O Floquinho

Era um Floquinho de luz. Meio desfocado, meio desengonçado. Um Floquinho que andava a ermo, num lugar onde outros seres com projetores faziam o Floquinho se sentir um nada sem brilho.

Por anos e anos e Floquinho andou sem proposito, sem sonhos, vivendo grudado na barra dos projetores dos outros, procurando algo que o motivasse, algo que desse um proposito à sua existência.

E nesses anos o Floquinho por si só já sentia pequeno, mas os que não possuíam luz própria faziam questão de diminuir o pequeno Floquinho. Diziam que ele pra nada servia, que era feio por não precisar de um projetor, que não era luz de verdade, que não era necessário pra ninguém.

E o Floquinho foi a tudo absorvendo, chupando como uma esponja, e criando uma casca que começou a envolvê-lo e ocultar sua luz.

Após isso, os outros seres abraçaram o Floquinho, deram-lhe até um projetor de presente, e assim o Floquinho se sentiu parte de algo pela primeira vez na vida. E achava que isso o fazia feliz de verdade, sem perceber que isso apenas o enterrava ainda mais na casca que o envolvia, impedindo-o de crescer, se expandir e brilhar.

A pesar de achar que era parte de algo, o Floquinho nãe era feliz. Era carente de atenção, de afeição. E quando não tinha nada disso, se entristecia ainda mais. E isso foi tirando sua vontade de existir.

Por muitas vezes o Floquinho queria se apagar definitivamente, mas nenhuma de suas tentativas davam certo. E isso só o desesperava, fazendo-o achar que não prestava para nada, nem mesmo para se apagar.

Em algum momento, na sua caça por atenção, o Floquinho encontrou-se com outro Floquinho e a atração foi imediata e sincera. E um sentimento forte ali nasceu, despretensiosamente. O outro Floquinho, com seu jeito brilhante, começou a puxar o Floquinho em direção a lugares onde os outros seres não iam por conta do fio dos seus projetores não permitirem a luz de os acompanhar.

E nesses lugares mais distantes, o Floquinho começou a se sentir preso com o projetor que os outros lhe deram. O Floquinho sentiu que poderia aprender mais, ser mais. E quando resolveu se livrar desse peso, o Floquinho descobriu lugares que não imaginava existir.

Porém a casca que o encobria não saia e isso inibia a sua luz própria. Aos poucos, a convivência com o outro Floquinho fez com que rachaduras aparecerem nessa casca, e assim o Floquinho começou a perceber qual era o sentido de sua vida.

Mas, depois de anos preso, as rachaduras provocaram dores, e as lembranças de tudo o que ouviu e viveu amedrontaram o Floquinho, deixando-o inseguro e assustado.

Em sua nova realidade o Floquinho começa a perceber que os projetores com suas luzes fortes refletiam o que queriam e cegavam a quem estava tão próximo, produzindo sombras estranhas e fazendo com que a luz própria fosse deturpada e assim parecesse menor. E ao perceber isso o Floquinho começa a se tornar curioso em saber ate onde sua luz pode alcançar. O grande problema era saber como. Mas, o simples fato de ter algo a descobrir, já lhe dava um novo sentido para o Floquinho persistir em existir, o Floquinho passou então, a acreditar em sua própria luz, e a permitir que as rachaduras começassem a abrir mais. E o Floquinho devia isso ao outro Floquinho que lhe estendeu a mão e com seu jeitinho começou a incentivar o pequeno Floquinho a ser ele mesmo e se descobrir.

Essa semana, o Floquinho se viu tendo mais uma rachadura sendo mexida. E mais uma vez as inseguranças, o medo e a dor tomaram conta. Mais uma vez o Floquinho quis sumir, se isolar, deixar a casca tomar conta. E o desespero foi a mil.

O Floquinho em alguns momentos se sentiu um sol de inverno, onde sua luz podia tocar, mas não aquecia ninguém, onde tudo de um jeito ou de outro ainda dava errado, como se ele não merecesse ao menos uma mísera chance de tentar e ser feliz.

Mas, o outro Floquinho continuou ali, por perto, sendo ainda um dos maiores motivos para que o primeiro Floquinho quisesse se conhecer e se tornar melhor. E assim, o Floquinho segue a se descobrir, a se transformar e aos poucos a brilhar um pouco mais. O Floquinho começou a lembrar que o sol de inverno continua sendo sol, continua a queimar e com as fases superadas pode e vai tornar um sol de verão.

Eri Guimarães
Enviado por Eri Guimarães em 05/08/2017
Código do texto: T6075212
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