[ 7º Desafio Contadores de Histórias - 10º conto] - Cotidiano Pop I
Lemon sai de casa pronto para outro dia estressante no trabalho, não mais queria fazer aquilo, porém sem estudo e com 50 anos nas costas fica difícil largar agora. Embarca na sua pequena nave espacial em formato de carro e voa até o palácio do Rei Francisco Arantiz, seu patrão.
- Qual vai ser a boa de hoje rei? – Diz Lemon ao chegar de frente ao seu superior.
- Hoje não quero nada demais, apenas que você vá até a caverna do ferreiro Josias e cobre dele o que ele me deve.
- Quanto ele tá te devendo?
- Duas mulheres e um dragão de pequeno porte. – Lemon arregala os olhos.
- Filho da puta. O que esse desgraçado comprou? Pó de pirlipimpim? – O rei cai na gargalhada.
- Um pó muito mais forte que isso. – Lemon levanta as sobrancelhas e dá as costas para embarcar em sua nave, chegando lá ele olha pra trás e pergunta.
- Se ele não tiver o pacote... Digamos, posso mandar ele conhecer Deus? – Rei dá um riso de canto de boca.
- E diz que mandei lembranças.
Lemon entra na nave e levanta voo em direção à caverna do tal ferreiro. Como sempre naquele momento do dia o transito estava um caos só, filas quilométricas por todos os lados que você olha. E mais acima no céu dá para olhar alguns dragões de médio e pequeno porte transportando pessoas em uma velocidade extremamente incrível.
- Como seria bom ter um desses bichos turbinados – Lemon meio que se lamenta e decide passar em um fast-food para comer antes de ir para sua missão. Enfrentando mais uma fila muito grande chega até o Mcdonald’s e estaciona sua nave. Um calor escaldante, porém assim que entra no recinto sente-se nas nuvens com todos aqueles bichos escamosos de duas cabeças que cospem gelo seco para deixar o lugar muito bem arejado.
- Por favor, um Big Mac com carne de minotauro.
- Obrigado, dez moedas de ouro. – Ele entrega as dez moedas de ouro.
- Por esse preço nem preciso dizer de nada né. – A atendente não abre a boca e Lemon vai até uma das mesas se sentar e esperar o apetitoso lanche.
Encosta-se à cadeira e afrouxa um pouco a gravata que aperta seu pescoço com uma força de alguém com muita raiva, apesar de o recinto estar bem arejado o suor ainda é visível em sua testa e escorre pelo pescoço, mais uma vez sonha em ter tido uma boa educação para não precisar entrar para essa vida de crime, uma vida que realmente não queria ter ingressado e que não valia a pena nem que recebesse dez vezes mais do que ganha. Em meio a esses pensamentos de insatisfação seu celular começa a tocar, sua mulher está ligando. Atende.
- Fala rápido.
- Oi pra você também viado. – Uma voz debochada que não deixa de ser ríspida.
- Diz logo o que quer que estou no meio do transito – Mentiu descaradamente, mas nada que não tenha feito nos últimos cinco anos de casados.
- A Maga superiora está chamando a gente de novo no colégio.
- O que a nossa filha fez dessa vez? – Diz Lemon com uma voz cansada.
- Ela roubou o dinheiro de uma colega – Arregala os olhos, apesar de a filha sempre aprontar no colégio nunca havia roubado nada e definitivamente não é isso que ele quer para a filha.
- Vou ter uma conversa com ela quando chegar em casa.
- Vai chegar que horas?
- Eu nunca me atraso.
- Mas você nunca diz à hora que vai chegar.
- Por isso mesmo – Lemon ri e desliga o telefone.
Antes mesmo que pudesse pensar em algo sobre o roubo da filha, a atendente chega à mesa e coloca a bandeja com o Big Mac.
- Bom apetite senhor.
- Por esse preço... Não vou nem agradecer.
- Se acha caro por que comprou? – Pela primeira vez na vida Lemon presenciou algum atendente do Mcdonald’s respondendo para alguém que reclamasse do preço... Sempre via as pessoas comentando sobre isso na frente dos atendentes ou gerentes e ninguém falava nada. Claro que não era educado falar, mas mostrava atitude e definitivamente ele gosta de atitude.
- Muito obrigado – Lemon sorri e a atendente também sorri e vai atender outra pessoa.
Lemon termina de saborear seu lanche e volta a nave para ir em direção a sua desagradável missão que lhe renderá um bom dinheiro, o transito ainda está um caos e os dragões ainda voam com toda sua plenitude em um vasto campo livre de qualquer trafego, o calor insuportável faz com que Lemon ligue o som da nave para escutar alguma música. No som está tocando Yellow Submarine.
“Todos nós vivemos em um submarino amarelo” pensou muito nessa frase já e com o tempo sua percepção muda e suas conclusões também, então não gostava mais de pensar na música como uma metáfora do mundo. Com todos seus serviços de crime tinha desistido de pensar que todos nós vivemos em um lugar igual. A diferença de classes era tão grande que para ele todo beco ou palácio era um mundo diferente. Após um longe tempo e tantas outras músicas ouvidas chegou até a caverna do ferreiro Josias, estaciona sua nave em frente à caverna e adentra-a.
- Nossa que lugar escuro. Que merda estou fazendo, falando em uma caverna, vou me auto denunciar-me – Revirou os olhos logo depois que pensou na bobagem que acabara de dizer.
Após uma longa caminhada por paredes de pedra e chão totalmente irregulares e cheio de bichos nojentos chegou até a porta do estabelecimento, uma porta de madeira separava ele de sua missão. Na porta tem uma placa escrita “Casa de Armas do Ferreiro Josias, Compre a sua e acabe com seus problemas”.
- Ou crie novos – Pensou alto. Pegou sua mini crossbow no bolso e colocou a mini flecha nela, respirou fundo e chutou a porta.
- Todo mundo parado nessa merda! – Logo notou que não havia ninguém na sala além dele e do homem extremamente baixo e barrigudo do outro lado do balcão.
- A que devo a sua ilustre e educada presença? – a figura estranha fala em um tom debochado.
- É melhor cuidar com esse tom que tenho ordens para estourar seus miolos, desgraçado – Lemon diz grosseiramente.
- Foi o Francisco né? Ele acha que eu lhe devo muito. – Fala o anão.
- Duas mulheres e um dragão de pequeno porte pra ser mais exato. – Diz Lemon, ainda com a crossbow apontada para a cabeça da figura que acabara de se revelar ser o devedor Josias.
- Vou lhe dar algo mais valioso que isso – Um silêncio tomou conta do ambiente, Lemon esperou Josias completar a frase – Vou lhe dar minha criança.
Lemon ri e não acredita no que acabara de ouvir. Uma criança? Esse anão havia ficado louco por acaso? Porém o olhar do Josias entrega que não poderia estar falando mais sério.
- Pelo amor de Deus cara, paga logo o que você deve que eu estou com pressa e vou atirar essa droga na sua cabeça.
- Vem cá filho – Então após alguns segundos um menino negro de cabelos cacheados chega até o local. – Você irá com esse homem até um palácio, quero que no meio do caminho você limpe a alma dele.
Dessa vez Lemon contem o riso e ainda apontando o crossbow para a cabeça do Josias e com a outra mão pega o celular e liga para o rei. Que imediatamente após o primeiro toque atende.
- Alô, conseguiu o pagamento? – Fala o rei do outro lado da linha.
- Ele está querendo pagar com o filho dele. – Enquanto Lemon fala ao telefone, Josias nem sequer esboça alguma reação para pegar alguma arma ou tentar fugir. Do outro lado da linha o rei cai na gargalhada e fala impiedosamente.
- Mate os dois. – Rei desliga e Lemon, apesar de não querer, vai cumprir as ordens como sempre.
- Qual o nome desse pivete desgraçado? - Pergunta Lemon.
- Moisés. – Responde Josias com uma voz suave. O menino ainda não falou desde que chegou.
- Você só pode estar tirando uma comigo seu filho da puta – Antes que Lemon pudesse falar mais alguma coisa, Moisés interrompe.
- Você está meio azedo hoje, L-E-M-O-N – Soletra a última palavra e cai na gargalhada junto com Josias. Onde fui me meter, pensa Lemon.
- Você se acha engraçado seu fedelho filho da mãe, vou te dizer algo agora que você vai se lembrar pro resto da vida, sabia que eu decorei uma passagem da bíblia? – Josias e Moisés balançam a cabeça em negativa ainda rindo – Sim, decorei. E ela cabe muito bem nesse momento e irei recitá-la para vocês, algum comentário antes?
- Não. – Responde os dois em uníssono.
- Ezequiel vinte e cinco dezessete. O caminho do justo está cercado por todos os lados pelas iniquidades dos egoístas e pela tirania dos perversos. Bendito é aquele que, em nome da caridade e da boa vontade, pastoreia os fracos pelo vale das trevas, pois ele é verdadeiramente o protetor de seus irmãos e o salvador dos filhos perdidos. E Eu atacarei com grande vingança e raiva furiosa aqueles que tentam envenenar e destruir meus irmãos. E você saberá: meu nome é o Senhor quando minha vingança cair sobre ti!. – E logo após terminar de recitar a passagem dá um tiro na cabeça de Josias sem dó nem piedade e depois pega outra mini flecha e coloca na crossbow, Moisés então fala.
- Você não irá me matar, eu sei disso.
- Por quê? O que eu mais quero é te matar e ir logo pra minha casa.
- Você não é mau como todos os outros. – Fala o menino com voz tranquila. Lemon então recorda-se de todas os pensamentos que teve de que não queria entrar para essa vida de crime e que queria ter dito educação boa para trabalhar honestamente, porém isso passa mais rápido que uma flecha.
- Cale a boca, acabei de matar seu pai. Como não poderia ser mau.
- Ele não é meu pai e mesmo assim sei que foi a mando de alguém, você não queria fazer isso e tenho certeza que também não queria ter entrado para essa vida.
- Por que você está dizendo essas coisas? O que você sabe sobre mim? Você é só um pivete filho da puta que tem um nome estranho pra caralho.
- Você não é mau, você é bom, tem uma alma boa. Você ama sua família acima de tudo, principalmente sua filha e é por isso que você não se separa da sua mulher, seu casamento não é mais o mesmo, mas não quer deixar a sua filha morando com a mãe e só ver de vez em quando. E você só entrou para o crime para poder dar do bom e do melhor pra ela em vez de ganhar uma miséria e ver ela passando dificuldade e não tendo o luxo que uma criança e depois adolescente merece. Fala pra mim, não estou certo? – Lemon quase começa a chorar, mas contém-se.
- Foi Deus quem lhe disse isso tudo. Você acredita em Deus muleque? – Fala Lemon nervosamente.
- Acredito sim.
- Você acha que ele pode me perdoar? – Lemon guarda a crossbow.
- Sim, ele vai te perdoar. Mas agora você precisa prometer para ele que não fará mais parte dessa vida. – Lemon olha pra cima e passa a mão para enxugar as lágrimas, respira fundo e diz.
- Okay, mas antes de prometer alguma coisa eu preciso fazer algo, vem comigo. – Lemon sai com Moisés e embarca na nave até o palácio do Rei Francisco.
Chegado lá ele desembarca da nave com o menino e vai até a sala do rei, chega chegando e tira a crossbow do bolso e aponta para a cabeça do rei.
- Por que você faz isso com as pessoas? Por que não as deixam em paz? Sabia que Deus existe e pra ele você é mau? – Diz Lemon gritando.
- Você ficou maluco Lemon? Seu filho da puta, o que acha que está fazendo?
- Estou acertando as coisas com o homem lá de cima e com todos que já matei e fiz sofrer por sua causa, rei de merda. – O rei começa a suar de nervosismo. E faz um gesto para os guardas-serpentes entrarem na sala e de súbito aparecem dez guardas os cercando. Ele, o menino e o rei.
- Você acha que pode escapar dessa vivo Lemon? – Diz o rei com certa soberba escondida abaixo do nervosismo. – E essa criança ai com você? Foi ela que colocou essas bobagens na sua cabeça? Quem você acha que é? O beato Salu? Que depois de matar toda essa gente vai pro paraíso? Vai se foder com tudo isso. Se você e sua família comem e sobreviveram até hoje é por causa de mim, olhe só tudo que fiz pra você. Você pode querer se acertar com o homem lá de cima, mas o que ele te deu e o que eu te dei, pesa na balança e me diz a quem você deve ser mais grato. – Lemon repensa em tudo que ouviu hoje e em tudo que sua família passou e em todos os pensamentos de querer ter tido outra vida. Ele não aguenta e desaba no choro querendo que tudo isso fosse uma fantasia barata de algum filme de um louco que gosta de violência e pés.
- Vou fazer um jogo para decidir isso, peça para seus homens irem embora – O Rei ri e ordena que todos se vão. Apenas os três ficam na sala.
- Moisés, vá para o lado do rei. – O menino obedece, Lemon troca o crossbow para um revólver e aponta para o menino e o rei ri, depois aponta para o rei e o menino é quem ri.
- O que você vai fazer?
- Vou decidir na roleta russa. – Os dois alvos arregalam os olhos.
- Você ficou maluco? – Grita o rei. E Lemon dispara, porém não sai nada. Todos estão suando. Aponta para o menino e dispara, nada sai também.
- Antes do meu próximo disparo quero recitar algo – e então diz - Ezequiel vinte e cinco dezessete. O caminho do justo está cercado por todos os lados pelas iniquidades dos egoístas e pela tirania dos perversos. Bendito é aquele que, em nome da caridade e da boa vontade, pastoreia os fracos pelo vale das trevas, pois ele é verdadeiramente o protetor de seus irmãos e o salvador dos filhos perdidos. E Eu atacarei com grande vingança e raiva furiosa aqueles que tentam envenenar e destruir meus irmãos. E você saberá: meu nome é o Senhor quando minha vingança cair sobre ti! - E faz o disparo, dessa vez sai.
POW!