Gilberto

A vida é um trem de carga, diziam naqueles dias alguns companheiros.

Para Gilberto então a vida estava ali, estacionada a menos de cinquenta metros da decrépita casinha de pau a pique: uma locomotiva enferrujada, encardida e quebrada sob o sol e a chuva.

Era o reflexo puro do que se tornara sua real vida: Um velho decrépito com um rosto marcado de cicatrizes e queimado de sol. Uma peça única de uma era de riquezas há muito falida e esquecida, esgotada como o ouro que um dia mingou abaixo do solo expulsando todos os homens dali, menos ele, que era duro e persistente.

Que não arredaria dali se não morto.

Firmando-se nas pernas bambas e sob a sombra de um telhado frágil ele fita a locomotiva presa aos trilhos enferrujados. A grade de proteção à frente lhe sorri como uma boca de um defunto com dentes a mostra.

Ele lhe sorri de volta de uma boca que faltam dentes.

Wenderson M
Enviado por Wenderson M em 25/09/2017
Reeditado em 26/09/2017
Código do texto: T6124675
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