordaçada, dirigiram-se aos apartamentos. Em cada um, faziam a limpeza dos freqüentadores, aos quais também amarravam e amordaçavam.

O proprietário do motel assistiu, em sua própria casa, através do sistema de monitoramento (que incluía as câmaras de cada quarto) e avisou a polícia do assalto, enquanto ele próprio usava sua rápida Blazer para chegar ao motel. Chegou junto com os policiais.

Quando perceberam a aproximação da polícia, os dois assaltantes tentaram escapar pelo telhado. Responderam aos disparos da polícia, usando as armas roubadas dos clientes, momentos antes.

— Que é isto? Tiros? — Mirita ouviu primeiro os disparos e virou-se, tentando levantar-se.

— Ara, Mirita, deixa de frescura. Vem pra cá, vem... — Luiz puxa a moça para seu regaço.

Nem terminara a frase quando ouviu o tropel dos bandidos, que haviam galgado o telhado do motel. Mais disparos e um barulho forte de madeira e telhas quebrando-se. As telhas de amianto não agüentaram o peso dos dois meliantes em fuga.

Luiz tentava prender Mirita num abraço apaixonado quando os vultos desceram do teto, que se abriu num buraco enorme. Foi o tempo exato de saltarem para um lado da cama, quando dois homens caíram pesadamente sobre o colchão que, arrebentado com o impacto, explodiu como uma bomba de água.

Ao mesmo tempo, policiais arrombaram a porta e entraram.

— Todo mundo quieto!. — Alguns disparos foram feitos, as balas perdidas não atingindo ninguém. — Fiquem onde estão!

Luiz, Mirita e os dois bandidos estavam ensopados. Os românticos enamorados, praticamente nus, tentavam puxar almofadas e lençóis, numa tentativa de esconderem a nudez. Os assaltantes puseram-se agilmente de pé, mas foram algemados sem apresentarem resistência.

Atarantado, o casal ouviu as ordens do chefe dos policiais.

— Vistam-se depressa e venham conosco.

— Aonde vamos? Não temos nada com isso, não...— Luiz começou a protestar.

— Vão para a delegacia. Vão prestar depoimento. Testemunhas da ocorrência. .

Assim terminou a noite para os amantes. O romance, idem. Mirita não quis que Luiz a acompanhasse até sua casa. Tomou um táxi e sumiu. Luiz voltou para seu apartamento numa raiva danada.

Nos dias seguintes, tentou encontrar-se com Mirita. A moça desapareceu. Não voltou ao emprego. As tentativas seguidas de Luiz lhe telefonar eram baldadas, pois ela deixou de atender ao telefone.

Conversou com Rafael, amigo e colega de trabalho.

— Você podia ir na casa de Mirita, ver o que aconteceu. Não quero parecer intrometido, e a mãe dela é muito desconfiada

Rafael foi e voltou com um relatório sumário..

— Tive lá, sim. — Informou. — Quem atendeu a porta foi a mãe. Quando lhe perguntei por Mirita, quis saber quem eu era. Menti-lhe, dizendo que era da loja onde ela trabalhava. A mulher é muito simplória, acreditou e me respondeu:

A Mirita foi pro interior, passar uns tempos com os tios. Ela teve uma decepção muito grande com o namorado. Ela estava confusa e com medo de sair na rua. Fui com ela no médico. Depois da consulta, ele recomendou que ela fosse passar uns tempos fora. Disse que ela estava com uma coisa que não entendi bem. Falou que Mirita tava com pânico de motel. O senhor sabe que doença é essa?

ANTÔNIO GOBBO

Belo Horizonte, 24.08.2006

Antonio Roque Gobbo
Enviado por Antonio Roque Gobbo em 06/03/2017
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