COISA DE PAI

A ausência do pai que se foi cedo demais é acalentada pela força das palavras que ficaram. Nesse dia quente de fevereiro, ela lembra a experiência do primeiro emprego, aos dezessete anos.

Menina ainda, mas cheia de atitude, foi uma das primeiras mulheres a assumir um cargo numa empresa que, à época, contratava apenas homens para seu quadro de funcionários. Muitos sonhos, vontade de trabalhar e crescer. Tanta dedicação rendeu a primeira promoção em menos de seis meses. Com o reconhecimento veio a primeira decepção no comentário de um dos colegas:

- Não sei o que você fez, mas sendo mulher e bonita vai conseguir chegar onde quer aqui dentro.

Foi pra casa chorando, certa que não voltaria mais àquele trabalho. O pai a ouviu, sabendo que aquele seria apenas o primeiro dos muitos julgamentos que sua menina enfrentaria ao longo da vida. Não a colocou no colo, nem a consolou. Nem mesmo aconselhou. Antes de dar-lhes as costas deixou-lhe um ensinamento que jamais esqueceria:

- Você vai passar a vida ouvindo isso. É melhor aprender desde agora a não se intimidar.